Brasão das Armas Nacionais da República Federativa do Brasil

Presidência da República
Secretaria-Geral
Subchefia para Assuntos Jurídicos

MENSAGEM Nº 427, DE 1º DE SETEMBRO DE 2021

Senhor Presidente do Senado Federal, 

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos previstos no § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei no 2.108, de 2021, que “Acrescenta o Título XII na Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), relativo aos crimes contra o Estado Democrático de Direito; e revoga a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 (Lei de Segurança Nacional), e dispositivo do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais)”. 

Ouvidos, o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República opinaram pelo veto ao dispositivo transcrito a seguir: 

Art. 2º do Projeto de Lei, na parte em que acrescenta a especificação temática Comunicação enganosa em massa e o art. 359-O à Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

Comunicação enganosa em massa

Art. 359-O. Promover ou financiar, pessoalmente ou por interposta pessoa, mediante uso de expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada, campanha ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.” 

Razões do veto

“A proposição legislativa estabelece como tipo penal a comunicação enganosa em massa definindo-o como ‘promover ou financiar, pessoalmente ou por interposta pessoa, mediante uso de expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada, campanha ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral’, estipulando pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa.

A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público por não deixar claro qual conduta seria objeto da criminalização, se a conduta daquele que gerou a notícia ou daquele que a compartilhou (mesmo sem intenção de massificá-la), bem como enseja dúvida se o crime seria continuado ou permanente, ou mesmo se haveria um ‘tribunal da verdade’ para definir o que viria a ser entendido por inverídico a ponto de constituir um crime punível pelo Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, o que acaba por provocar enorme insegurança jurídica. Outrossim, o ambiente digital é favorável à propagação de informações verdadeiras ou falsas, cujo verbo ‘promover’ tende a dar discricionariedade ao intérprete na avaliação da natureza dolosa da conduta criminosa em razão da amplitude do termo.

A redação genérica tem o efeito de afastar o eleitor do debate político, o que reduziria a sua capacidade de definir as suas escolhas eleitorais, inibindo o debate de ideias, limitando a concorrência de opiniões, indo de encontro ao contexto do Estado Democrático de Direito, o que enfraqueceria o processo democrático e, em última análise, a própria atuação parlamentar.” 

Ouvidos, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo: 

Art. 2º do Projeto de Lei, na parte em que acrescenta a especificação temática Ação penal privada subsidiária e o art. 359-Q à Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

Ação penal privada subsidiária

Art. 359-Q. Para os crimes previstos neste Capítulo, admite-se ação privada subsidiária, de iniciativa de partido político com representação no Congresso Nacional, se o Ministério Público não atuar no prazo estabelecido em lei, oferecendo a denúncia ou ordenando o arquivamento do inquérito.” 

Razões do veto

“A proposição legislativa estabelece a ação penal subsidiária privada definindo que ‘para os crimes previstos neste Capítulo, admite-se ação privada subsidiária, de iniciativa de partido político com representação no Congresso Nacional, se o Ministério Público não atuar no prazo estabelecido em lei, oferecendo a denúncia ou ordenando o arquivamento do inquérito’.

A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, por não se mostrar razoável para o equilíbrio e a pacificação das forças políticas no Estado Democrático de Direito, o que levaria o debate da esfera política para a esfera jurídico-penal, que tende a pulverizar iniciativas para persecução penal em detrimento do adequado crivo do Ministério Público. Nesse sentido, não é atribuição de partido político intervir na persecução penal ou na atuação criminal do Estado.” 

Ouvidos, o Ministério da Defesa, o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República opinaram pelo veto aos dispositivos transcritos a seguir: 

Art. 2º do Projeto de Lei, na parte em que acrescenta o Capítulo V à Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

“CAPÍTULO V

DOS CRIMES CONTRA A CIDADANIA 

Atentado a direito de manifestação

Art. 359-S. Impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 1º Se resulta lesão corporal grave:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.

§ 2º Se resulta morte:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.”

Razões do veto

“A proposição legislativa estabelece como tipo penal o atentado a direito de manifestação definindo-o como ‘impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos’, que resultaria em pena de reclusão de um a quatro anos. Se culminar em lesão corporal grave, resultaria em pena de reclusão de dois a oito anos. Por sua vez, se resultar em morte, a reclusão seria de quatro a doze anos.

A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, ante a dificuldade de caracterizar, a priori e no momento da ação operacional, o que viria a ser manifestação pacífica, o que geraria grave insegurança jurídica para os agentes públicos das forças de segurança responsáveis pela manutenção da ordem. Isso poderia ocasionar uma atuação aquém do necessário para o restabelecimento da tranquilidade, e colocaria em risco a sociedade, uma vez que inviabilizaria uma atuação eficiente na contenção dos excessos em momentos de grave instabilidade, tendo em vista que manifestações inicialmente pacíficas poderiam resultar em ações violentas, que precisariam ser reprimidas pelo Estado.” 

Art. 2º do Projeto de Lei, na parte em que acrescenta o inciso III do caput do art. 359-U à Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

“III - de metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação, se o crime é cometido por militar.” 

Razões do veto

“A proposição legislativa estabelece que, nos crimes definidos no Título ‘Dos crimes contra o Estado de Direito’, acrescido por esta proposição à Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, a pena seria aumentada de metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação, se o crime fosse cometido por militar.

A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, uma vez que viola o princípio da proporcionalidade, colocando o militar em situação mais gravosa que a de outros agentes estatais, além de representar uma tentativa de impedir as manifestações de pensamento emanadas de grupos mais conservadores.

Ademais, em relação à pena acessória da perda do posto e da patente, vislumbra-se violação ao disposto nos incisos VI e VII do § 3º do art. 142 da Constituição, que vincula a perda do posto e da patente pelo oficial das Forças Armadas a uma decisão de um tribunal militar permanente em tempos de paz, ou de tribunal especial em tempos de guerra. Dessa forma, a perda do posto e da patente não poderia constituir pena acessória a ser aplicada automaticamente, que dependesse de novo julgamento pela Justiça Militar, tendo em vista que o inciso I do caput do art. 98 e o art. 99 do Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 - Código Penal Militar, já preveem como pena acessória no caso de condenação a pena privativa de liberdade por tempo superior a dois anos para a perda do posto e patente pelo oficial.” 

Ouvidos, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Ministério da Justiça e Segurança Pública manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo: 

Art. 2º do Projeto de Lei, na parte em que acrescenta a especificação temática Aumento de pena, o caput e os incisos I e II do art. 359-U, da Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

Aumento de pena

Art. 359-U. Nos crimes definidos neste Título, a pena é aumentada:

I - de 1/3 (um terço), se o crime é cometido com violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo;

II - de 1/3 (um terço), cumulada com a perda do cargo ou da função pública, se o crime é cometido por funcionário público;” 

Razões do veto

“A proposição legislativa estabelece que, nos crimes definidos neste Título, a pena é aumentada de um terço, se o crime é cometido com violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo; de um terço, cumulada com a perda do cargo ou da função pública, se o crime é cometido por funcionário público; e de metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação, se o crime é cometido por militar.

Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição contraria interesse público, pois não se pode admitir o agravamento pela simples condição de agente público em sentido amplo, sob pena de responsabilização penal objetiva, o que é vedado.” 

Essas, Senhor Presidente, são as razões que me conduziram a vetar os dispositivos mencionados do Projeto de Lei em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Este texto não substitui o publicado no DOU de 2.9.2021