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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

EMI 00016 - MPS/MP/MF/MS/MDS/SEDH/C.Civil

Brasília, 22 de maio de 2007.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Submetemos à elevada consideração de Vossa Excelência proposta de edição de Medida Provisória, dispondo sobre a concessão de pensão especial às pessoas atingidas pela hanseníase e que foram submetidas a isolamento e internação compulsórios a partir do início do século passado.

2. A legislação sanitária brasileira da Primeira República, em conformidade com os conhecimentos científicos da época, previa o isolamento de pessoas com hanseníase em colônias construídas especificamente para esse fim. Os Decretos de no 5.156, de 1904 (Regulamento Sanitário Federal), e no 10.821, de 1914 dispunham sobre a matéria. O Decreto Federal no 16.300, de 31 de dezembro de 1923, por sua vez, reforçou a disposição de que o isolamento de pessoas com hanseníase deveria ocorrer preferencialmente em colônias, definidas nesta norma como estabelecimentos nosocomiais.

3. Contudo, a imposição legal não podia ser cumprida à risca, uma vez que o número desses estabelecimentos no Brasil era insuficiente. Vale ressaltar que, ao final da década de vinte do século passado, havia um clima de pânico social em relação aos doentes. Marginalizados, os portadores de hanseníase não podiam trabalhar e, sem condições de subsistir, mendigavam pelas ruas.

4. No primeiro governo do Presidente Getúlio Vargas (1930-45), o combate à hanseníase foi ainda mais disciplinado e sistematizado. Reforçou-se, então, a política de isolamento compulsório que mantinha os doentes asilados em hospitais-colônia. Quando se concluiu a rede asilar do País, o isolamento forçado ocorreu em massa.

5. A maior parte dos pacientes dos hospitais-colônia foi capturada ainda na juventude. Foram separados de suas famílias de forma violenta e internados compulsoriamente. Em sua maioria, permaneceram institucionalizados por várias décadas. Muitos se casaram e tiveram filhos durante o período de internação. Os filhos, ao nascer, eram imediatamente separados dos pais e levados para instituições denominadas “preventórios”. Na maioria dos casos, não tinham quase nenhum contato com os pais.

6. A disciplina nos preventórios era extremamente rígida, com aplicação habitual de castigos físicos desmesurados. As crianças eram induzidas a esquecerem de seus pais, porquanto a hanseníase era considerada uma “mancha” na família.

7. Nos hospitais, as fugas eram freqüentes, mas a dificuldade de viver no mundo exterior sob o forte estigma da doença, forçava os pacientes a voltar. Os anos se passaram, e o Brasil, seguindo a tendência mundial, começou a pôr fim ao isolamento compulsório mantendo um regime de transição semi-aberto. A internação compulsória foi abolida formalmente em 1962, mas há registros de casos ocorridos ainda na década de 1980.

8. Nos últimos vinte anos, com a consolidação da cura da hanseníase por meio da poliquimioterapia - tratamento com múltiplos medicamentos - realizada sem necessidade de internação, os hospitais-colônia passaram apenas a asilar antigos doentes que não possuíam mais vínculos familiares ou sociais fora de seus muros, aqueles que, mesmo curados, continuavam dependentes de tratamento por conta de seqüelas, além de ex-pacientes que saíram, mas retornaram por não terem condições de sobreviver fora da instituição.

9. Dos 101 hospitais-colônia outrora existentes no País, cerca de trinta e três continuam parcialmente ativos. Estima-se que existam atualmente cerca de três mil remanescentes do período de isolamento.

10. Reconhecendo a gravidade da situação, Vossa Excelência, em 24 de abril de 2006, assinou Decreto instituindo Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) de Ex-Colônias de Hanseníase, com o duplo objetivo de proceder a levantamento da situação dos residentes nas ex-colônias e propor/articular a execução de ações interministeriais de promoção dos direitos de cidadania dessa população. O GTI desenvolveu seus trabalhos até dezembro de 2006, sob coordenação da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. O Relatório Final foi recentemente concluído.

11. Dentre o amplo leque de recomendações deste Relatório, destaca-se, pela oportunidade, a criação de uma Pensão Indenizatória Vitalícia de caráter pessoal e intransferível aos ex-internos, no valor de R$ 750,00. O gasto total estimado será de pouco mais de R$ 27 milhões a partir da cobertura integral dos potenciais beneficiários, com grande impacto na qualidade de vida de uma população que sofre com as graves seqüelas adquiridas e a avançada idade.

12. No âmbito internacional, o Governo Japonês foi pioneiro ao reconhecer a figura do “exilado sanitário” e a estabelecer indenização para as pessoas com hanseníase que sofreram reclusão compulsória por motivos sanitários.

13. É neste contexto que se configura a importância desta Medida Provisória, restabelecendo a iniciativa do Presidente da República na reparação aos efeitos causados pela ação do Estado, ainda que embasada nas teorias científicas vigentes à época, causadora de danos irrecuperáveis. A iniciativa do Governo Brasileiro significa uma demonstração contundente do compromisso de resgatar parte da dívida que a sociedade tem com esses cidadãos.

14. A urgência e relevância da adoção da providência aqui proposta, por meio de Medida Provisória, inclusive com o reconhecimento do direito à pensão a partir de sua edição, é caracterizada pelo fato de que o público-alvo da medida, sofrendo de graves seqüelas, possui idade média bastante avançada e vive em condições precárias, correndo grave risco de vida, obrigando o Estado a instituir desde já um benefício de caráter indenizatório.

15. A despesa estimada para o ano de 2007 é de R$ 13 milhões, atingindo R$ 27 milhões nos anos subseqüentes.

16. Para fins de cumprimento do que dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000), as despesas decorrentes do pagamento da Pensão Vitalícia serão atendidas dentro da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado, prevista no Anexo de Metas Fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2007, Lei no 11.439, de 29 de dezembro de 2006.

Respeitosamente,
Luiz Marinho
Paulo Bernardo Silva
Guido Mantega
José Gomes Temporão
Patrus Ananias
Paulo de Tarso Vannuchi
Dilma Rousseff