SECRETARIA-GERAL

EM n° 00016/2020 CGU ME

 

Brasília, 8 de dezembro de 2020.

                    Senhor Presidente da República,

 

   

1.                 Considerando as atribuições que lhe confere o art. 61, § 1º, inciso II, alínea “c”, da Constituição, submete-se à sua avaliação e ponderação a proposta anexa de Projeto de Lei, que visa a alterar a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.

2.                 São três as modificações apresentadas por meio do referido Projeto. A primeira busca alterar o art. 124 da Lei nº 8.112, de 1990, com o escopo de incluir a necessidade de identificação do dolo ou da culpa na conduta do agente público submetido a processo administrativo, para a constatação do cometimento de ilícito de natureza disciplinar. A segunda almeja incluir quatro novos dispositivos na referida Lei - artigos 130-A a 130-D - para prever a possibilidade de que infrações disciplinares de menor potencial ofensivo possam ser objeto de resolução administrativa de conflito, bem com para estabelecer os contornos desta espécie de acordo na esfera disciplinar. E, por fim, a terceira pretende incluir um novo parágrafo no art. 142 da Lei nº 8.112, de 1990, para dispor sobre a transcurso do prazo prescricional quanto às infrações disciplinares que sejam objeto de resolução administrativa de conflito.

3.                 A atual redação do dispositivo a ser alterado - art. 124 - compreende derivação, com a íntegra reprodução, de texto do art. 199 da revogada Lei nº 1.711, de 28 de outubro de 1952, que, a seu tempo, retratou um contexto punitivo-sancionador alheio aos aspectos estruturantes do conceito de ilícito administrativo.

4.                 Faz-se necessária a uniformização de procedimentos para o adequado controle interno da disciplina no serviço público federal e isto perpassa, em primeiras linhas, pela clareza normativa de entendimento quanto aos elementos subjetivos do ilícito - “dolo” e “culpa” - como pressupostos à responsabilização administrativa de agentes públicos. Busca-se, com isso, evitar punições e afastamentos ilegítimos de servidores públicos que, embora desempenhando eficientemente suas funções, possam ser envolvidos e apenados em processos punitivos à vista de uma responsabilidade objetiva de conduta, afetando, assim, a regularidade e a continuidade do serviço público.

5.                 Nesse sentido, há de se considerar que os ilícitos penal, civil estrito e administrativo são espécies de um mesmo gênero, o ilícito em um sentido amplo, a representar a conduta contrária ao ordenamento jurídico sancionador, cuja finalidade prescritiva deve abarcar a prevenção geral e individual, o que só se alcança com uma aferição da reprovabilidade por meio dos referidos elementos anímicos da conduta. Sob essa percepção e por simetria aos demais ramos congêneres do Direito, o ilícito administrativo-disciplinar já se afigura, em sua essência, como a conduta comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa. A jurisprudência dos Tribunais pátrios assim também o considera.

6.                 A análise do elemento subjetivo para ilícitos ou infrações administrativas já se encontra normatizada no texto da Medida Provisória nº 966, de 13 de maio de 2020, que dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19, assim como no art. 28 do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB), com a nova redação dada pela Lei nº 13.655, de 25 de abril de 2018. Ambos os atos normativos reconhecem a necessidade de identificação do elemento subjetivo anímico do agente público acusado de prática de ilícito como pressuposto da responsabilização, todavia, em contexto normativo sensivelmente distinto do que se busca pela presente proposta de Projeto de Lei para a uniformização em maior abrangência e, destarte, aumento da segurança jurídica em sede de administração da disciplina no serviço público federal.

7.                 Com efeito, a presente proposição sugere considerar, para responsabilização, o dolo e a culpa, independentemente de ser ela grave, média ou leve e sem oposição à possibilidade de caracterização de infrações disciplinares de menor potencial ofensivo para fins de resolução administrativa de conflito, conforme procedimento a ser regulamentado no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, para afastar quaisquer inseguranças jurídicas produzidas pelo subjetivismo de julgadores da Administração Pública.

8.                 Trata-se de três mudanças textuais específicas, que, entretanto, ensejarão um grande avanço da política administrativa-sancionadora do Brasil, alinhando-se ao que já ocorre em outros sistemas normativos estrangeiros de grande efetividade de direitos fundamentais. A medida visa ainda a diminuir a quantidade de expedientes levados à apreciação judicial que restam anulados por vícios formais, em razão de questionamento, dentre outros fatores, dessa omissão de análise pelo julgador administrativo. Além disso, cumpre assinalar que a previsão de resolução administrativa de conflito para infrações disciplinares classificadas como de menor potencial ofensivo contribuirá tanto para uma atuação estatal mais eficiente quanto à solução de tais situações delituosas, como, de igual, poupará ao Estado o dispêndio de arcar com os custos para a instauração e a condução de processos administrativos disciplinares para apurar fatos delituosos caracterizados pela baixa ofensividade aos bens públicos protegidos pelo direito administrativo disciplinar.

9.                 Além disso, ainda no tocante aos aspectos financeiros e orçamentários, mister assinalar que por meio da proposta em tela será evitado o desperdício do orçamento investido em procedimentos administrativos disciplinares cuja omissão da análise do dolo ou da culpa do agente público poderia os levar à ausência de resultados efetivos. Nessas balizas, a proposta não produz qualquer impacto, uma vez que não cria despesa nem gera renúncia de receita, mas, pelo contrário, possibilita uma economia aos cofres públicos.

Essas, Senhor Presidente, são as razões que justificam o encaminhamento da presente proposta de Projeto de Lei à sua consideração.

 

                   Respeitosamente,

 

 

 

Wagner de Campos Rosário
Ministro de Estado chefe da Controladoria-Geral da União

Paulo Roberto Nunes Guedes
Ministro da Economia