SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

EMI nº 36/2016 MF MP 

Brasília, 21 de março de 2016.

Excelentíssima Senhora Presidenta da República,

                       

1.                Submetemos à apreciação de Vossa Excelência, e com solicitação de urgência nos termos do § 1o do art. 64 da Constituição Federal, Projeto de Lei Complementar que estabelece o Plano de Auxílio aos Estados e ao Distrito Federal, medidas de estímulo ao reequilíbrio fiscal, altera a Lei no 9.496, de 11 de setembro de 1997, a Medida Provisória no 2.192-70, de 24 de agosto de 2001, e a Lei Complementar no 148, de 25 de novembro de 2014. Também se propõem medidas de reforço da responsabilidade fiscal por meio de alterações à Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, com vistas a aperfeiçoar registros de gastos com pessoal; permitir a implementação, por lei federal ulterior, de duas modalidades adicionais de garantia pela União a operações de exportação e a investimentos brasileiros no exterior; estabelecer mecanismos de limite à expansão do gasto; e disciplinar mecanismo extraordinário de contingenciamento – o Regime Especial de Contingenciamento,  além de dar outras providências.

2.                Entre meados da década de 1990 e o início dos anos 2000, a União promoveu uma reforma fiscal que incluiu planos de reestruturação e refinanciamento de dívidas dos Governos Regionais, entre outras medidas. O contexto de surgimento dessas medidas foi o estado deficitário insustentável das contas públicas brasileiras. Por meio da Lei no 9.496, de 11 de setembro de 1997, que autorizou a assunção e renegociação das dívidas estaduais pela União no final da década de 1990, fortaleceu-se o pacto federativo nacional e eliminaram-se fontes de desequilíbrio macroeconômico. As condições desse refinanciamento previam, em linhas gerais, o pagamento por parte dos Estados de 20% a título de amortização extraordinária das suas dívidas, mediante a constituição de conta gráfica, e o reescalonamento do saldo restante, pelo prazo de 30 anos, considerando-se, na maior parte, uma taxa de juros de 6,0% ao ano, com atualização monetária pelo Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna - IGP-DI.

3.                Nesse movimento, a dívida mobiliária e as dívidas antigas desses entes com bancos e instituições internacionais foram absorvidas pelo Governo Federal, que se tornou o maior credor de Estados e Municípios. Os contratos firmados com os Estados, no âmbito da Lei nº 9.496, de 1997, por exemplo, instituíram a obrigação de que fossem firmados os Programas de Reestruturação e Ajuste Fiscal - PAF, de maneira que fosse monitorada a situação fiscal daqueles que refinanciaram suas dívidas. Além disso, essa reforma trouxe a proibição de emissão de títulos públicos pelos governos regionais e o contingenciamento da oferta de crédito bancário para os entes via resolução do Conselho Monetário Nacional – CMN. Com isso, a capacidade de contratação de novas dívidas por parte desses entes ficou bastante limitada e o resultado fiscal era determinado quase completamente pela necessidade de pagamento das dívidas com o Tesouro Nacional. 

4.                Em linhas gerais, a renegociação em questão contribuiu para a redução do saldo devedor da dívida financeira dos Estados e do Distrito Federal, por meio da concessão de um subsídio inicial, do alongamento do prazo de pagamento, bem como da redução dos encargos financeiros. Em contrapartida a estes benefícios, os Estados e o Distrito Federal comprometeram-se a observar o adimplemento no pagamento das prestações da dívida refinanciada e a estabelecer e cumprir seus respectivos PAF, que são parte integrante dos contratos de refinanciamento de dívidas, consistindo em um documento por meio do qual um Estado se propõe a adotar ações que possibilitem alcançar metas ou compromissos.

5.                Inicialmente assinados pelos governadores dos 25 Estados que refinanciaram suas dívidas (Amapá e Tocantins não o fizeram), os PAF apresentam metas anuais para um triênio, considerando a evolução das finanças estaduais, os indicadores macroeconômicos para o novo período e a política fiscal adotada pelos governos estaduais. A cada ano é avaliado o cumprimento das metas e compromissos do exercício anterior. Anualmente pode ser realizada a atualização de metas para um novo triênio. Estes procedimentos são observados enquanto perdurar o contrato de refinanciamento.

6.                Ao longo da existência dos PAF, por conta da adoção de uma postura consistente com a manutenção do equilíbrio fiscal e com a estabilidade macroeconômica, os resultados alcançados pelos Estados foram significativos, em especial na redução do endividamento estadual.

7.                Em decorrência da crise internacional de 2008, o Governo Federal empreendeu uma política de preservação do emprego e da renda, por meio do estímulo ao investimento para conter os efeitos da crise sobre a atividade econômica doméstica. Assim, foram criados programas de financiamento com recursos de fontes públicas destinados aos entes federados, com foco no fomento ao investimento em infraestrutura.

8.                Ressalta-se, entretanto, que a crise internacional iniciada nos Estados Unidos em 2008 disseminou-se, ao longo dos anos, para a União europeia e a China. Foi a partir de 2014 que a desaceleração da economia chinesa impactou de forma significativa o preço mundial das commodities. O Brasil, como grande produtor de commodities, foi fortemente afetado por esse último desenvolvimento da crise econômica mundial.

9.                Dessa forma, com a deterioração do cenário internacional, houve retração da economia brasileira impactando a arrecadação do setor público. Somado a isso, a elevação das despesas obrigatórias, especialmente despesas com pessoal, gerou desequilíbrios fiscais nos entes subnacionais da Federação.  Em tal cenário, esses efeitos vêm implicando em dificuldades de ajuste de despesas aos novos patamares de receita

10.               Dentro desse contexto foi aprovada a Lei Complementar no 148, de 25 de novembro de 2014, que promoveu a troca dos indexadores originais dos contratos refinanciados no passado (IPCA mais 4% a.a. ou taxa Selic, o que for menor, em substituição aos encargos contratuais originais, IGP-DI mais juros de 6% a 7,5% a.a. para estados e Distrito Federal, e IGP-DI + 9% a.a. para os Municípios). Os municípios foram os grandes beneficiados pela redução dos encargos, com impactos significativos de redução do estoque de dívidas e, por consequência, das prestações. Os estados, por outro lado, não foram beneficiados na mesma magnitude, mostrando constantes dificuldades no pagamento da despesa com pessoal mensal e tendo dificuldades para honrar as parcelas da dívida com a União.

11.               Por esse motivo, os estados solicitaram o auxílio do governo federal para cumprimento de suas obrigações mensais e manutenção dos serviços públicos essenciais em funcionamento. As solicitações foram consolidadas na proposta apresentada na 159o do Confaz, ocorrida em Alagoas no dia 11 de dezembro de 2015, em que os estados solicitaram o alongamento do prazo para pagamento das dívidas refinanciadas pela Lei no 9.496, de 1997, por 10 anos.

12.               Diante do pleito dos estados, o governo federal elaborou estudos acerca dos impactos a serem gerados nas finanças públicas e os reais benefícios das propostas aos entes da federação brasileira. Contudo, o alongamento de 10 anos proposto pelos estados pioraria a situação de alguns deles, em especial, por força da dinâmica da metodologia de cálculo das parcelas e da eliminação do limite de pagamento a determinado percentual da respectiva Receita Líquida Real. O fim deste limite associado a um prazo de 10 anos implicaria, de imediato, um maior comprometimento financeiro desses entes, cuja parcela de dívida com a União seria aumentada. Respeitando os critérios de isonomia, o governo federal verificou que seria mais eficiente um alongamento de 20 anos, de forma a auxiliar os estados na manutenção de seus serviços essenciais, como saúde, educação e segurança.

13.               Diante disso, levando-se em consideração a diversidade de situações dos estados, as medidas ora propostas por este Ministério da Fazenda compreendem ações que permitam suavização de pagamentos de compromissos financeiros para com a União, com o estabelecimento de condicionantes que permitam reequilibrar a situação fiscal desses entes no médio prazo, conforme detalhado a seguir.

14.               Propõe-se a concessão de prazo adicional de até 240 meses para pagamento das dívidas refinanciadas pelos entes estaduais perante a União, mediante celebração de aditivo contratual, com redução de até 40% no valor das prestações nos 24 meses posteriores à celebração do aditivo. Além disso, propõe-se autorizar as instituições públicas federais, a seu critério, a repactuarem financiamentos concedidos aos estados e ao Distrito Federal, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, conforme condições estabelecidas pelo CMN. Nessas repactuações, autoriza-se a dispensa da verificação dos requisitos exigidos para a realização de operações de crédito e concessão de garantia pela União, inclusive aqueles definidos na Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF.

15.               Em contrapartida, propõem-se como condicionante a exigência de que, no prazo de até 180 dias da assinatura dos termos aditivos contratuais, que os entes sancionem e publiquem leis determinando a adoção durante os 24 meses subsequentes de medidas para auxiliá-los a reduzir suas despesas, conforme definido no art. 3o do Projeto, das quais se destacam: reduzir em 10% a despesa mensal com cargos de livre provimento; não conceder aumento de remunerações dos servidores a qualquer título, ressalvadas as decorrentes de atos derivados de sentença judicial e previstas constitucionalmente, bem como suspender a contratação de pessoal, salvo em casos específicos; limitar o crescimento das outras despesas correntes à variação da inflação; e vedar a edição de novas leis ou a criação de programas que concedam ou ampliem incentivo ou benefício de natureza tributária ou financeira.

16.               Ademais, os entes também terão, como condicionante, aprovar lei que estabeleça normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal do ente, em linha com o que determina a Constituição Federal e a LRF, que contenha, no mínimo, os seguintes dispositivos: instituição do regime de previdência complementar, caso ainda não tenha publicado outra lei com o mesmo efeito, e elevação das contribuições previdenciárias dos servidores e patronal ao regime próprio de previdência social; reforma do regime jurídico dos servidores ativos, inativos, civis e militares para limitar os benefícios, progressões e vantagens ao que é estabelecido para os servidores da União; instituição de monitoramento fiscal contínuo das contas do ente, de modo a propor medidas necessárias para a manutenção do equilíbrio fiscal; instituição de critérios para avaliação periódica dos programas e projetos do ente.

17.               Adicionalmente, está sendo facultada a opção pela redução de 40% na prestação dos entes por até 24 meses seguintes à assinatura de aditivo contratual com a União. Para ter este benefício, os estados optantes terão que editar leis que determinem durante os 24 meses seguintes a redução de 20% na despesa mensal com cargos de livre provimento e a limitação das despesas com publicidade e propaganda a 50% da média dos empenhos efetuados nos últimos três exercícios. Para fazer jus a este benefício, também há a vedação de que o ente contrate operação de crédito pelo prazo de até 48 meses.

18.               O art. 9o do Projeto autoriza a União a receber bens, direitos e participações acionárias em sociedades empresárias, controladas por estados e Distrito Federal, como contrapartida à amortização, em caráter provisório, dos contratos de refinanciamento celebrados com o ente. A valoração desses ativos será atestada em laudo de avaliação produzido por empresa especializada. A União, por sua vez, deverá adotar as providências necessárias para a alienação dos bens, direitos e participações acionárias recebidos em até 24 meses após a respectiva recepção, podendo o prazo ser prorrogado por até 12 meses.

19.               Ainda com relação às medidas que envolvem o relacionamento com os Estados, estão sendo propostas alterações na Lei Complementar no 148, de 2014, na Lei no 9.496, de 1997, e na Medida Provisória no 2.192-70, de 2001, de forma a adequar os conceitos utilizados no PAF, e no Programa de Acompanhamento Fiscal, definido na citada Lei Complementar no 148, de 2014, àqueles utilizados na LRF.

20.               Importante esclarecer que a solução proposta com relação às dívidas estaduais tem caráter excepcional e é justificada pela difícil conjuntura enfrentada pelos governos regionais. Ademais, a proposta em questão deverá contribuir com um consistente robustecimento do arcabouço legal/fiscal dos estados, de modo a dotá-los de mecanismo adicional capaz de fazer frente ao difícil quadro fiscal, sem, contudo, comprometer o necessário equilíbrio das contas públicas da União.

21.               Num cenário conservador, em que todos os estados optem por receber a totalidade dos benefícios permitidos e assinem aditivos contratuais até 30 de junho de 2016, estima-se que poderão ser postergados valores de até R$ 9,6 bilhões em 2016, R$ 18,9 bilhões em 2017 e R$ 17 bilhões em 2018. Importante ressaltar que a medida não é perdão da dívida e sim uma repactuação, não gerando custo financeiro para a União.

22.               No bojo desse esforço de auxílio aos estados e na proposição de medidas que contribuam para a melhoria na situação fiscal dos entes, este Ministério da Fazenda também submete à apreciação de Vossa Excelência medidas de reforço à responsabilidade fiscal, notadamente com propostas de alterações na LRF relacionadas a aperfeiçoamentos nos registros dos gastos com pessoal, dentre outros. Vale destacar alterações no art. 18 da LRF para deixar mais claro que os gastos com pensionistas e aposentados devem ser computados como outras despesas de pessoal, bem como aqueles relacionados à terceirização de mão-de-obra ou qualquer forma de contratação de pessoal de forma indireta, inclusive por posto de trabalho, que atue substituindo servidores e empregados públicos. Ainda nesse sentido especifica-se que na apuração da despesa total com pessoal deverá ser observada a remuneração bruta do servidor, nela incluídos os valores retidos para pagamento de tributos.

23.               No que se refere as demais alterações da LRF, cabe destacar que em momentos de choques econômicos adversos, os efeitos da desaceleração na atividade econômica sobre as variáveis fiscais, especialmente a arrecadação de impostos e contribuições, torna o cumprimento das metas fiscais uma tarefa altamente desafiadora. Tal cenário se agrava devido à rigidez orçamentária, principalmente em relação às despesas obrigatórias.

24.               A LRF já prevê que a Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO – disporá sobre critérios e forma de limitação de empenho, a ser efetivada nas hipóteses de verificação de que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas estabelecidas de resultado primário ou nominal.

25.               Entretanto, num cenário de queda significativa e rápida de receita, dada a enorme parcela de gastos obrigatórios no orçamento, o esforço de contingenciamento para a realização das metas fiscais pode demandar a paralisação de atividades essenciais do Estado e serviços fundamentais à sociedade, como por exemplo: as atividades de arrecadação e fiscalização de tributos, o atendimento da Previdência Social ao cidadão, o policiamento de fronteiras, as atividades de investigação policial, operações militares, alimentação de detentos, etc.

26.               Por isso, propõem-se alterações na LRF com o objetivo de aperfeiçoar a metodologia de limitação de empenho e movimentação financeira. Além disso, a presente proposta também introduz o limite do gasto público primário e mecanismos automáticos de seu controle.

27.               Nos aspectos mais formais, propõe-se no art.1o destacar a Defensoria Pública, instituição com autonomia funcional, administrativa e orçamentária, no rol de Poderes e órgãos de que trata a alínea a), inciso I, § 3o. Ainda nesses aspectos, no art. 9o, está sendo proposto o aprimoramento na periodicidade dos relatórios de avaliação de receita e despesa, que deixa de ser bimestral para ser trimestral, dado que a experiência mostra que a revisão frequente na programação orçamentária não é salutar, e as avaliações em espaços muito curto de tempo se mostram ineficientes para captar alterações de tendências. Além disso, a prerrogativa de fazer avaliações extraordinárias é mantida para os casos em que seja necessária alguma revisão extemporânea da programação orçamentária e financeira.

28.               Já a proposta de aperfeiçoamento da metodologia de contingenciamento leva em conta situações nas quais o cumprimento das metas de resultado primário, conforme o mecanismo de limitação de empenho e pagamento disposto no art. 9o da LRF, ameaça a execução de atividades e serviços essenciais do Estado. Em geral, isso ocorre quando a frustração da receita, em relação às projeções aprovadas na Lei Orçamentária Anual – LOA, supera o valor da base contingenciável. Esta situação, na maioria absoluta das vezes, se dá em situação de baixo crescimento, que já são disciplinadas atualmente no art. 66 da LRF.

29.               Mesmo no caso em que a referida frustração não supere a base contingenciável, mas a necessidade de restrição de despesas atinge a maior parte dela, é operacionalmente inviável ao Poder Executivo reduzir as despesas até à realização da meta sem comprometer a prestação de serviços públicos considerados essenciais.

30.               Considerando-se esse cenário especial e transitório em relação à execução fiscal, esta proposta de projeto de lei acrescenta ao mecanismo do art. 9o da LRF a possibilidade de ser declarado o Regime Especial de Contingenciamento.

31.               Nesse Regime Especial, o Poder Executivo contingenciará a totalidade da despesa pública, no entanto, preservando aquelas relativas a investimentos em fase final de execução ou que sejam considerados prioritários e aquelas consideradas essenciais pelos órgãos para a manutenção das suas atividades e prestação de serviços públicos. Dessa forma, mantém-se o compromisso com a responsabilidade fiscal sem comprometer a prestação de serviços públicos essenciais e dando continuidade a investimentos importantes para a recuperação da economia.

32.               Se, após a adoção do Regime Especial, não for possível o cumprimento da meta fiscal estabelecida na LDO o Poder Executivo deverá se pronunciar junto ao Poder Legislativo sobre as razões do descumprimento e as medidas corretivas adotadas.

33.               Além dessa mudança, a presente proposta concebe que a lei que estabelece o Plano Plurianual estabelecerá um limite interanual, para o seu prazo de vigência, para o gasto público primário total.

34.               Desde a Constituição de 1988, o gasto público cresce continuamente em relação ao Produto Interno Bruto. Isso decorre dos legítimos anseios da sociedade por serviços públicos universais de qualidade, por um Estado moderno e efetivo, e pela promoção de uma sociedade mais justa e igualitária. Entretanto, essa tendência tem levado a uma magnitude de carga tributária que pode comprometer no longo prazo o crescimento econômico, colocando em risco as conquistas econômicas e sociais da sociedade brasileira.

35.               Por essa razão, propõe-se que o limite do gasto público primário seja definido como um percentual do PIB, a ser redefinido a cada quatro anos na aprovação do Plano Plurianual.  Além disso, a adoção desse limite busca uma aciclicidade do gasto, permitindo que em períodos de expansão da receita, o Estado consiga gerar superávits fiscais para a redução da sua dívida, enquanto que em período de queda de receita, o gasto público possa contribuir para a manutenção da demanda agregada da economia, suavizando as crises.

36.               Definido o limite do gasto, propõe-se também mecanismos automáticos de ajuste da despesa para fins de cumprimento do limite concebido. Esse mecanismo seria acionado em até três estágios sequenciais, sucessivamente, de acordo com a magnitude do excesso de gasto dos entes envolvidos em verificações trimestrais ou quando da elaboração do Projeto de Lei Diretrizes Orçamentárias.

37.               Cada estágio contém uma série de ações a serem realizadas para reverter a trajetória da despesa total estabelecida. Ou seja, havendo a constatação do descumprimento do limite para a expansão do gasto dar-se-á a implantação dos estágios até que se alcance o montante suficiente para reconduzir o gasto público primário ao limite estabelecido.

38.               As ações do primeiro estágio seriam em linhas gerais: (i) vedação da criação de cargos, empregos e funções ou alteração da estrutura de carreiras, que impliquem aumento de despesa; (ii) suspensão da admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento, aquelas que não impliquem em aumento de gastos e as temporárias para atender ao interesse público; (iii) vedação de concessão de aumentos de remuneração de servidores acima do índice de inflação oficial prevista; (iv) não concessão de aumento real para as despesas de custeio, exceto despesa obrigatória, e discricionárias em geral; (v) redução em pelo menos dez por cento das despesas com cargos de livre provimento.

39.               Caso as restrições apresentadas no primeiro estágio não sejam suficientes para manter o gasto público primário abaixo do limite estipulado, o segundo estágio se faz necessário com as seguintes medidas: (i) vedação de aumentos nominais de remuneração dos servidores públicos, ressalvado o disposto no inciso X do art. 37 da Constituição Federal; (ii) vedação da ampliação de despesa com subsídio ou subvenção em relação ao valor empenhado no ano anterior, exceto se a ampliação for decorrente de operações já contratadas; (iii) não concessão de aumento nominal para a despesas de custeio, exceto despesa obrigatória, e discricionárias em geral; e (v) nova redução de pelo menos dez por cento das despesas com cargos de livre provimento.

40.               Por fim, se os dois estágios anteriores ainda não forem suficientes para adequar o gasto público primário ao limite estabelecido, novas medidas serão ativadas, configurando o terceiro estágio: (i) reajuste do salário mínimo limitado à reposição da inflação; (ii) redução em até 30% dos gastos com servidores públicos decorrentes de parcelas indenizatórias e vantagens de natureza transitória; e (iii) implementação de programas de desligamento voluntário e licença incentivada de servidores e empregados, que representem redução de despesa.

41.               Uma vez que as medidas acima atinjam os resultados esperados, elas poderão ser suspensas, pois o objetivo primordial da política fiscal é promover a gestão equilibradas dos recursos públicos, de forma a assegurar a manutenção da estabilidade econômica, crescimento econômico e sustentabilidade intertemporal da dívida pública.

42.               Outra alteração proposta na LRF refere-se ao art. 40 que define as condições e critérios para concessão de garantia por parte dos entes, inclusive pela União. Essa alteração tem como objetivo permitir a criação, por lei federal ulterior, das modalidades de garantia de crédito à exportação e seguro de investimento brasileiro no exterior, espécies de garantia a serem concedidas pela União, por intermédio do Ministério da Fazenda.

43.               No que concerne ao fomento das exportações brasileiras de bens e serviços, a LRF já prevê que o Seguro de Crédito à Exportação - SCE possuirá regulamentação própria em Lei Federal, conforme disposto no art. 40, § 8o, II da LRF, de modo que não se aplicam as normas gerais do art. 40 sobre as garantias da União ao SCE. Esse modelo de garantia tem sido extremamente exitoso no seu objetivo de alavancar exportações brasileiras de bens e serviços, uma vez que tem proporcionado cobertura a riscos para os quais seguradoras privadas não demonstram apetite.

44.               Vários países desenvolvidos fornecem, dentre as modalidades de apoio ao exportador, o chamado seguro de investimento. É uma modalidade de seguro com vistas a proteger o investimento produtivo no exterior. Uma parcela significativa (mais de 60%) do comércio internacional se realiza através de operações intracompanies (entre empresas coligadas). Logo, o investimento brasileiro direto no exterior é uma estratégia indispensável ao crescimento sustentado das exportações.

45.               Entretanto, o investimento direto no exterior, sobretudo em países em desenvolvimento, onde há grandes oportunidades a serem exploradas, enseja vários riscos de natureza política: expropriação governamental, quebra injustificada de contratos, conflitos civis, guerras e outros eventos congêneres que impactam severamente investimentos de longo prazo efetuados por empresas transnacionais. Essa modalidade de garantia visa mitigar apenas os riscos inerentes às volatilidades políticas de um Estado estrangeiro, de modo que o investidor continua arcando com o risco de seu empreendimento não alcançar sucesso por razões comerciais. As hipóteses de caracterização de um fato desencadeador de indenização governamental seriam especificadas por Lei Federal.

46.               A segunda modalidade a ser criada, para efeitos da LRF, é a garantia de crédito à exportação. Na verdade, o que se busca é a evolução da garantia de crédito à exportação concedida pela União atualmente por meio do Seguro de Crédito à Exportação (SCE). Visa-se a atender, prioritariamente, as necessidades das exportações de aeronaves. Sem embargo, essa garantia poderá ser utilizada também nas exportações de bens de capital.

47.               O SCE é o principal instrumento de crédito oficial às exportações de aeronaves brasileiras. Entretanto, o Brasil figura entre os grandes exportadores de aeronaves como o único que ainda provê seguro para o financiamento de suas exportações, o que reduz o apetite dos bancos comerciais e prejudica a indústria nacional.

48.               Os Certificados de Garantia de Cobertura do Seguro de Crédito à Exportação possuem pré-requisitos que devem ser cumpridos pela instituição segurada para a efetiva regulação do sinistro e, consequentemente, pagamento de indenização. Apesar de preservar os interesses da União, os condicionantes existentes nos atuais CGCs geram inseguranças à instituição mutuante quanto ao recebimento do valor financiado em caso de sinistro, uma vez que o descumprimento de qualquer dos requisitos pode ensejar o indeferimento da indenização. Tais incertezas desestimulam a participação de bancos comerciais privados no financiamento das exportações brasileiras de aeronaves com garantias do SCE. Ademais, ainda que venham a financiá-las, incorporam ao preço do pacote financeiro um acréscimo de prêmio decorrente do maior risco, que implica prejuízo à competitividade do exportador nacional.

49.               A garantia de crédito à exportação, instrumento cuja criação será viabilizada pela alteração proposta na LRF, por sua vez, se caracteriza pela irrevogabilidade, podendo ser acionada diante do inadimplemento da obrigação independentemente de sua causa. Consequentemente, torna-se mais célere a caracterização e regulação do inadimplemento, bem como o pagamento da indenização, não havendo a necessidade de prever especificadamente os riscos cobertos.

50.               Na concessão da garantia, há uma redução das hipóteses em que a indenização pode ser negada pelo garantido. As hipóteses se limitam a mora no pedido para pagamento da indenização ou a prática de atos desautorizados pelo garantidor. Assim, essas hipóteses de rejeição do pagamento da indenização demonstram que o modelo não é totalmente incondicional, pois subsistem exigências para que o garantido não afete o risco da operação sem o consentimento do Garantidor, que é a União. Além disso, nos casos de má fé, haveria sempre a possibilidade de a União acionar judicialmente o banco financiador caso seja verificada, após o pagamento da indenização, alguma impropriedade no processo.

51.               Além do financiamento bancário, a garantia também representa um importante passo para o financiamento via mercado de capitais. Essa fonte de financiamento já é utilizada em outros países para o setor aeronáutico. Resumidamente, o financiamento via mercado de capitais consiste na emissão de títulos pela companhia aérea, podendo ser garantidos pela Agência de Crédito à Exportação do país exportador, que são utilizados para financiar a compra das aeronaves. Para essas operações é indispensável um instrumento de garantia, objetivo, direto, de fácil análise e avaliação,  para que os investidores tenham confiança no recebimento de seu capital  em caso de inadimplência do devedor.

52.               Em suma, a publicação de lei que autorize a União a conceder o Seguro de Investimento no Exterior e a Garantia de Crédito à exportação suprirá importante lacuna no ordenamento jurídico do fomento oficial à exportação e internacionalização de empresas brasileiras. Assim, a proposta de alteração mostra-se relevante contribuição com vistas a alavancar a competitividade das exportações brasileiras, nos moldes da prática de agências de crédito à exportação estrangeiras.

53.               Ressalta-se que na concessão dessas garantias será exigida uma contraprestação pecuniária calculada com base em critérios atuariais de forma a cobrir o risco de inadimplência das obrigações garantidas. Assim, assegura-se a sustentabilidade da política pública, evitando que o pagamento de indenizações supere o que for arrecadado na concessão das garantias.

54.               Finalmente, outro aperfeiçoamento refere-se à submissão de proposta de alteração na Lei no 4.595, de 31 de dezembro de 1964, com a instituição de instrumento de depósito voluntário para auxiliar o Banco Central do Brasil a administrar a liquidez da economia, como ferramenta complementar aos mecanismos atualmente utilizados.

55.               Para a execução da Política Monetária, o Banco Central do Brasil utiliza as operações compromissadas como instrumento de regulação das condições de liquidez da economia. Para tanto, necessita manter uma carteira de títulos da dívida pública federal para lastro destas operações em dimensões adequadas ao controle da oferta de moeda na economia, uma vez que a LRF proibiu a emissão de títulos próprios por parte da Autarquia. O controle do nível de liquidez em mercado é condição essencial para a manutenção dos juros básicos da economia nos níveis determinados pelo Comitê de Política Monetária – COPOM.

56.               Entretanto, verificou-se em nível global uma mudança expressiva nas condições de liquidez das economias. Em primeiro lugar, os países emergentes exibiram uma forte acumulação de reservas internacionais, com sucessivos superávits em transações correntes após a crise asiática. Em segundo lugar, os Bancos Centrais de países desenvolvidos, como resposta à crise financeira de 2008, expandiram seus balanços com massivas aquisições de ativos ou empréstimos de longo prazo. Nesse contexto, algumas mudanças se mostraram estruturais, como, por exemplo, a compra de volumes expressivos de reservas internacionais por Bancos Centrais de economias emergentes e a consequente necessidade de esterilização da liquidez injetada em mercado.

57.               A expansão dos balanços dos Banco Centrais tem como passo inicial o aumento da base monetária, com os Bancos Centrais emitindo moeda para a aquisição de ativos, em geral divisas estrangeiras e títulos públicos domésticos e estrangeiros. No Brasil, esse aumento da base monetária é esterilizado pelas operações compromissadas. No mundo, porém, verificam-se outras alternativas para implementar a esterilização, como, por exemplo, os depósitos remunerados junto ao Banco Central.

58.               Verifica-se atualmente no Brasil um contexto em que a liquidez tem apresentado aumento vertiginoso, especialmente por conta dos altos juros incidentes sobre o estoque atual de operações compromissadas. Diante disso, o Banco Central aumenta ainda mais seu volume de operações compromissadas e, para tanto, necessita de uma carteira de títulos públicos cada vez maior, já que estes são utilizados como lastro. Em vista disso, o Tesouro Nacional se vê obrigado a realizar seguidos aportes ao Banco Central sem contrapartida financeira, aumentando o patrimônio do banco e elevando a Dívida Bruta do Governo Geral, quando esses títulos são utilizados nas operações compromissadas. Tais aportes são regulamentados pelo inciso VI do art. 3o da Lei no 10.179, de 6 de fevereiro de 2001, e pela Portaria do Ministério da Fazenda no 241, de 04 de junho de 2009.

59.               Importante notar que, no caso desses aportes, o aumento da dívida pública não tem relação com a política fiscal, sendo ocasionado por fenômenos estritamente monetários. Seus efeitos, todavia, impactam a autoridade fiscal pois criam pressões adicionais sobre a gestão da dívida pública ao gerar encargos a serem pagos quando do vencimento dos títulos aportados.

60.               A experiência internacional mostra que diversos bancos centrais importantes, como o Banco Central Americano – Fed e o Banco Central Europeu – BCE preferiram utilizar os depósitos remunerados como instrumento de esterilização de seus afrouxamentos monetários (Quantitative Easing – QE), enquanto o uso de operações compromissadas não foi relevante nesses casos.

61.               Para o caso brasileiro, os depósitos remunerados são bastante adequados, já que contribuiriam para estancar a necessidade dos constantes aportes de títulos do Tesouro Nacional ao Banco Central, uma vez que não requerem lastro, no caso das operações compromissadas, títulos públicos.

62.               Diante do exposto, este Ministério da Fazenda entende conveniente a instituição do instrumento de depósito voluntário para auxiliar o Banco Central a controlar as condições de liquidez da economia, como ferramenta complementar aos mecanismos atualmente utilizados, abrindo espaço para redução da carteira de títulos do Banco Central utilizada como lastro para as operações compromissadas.

63.               Isso posto, há urgência na adoção dessas medidas para o ajuste da situação fiscal dos estados com consequente melhoria nos serviços públicos prestados aos cidadãos. Da mesma forma, as medidas visam dar maior previsibilidade e controle sobre a trajetória da despesa e orientar a Administração Pública, em momentos econômicos adversos, na condução da política fiscal. Por fim, considerando o fortalecimento institucional que resultará da aprovação do Projeto de Lei Complementar, entende-se que as medidas ora propostas irão contribuir para a retomada da confiança dos investidores e irão demonstrar o compromisso do governo federal com a responsabilidade fiscal.

64.               Essas são, Senhora Presidenta, as razões que justificam a elaboração do Projeto de Lei Complementar que ora submetemos à elevada apreciação de Vossa Excelência.

 

Respeitosamente,                                    

 

 

                                                           Nelson Barbosa                                            Valdir Moysés Simão                                                      

                                                         Ministro da Fazenda                               Ministro de Estado do Planejamento,     

                                                                                                                                Orçamento e Gestão