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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DECRETO-LEI Nº 6.969, DE 19 DE OUTUBRO DE 1944.

Dispõe sôbre os fornecedores de cana que lavram terra alheia e dá outras providências

        O Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o art. 180 da Constituição,

        DECRETA:

        Art. 1º Os lavradores ou colonos que realizam a exploração agrícola da cana de açúcar em terras pertencentes às usinas ou a terceiros, sob o regime de colonato, coparticipação ou parceria, considerados fornecedores pelo remuneração suplementar, dos materiais, ingredientes e maquinismos indispensáveis para extinção dessas pragas;

        d) a inspeção periódica dos canaviais por técnicos da usina para o efeito de verificar o estado de sanidade dos mesmos;

        e) a manutenção de gabinete de pesquisas e laboratório para os trabalhos especializados relacionados com a assistência técnico-agrológica, bem como dos técnicos necessários.

        Art. 2º Quando o colono ou o lavrador, reconhecido fornecedor, exercer a sua atividade em terras pertencentes ou locadas às usinas ou distilarias, estas poderão deduzir, do preço total das canas fornecidas, as importâncias autorizadas nas convenções aprovadas pelo I.A.A.., ou nas instruções por êste baixadas (art. 22 a 24 do Estatuto da Lavoura Canavieira).

        Art. 3º Sôbre o preço das canas fornecidas, calculado de acôrdo com a tabela vigorante, o I.A.A. poderá autorizar as seguintes deduções:

        I – De dez a quinze por cento, pelo aluguel da terra;

        II – De um a três por cento pelo aluguel da moradia do fornecedor e de seus empregados ou agregados;

        III – De um a cinco por cento, pela prestação de assistência técnico-agrológica;

        IV – De um a sete por cento pela assistência médico-social prestada aos fornecedores e suas famílias, bem como aos seus agregados e empregados;

        V – De três a cinco por cento pelo aluguel de animais, veículos e instrumentos de trabalho;

        VI – De uma taxa fixada de acôrdo com os costumes do lugar, como remuneração por serviços específicos na lavoura.

        § 1º As percentagens vigorantes na data dêste Decreto-lei, não poderão ser alteradas quando sejam mais favoráveis ao lavrador do que as previstas neste artigo.

        § 2º O preço da tonelada de cana, depois de feitas as deduções a que se refere êste artigo, não poderá ser, em hipótese alguma, inferior ao preço pago pelas usinas aos seus colonos, anteriormente à data dêste Decreto-lei.

        Art. 4º Na graduação da percentagem a que aludem os números I e II do artigo anterior, ter-se-á em vista:

        a) quanto ao nº I, a natureza do terreno;

        b) quanto ao nº II, a segurança, higiene, comodidade e confôrto das construções.

        § 1º O fornecedor que lavre terra alheia terá o direito de reservar 10 % da área privativa que lhe haja sido atribuída para plantio e criação necessários à subsistência de sua família e de seus agregados.

        § 2º A área de que cogita o parágrafo anterior será localizada, obrigatòriamente, na vizinhança da moradia do fornecedor.

        Art. 5º A assistência técnico-agrológica compreende:

        a) a orientação e instrução do fornecedor acêrca dos melhores métodos de plantio, tratamento da lavoura e respectiva colheita;

        b) o fornecimento, independentemente de qualquer pagamento, de mudas de variedades selecionadas e aconselhadas pelas estações experimentais da região, pelo serviço técnico da usina, ou pelo I.A.A., bem como o fornecimento de adubo animal, na proporção fixada pelo I.A.A.;

        c) a instrução do fornecedor sôbre o modo de combater as pragas da lavoura, bem como o fornecimento ao mesmo, independentemente de qualquer

        Art. 6º A assistência médico-social abrange:

        a) assistência médica, dentária e manutenção de ambulatórios;

        b) assistência hospitalar;

        c) manutenção de créche e maternidade;

        d) manutenção de escolas primárias e de cursos práticos de agricultura para filhos de colonos-fornecedores e de seus agregados ou empregados;

        e) manutenção de instituições peri-escolares e bolsas de estudos;

        f) manutenção de parques recreativos para crianças e de instituições de recreação para adultos;

        g) realização dos serviços de saneamento que se tornarem necessários, a fim de garantir a salubridade das zonas de moradia dos colonos-fornecedores e seus empregados ou agregados.

        Parágrafo único. A percentagem a que se refere êste artigo será reduzida, na proporcão da subvenção que venha a ser concedida pelo I. A. A. aos serviços de assistência rnédico-social da usina.

        Art. 7º As taxas a que se refere o n. VI do art. 3º se destinam a remunerar serviços não compreendidos nos ns. I a V, a saber;

        a) preparo do terreno, quando feito pela usina e com pessoal por ela pago;

        b) transporte de canas até o ponto de recebimento, quando feito pela usina;

        c) irrigação das terras ocupadas pelo fornecedor e por êle lavradas;

        d) fornecimento de adubos, excetuado o adubo animal;

        e) juro pela assistência financeira, eventualmente prestada;

        f) conservação de caminhos;

        g) quaisquer outras taxas que venham a ser aprovadas pelo I.A.A. para remunerar serviços específicos.

        Art. 8º Na graduação das percentagens a que aludem os ns. I a V do art. 3º, o I.A.A. terá em vista a extensão dos serviços prestados ou mantidos pela usina, em face do disposto nos artigos 4 a 7.

        Art. 9º As usinas situadas nas regiões não servidas por cooperativas de crédito de fornecedores ficam obrigados a financiar as safras de seus colonos-fornecedores, nas bases fixadas pelo I .A.A ..

        § 1º Sôbre as quantias efetivamente antecipadas aos seus colonos, as usinas poderão cobrar juro, o qual não será superior a 4 % ao ano.

        § 2º A falta de financiamento, na hipótese prevista nêste artigo, será considerada como embaraço ao recebimento das canas, para os efeitos previstos no art. 41 do Estatuto da Lavoura Canavieira.

        Art. 10. O desconto pela usina de qualquer quantia não autorizada pelo I. A. A., pelas convenções aprovadas, ou pelas tabelas em vigor será considerado, para todos os efeitos legais, como infração às tabelas oficiais de preço.

        Art. 11. O pagamento das canas fornecidas far-se-á pela forma e nos prazos estabelecidos nas tabelas em vigor. Parágrafo 1º do artigo 1º do Estatuto da Lavoura Canavieira (Decreto-lei n. 3.855, de 21 de novembro de 1941), terão a sua situação regulada pelas convenções aprovadas pelo I. A. A. ou pelas instruções que por êste forem baixadas, observadas as disposições dêste Decreto-lei.

        Parágrafo único. As quantias indevidamente retidas pelas usinas, além dos prazos regulamentares, vencerão juros de móra, a favor do fornecedor, de 6% ano ano.

        Art. 12. No caso previsto no art. 101 do Estatuto da Lavoura Canavieira, assiste ao fornecedor o direito de reter o fundo por êle explorado, enquanto não lhe fôr paga a importância da indenização arbitrada, nos têmos do parágrafo único daquele artigo.

        Art. 13. À falta de pagamento, nos prazos regulamentares, das quantias devidas pelo fornecimento de canas ou das indenizações fixadas pelo I.A. A, aplica-se o disposto nos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º do art. 39 do Decreto-lei nº 3.855, de 21 de novembro de 1941.

        Art. 14. O I.A.A., dentro do prazo de 90 dias, fixará as percentagens e taxas a que alude o art. 3º.

        Art. 15. Para os fins previstos no artigo anterior, ficam as usinas obrigadas a apresentar ao I.A.A., dentro do prazo improrrogável de 30 dias, a proposta das percentagens e taxas que pretendam cobrar dos seus colonos-fornecedores.

        § 1º A falta de apresentação da proposta a que alude êste artigo no prazo nêle estabelecido será punida com a multa de Cr$ 10.000,00 a Cr$ 30.000,00, sem prejuízo do disposto no parágrafo seguinte.

        § 2º Na ausência da proposta a que se refere êste artigo, o I .A. A. fixará as percentagens nos mínimos constantes do art. 3º.

        Art 16. As percentagens e taxas fixadas pelo I.A.A. nos têrmos do art. 14 serão modificadas de acôrdo com os resultados apurados nas inspeções realizadas nas usinas para verificação da regularidade das declarações prestadas.

        Art 17. Para os efeitos do julgamento sôbre a condição jurídica dcs lavradores e colonos mencionados no art. 1º dêste Decreto-lei (art. 2º do Decreto-lei nº 4. 733, de 23 de setembro de 1942), ter.se-á em vista a situação em que os mesmos se encontravam na data da publicação do Estatuto da Lavoura Canavieira.

        Art 18. Os lavradores ou colonos que posteriormente a 21 de novembro de 1941, tenham perdido a posse das terras por êle ocupadas em consequência de ato unilateral da usina, serão restabelecidos na situação anterior, dentro do prazo de 30 dias, a contar da data dêste Decreto-lei, desde que hajam reclamado contra aquêle procedimento, anteriormente à data dêste Decreto-lei.

        § 1º Na hipótese prevista no parágrafo anterior, a usina poderá optar pela indenização do colono prejudicado.

        2º A indenização de que cogita o parágrafo anterior será fixada pelo I.A.A., observado o preceito do parágrafo único do art. 101 do Decreto-lei nº 3.855.

DOS TRABALHADORES RURAIS

        Art. 19. Os trabalhadores rurais que percebem salário por tempo de serviço e os empreiteiros de áreas e tarefas certas, remunerados em dinheiro, que não possam ser incluídos nas definições constantes do art. l.º e seus parágrafos do Estatuto da Lavoura Canavieira, terão a sua situação regulada em contratos-tipos aprovados pelo I.A.A., sem prejuízo das disposições das leis trabalhistas que lhes sejam aplicáveis.

        § 1º Para os efeitos do disposto nêste artigo, considera-se trabalhador rural aquele que presta os seus serviços na lavoura canavieira em caráter permanente, periódico ou transitório.

        § 2º Durante e prestação de serviços industriais na usina o trabalhador rural estará subordinado aos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho e das demais leis de proteçâo ao trabalhador, inclusive das que regulam o salário.

        § 3º Os trabalhadores em engenhos de açúcar, rapadura ou aguardenta terão sua situacão regulada pelas leis trabalhistas, não se Ihes aplicando disposto nêste artigo.

        Art 20 Os proprietários ou possuidores de usinas ou distalarias que mantenham trabalhadores rurais das categorias mencionadas no artigo anterior, ficam obrigados a elaborar e submetem à aprovação do I.A.A. dentro do prazo de 90 dias, a contar da data dêste Decreto-lei, as minutas dos contratos-tipos que pretendam adotar.

        § 1º As usinas organizarão tantas minutas de contratos-tipos, quantas forem as categorias de trabalhadores que empregarem.

        § 2.º Á usina que deixar de cumprir, no todo ou em parte, o disposto neste artigo e seu parágrafo 1º, será imposta a multa de Cr$ 10.000,00 a Cr$ 30.000,00 e o Instituto procederá de conformidade com o disposto no Art. 21.

        § 3º Enquanto o I.A.A. não se manifestar sôbre as minutas apresentadas, as relações entre a usina e os seus empregados regular-se-ão pelos dispositivos constantes das mesmas.

        Art 21. Se o I.A.A. não concordar, no todo ou em parte, com as cláusulas constantes dos contratos-tipos apresentados, baixará em instruções as normas pelas quais se deverão regular as relações da usina com os seus empregados rurais.

        Art. 22. Nos contratos-tipos ou nas instruções baixadas pelo I.A.A., observar-se-ão os seguintes princípios:

        a) proibição de reduzir a remuneração devida ao trabalhador rural, com fundamento na má colheita, resultante de motivo de fôrça maior;

        b) direito a moradia sã e suficiente, tendo em vista a família do trabalhador;

        c) assistência médica, dentária e hospitalar gratuita;

        d) ensino primário gratuito aos filhos de trabalhadores em idade escolar;

        e) garantia de indenização, no caso de despedida injusta do trabalhador.

        Art 23. O trabalhador rural com mais de um ano de serviço, terá direito à concessão, a título gratuito, de uma área de terra próxima à sua moradia, suficiente para plantação e criação necessárias à subsistência de sua família.

        Parágrafo único. O contrato-tipo ou as instruções do I.A.A. indicarão as dimensões mínimas das áreas a que alude êste artigo, bem como a distância máxima a que deverão ficar da moradia do trabalhador.

        Art. 24. As usinas de açucar ficam obrigadas a manter o registro de seus trabalhadores gerais, em livros ou fichas de modêlo organizado pelo I.A.A.

        § 1º Na organização dêsses modêlos o I.A.A. aproveitará, na medida do que Ihes fôr aplicável, os livros e fichas em vigor para os trabalhadores na indústria e comércio.

        § 2º A escrituração irregular dos livros e fichas a que alude êste artigo, acarretará multa de Cr$ 5.000,00 a Cr$ 10.000,00 que será triplicada nas reincidências.

        § 3º A usina que não dispuser dos livros e fichas mencionadas neste artigo, 60 dias depois da publicação dos respectivos modelos, ficará sujeita à multa de Cr$ 1.000,00 por dia que execeder dêsse prazo.

        Art. 25. Fica instituída a carteira profissional para os trabalhadores rurais de usinas que obedecerá ao modêlo aprovado pelo I. A.A.

        Parágrafo único. A carteira profissional será fornecida gratuitamente aos trabalhadores rurais pelo I.A.A.

        Art 26. Os litígios entre os trabalhadores referidos no art. 19 e as usinas, serão dirimidos pela Justiça do Trabalho, tendo em vista as cláusulas dos contratos-tipos ou as normas constantes das instruções do I.A. A. e ouvido, antes da audiência, o Procurador Regional do I.A.A. ou, na falta dêste, a sua Seção Jurídica.

        Parágrafo Único. O Procurador Regional do I.A.A., ou a sua Seção Jurídica, juntará, obrigatoriamente, ao seu parecer, cópia do contrato-tipo ou das instruções aplicáveis à espécie.

DISPOSIÇÕES GERAIS

        Art. 27. O art. 3º do Decreto-lei nº 3.855, de 21 de novembro de 1941, ficará assim redigido:

Art 3º Não se reputam fornecedores:

a) os trabalhadores que percebam salário por tempo de serviço e os empreiteiros de áreas e tarefas certas, remunerados em dinheiro;

b) os lavradores de engenhos a que se refere o art. 10;

c) as pessoas que, embora satisfazendo as condições do art. 1º e seus parágrafos, sejam interessadas, acionistas, sócias ou proprietárias das usinas ou distilarias;

d) os parentes até o 2º grau dos possuidores ou proprietários de usinas ou distilarias.

§ 1º O impedimento a que aludem as letras c e d dêste artigo não se aplica aos acionistas, sócios ou parentes que, explorando pessoalmente a sua lavoura, possam provar, de modo inequívoco, que a usina lhes reconheceu o qualidade e os direitos de fornecedor, anteriormente a 1º de janeiro de 1941.

§ 2º Os dispositivos das letras c e d não se aplicarão aos fornecimentos realizados dentro da cota de produção pertencente à usina.

        Art. 28. Ficam revogados os artigos 5º a 9º do Decreto-lei nº 3.855, de 21 de novembro de 1941, constitutivos do capítulo II do respectivo título I.

        Art 29. A renda normal pela utilização das terras a que se refere o artigo 89 do Estatuto da Lavoura Canavieira, será calculada de acôrdo com o disposto no artigo 3º.

        Parágrafo único. A cobrança de renda superior à estabelecida neste artigo, será punida com a pena prevista no art. 13 do Decreto-lei nº 6.739, de 26 de julho de 1944.

        Art. 30. As disposições do presente Decreto-lei relativas ao preço das canas fornecidas pelos fornecedores a que se refere o art. 1º, aplicam-se aos fornecimentos feitos a partir do início da safra 1944-45.

        Art. 31. O I.A.A. fiscalizará a perfeita observância dêste Decreto-lei, através de suas Procuradorias Regionais.

        Parágrafo único. Junto a cada Procuradoria Regional, funcionará. a título permanente, um perito especializado em assistência social com experiência comprovada na cultura canavieira.

        Art. 32. No caso de falta de cumprimento ou infração do disposto nos artigos 22 ou 23, ou das normas constantes dos contratos tipos ou das instruções a que se referem os artigos 1º, 2º, 19 ou 21 dêste Decreto-lei o Procurador do I.A.A. notificará o fato ao responsável pela usina. dando-lhe o prazo de 5 a 15 dias para regularizar a situação.

        Parágrafo único. A usina que deixar de atender à notificação, ficara sujeita à multa de Cr$ 10.000,00 a Cr$ 30.000,00, que será triplicada caso de reincidência.

        Art. 33. Os procuradores do I.A.A., sempre que, no exercício de suas funções, verificarem a prática de crime ou contravenção, são obrigados a lavrar o competente têrmo, a que juntarão tôda a documentação encontrada, bem como o depoimento das testemunhas ouvidas, encaminhando essas peças diretamente ao órgão competente do Ministério Público ou ao Presidente do Tribunal de Segurança Nacional, conforme o caso.

        Art. 34. O Instituto do Açúcar e do Álcool fica autorizado a regulamentar o presente Decreto-lei, por meio de Resoluções de sua Comissão Executiva.

        Art 35. Fica o I.A.A. autorizado a admitir, a critério do seu Presidente, todo o pessoal, permanente ou temporário, que se tornar necessário para a perfeita execução dêste Decreto-lei e do Estatuto da Lavoura Canavieira.

        Art 36. O presente Decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

        Rio de Janeiro, 19 de outubro de 1944, 123º da Independência e 56º da República.

GETÚLIO VARGAS.
Alexandre Marcondes Filho.
Apolonio Salles.

Este texto não substitui o publicado no DOU de 21.10.1944

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