SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

   EMI nº  00009/2014 MMA MCTI MDIC

Brasília, 22 de maio de 2014.

 

                   Excelentíssima Senhora Presidenta da República,

 

     

1.                Submetemos à consideração de Vossa Excelência o presente projeto de lei que regulamenta o inciso II do § 1o e o § 4o do art. 225 da Constituição, os arts. 1, 8, “j”, 10, “c”, 15 e 16, §§ 3 e 4 da Convenção sobre Diversidade Biológica e dispõe sobre a proteção e acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado e sobre a repartição de benefícios para conservação e uso sustentável da biodiversidade, e dá outras providências.

2.                De inicio cumpre observar que a Convenção sobre Diversidade Biológica - CDB foi ratificada pelo Congresso Nacional, em 1994, e promulgada pelo Executivo, por meio do Decreto no 2.519, de 16 de março de 1998. O texto estabelece a soberania dos países sobre seus recursos genéticos e sua autonomia para regular o acesso a tais recursos, mediante autorização prévia da autoridade nacional competente. Estabelece ainda, que os países receptores e usuários de recursos genéticos de terceiros assegurariam a repartição justa e equitativa dos benefícios decorrentes de sua utilização econômica.

3.                Preocupado com as repercussões negativas decorrentes do fornecimento de microrganismos brasileiros para outros países, sem a respectiva previsão de transferência de tecnologia e repartição dos benefícios resultante do uso desses recursos, o Governo Brasileiro editou, em 29 de junho de 2000, a Medida Provisória no 2.052. A norma supracitada sofreu sucessivas reedições até a superveniência da Emenda Constitucional no 32, de 2001, que veio a disciplinar o uso de Medidas Provisórias, dispensando de reedição as publicadas anteriormente a ela e fazendo com que estas perdessem o caráter provisório, até que fossem apreciadas definitivamente pelo Congresso Nacional. Por essa razão, a Medida Provisória no 2.186-16, de 2001, constitui-se, hoje, no marco legal que rege o acesso e a remessa de componentes do patrimônio genético nacional, o conhecimento tradicional associado e a repartição justa e equitativa dos benefícios decorrentes da utilização comercial dos recursos genéticos.

4.                Importante salientar que o mencionado texto legal inovou ao adotar o termo “patrimônio genético”, entendido como a informação de origem genética contida em espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, diferentemente do termo “recurso genético” adotado pela Convenção. Partiu-se do princípio que a informação proveniente do recurso genético deveria ser protegida, pois uma vez extraída poderia ser livremente distribuída, principalmente com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação. Assim, depois da retirada da informação, o recurso genético perderia a importância para o usuário, trazendo prejuízo ao provedor.

 

5.                A Medida Provisória foi regulamentada pelo Decreto no 3.945, de 2001, modificado pelos Decretos nos 4.946, de 31 de dezembro de 2003, 5.439, de 3 de maio de 2005 e 6.159, de 17 de julho de 2007. O art. 30 da Medida Provisória, que trata de infrações administrativas, foi regulamentado pelo Decreto no 5.459, de 7 de junho de 2005, que disciplinou as sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional associado. Em 29 de julho de 2009, foi editado o Decreto no 6.915, regulamentando o art. 33 da Medida Provisória, que trata da destinação de recursos aos Fundos ali enumerados.

6.                Por meio da Medida Provisória foi instituído o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, como autoridade competente para conceder as autorizações de acesso e remessa, além de analisar os contratos de repartição de benefícios. O Conselho iniciou suas atividades em abril de 2003, constituindo-se em um órgão de caráter deliberativo e normativo..

7.                O Decreto no 3.945, de 28 de setembro de 2001, instituiu o Departamento de Patrimônio Genético, com a função de Secretaria-Executiva do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético. Entre as suas atribuições incluem a implementação das deliberações do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético e a instrução e tramitação dos pedidos de acesso, remessa e repartição de benefícios a serem submetidos à deliberação do Conselho.

8.                Ao longo do seu funcionamento, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético editou 40 Resoluções, 8 Orientações Técnicas e já credenciou 358 coleções de instituições públicas nacionais para serem fiéis depositárias de amostra de componente do patrimônio genético.

9.                De acordo com o Decreto no 5.459, de 2005, os agentes públicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA são autoridades competentes para a fiscalização das condutas e atividades lesivas ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional associado. Em julho de 2010, foi criado o Núcleo Temporário de Combate ao Acesso Ilegal ao Patrimônio Genético e ao Conhecimento Tradicional Associado, vinculado tecnicamente à Diretoria de Proteção Ambiental daquela Autarquia. As ações fiscalizatórias desse Núcleo resultaram em 498 autos de infração emitidos, sendo 54 advertências e 444 multas para empresas privadas, institutos de pesquisa, universidades e pessoas físicas. O total das multas é de R$ 220 milhões.

10.              A legislação de acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado vigente colocou o país em posição de vanguarda comparativamente aos demais membros da Convenção, uma vez que estabeleceu fundamentos, inovou e possibilitou a implantação de um regime de repartição de benefícios.

11.              Contudo, a experiência de doze anos dessa legislação evidencia que ela deve ser revista e ajustada. A legislação tem se mostrado pouco efetiva em função de um conjunto de restrições sobre o acesso, que, por sua vez, vem resultando em um regime insatisfatório para a repartição de benefícios decorrente do uso desse patrimônio ambiental e social.

12.              As restrições mais graves são aquelas que dificultam a realização do acesso a patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado para pesquisa ou desenvolvimento tecnológico, que é a etapa mais sensível a entraves procedimentais. Há uma extensa lista de requisitos que precisam ser atendidos e documentos a serem apresentados, independentemente do resultado que aquele acesso possa ter. Uma exigência é especialmente ilustrativa. Para realizar um acesso com o intuito de bioprospecção, isto é, com o intuito de explorar economicamente o resultado do acesso, a Medida Provisória no 2.186-16, no § 4o do art. 16, prevê que o acesso será autorizado pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético apenas após a assinatura do Contrato de Repartição de Benefícios. Ou seja, o usuário é obrigado a celebrar um contrato que carece de concretude, tendo em vista a falta de informações sobre os produtos explorados e valores envolvidos.

13.              As restrições para a realização do acesso para pesquisa ou desenvolvimento causam um grave efeito perverso, que é o elevado tempo necessário para que o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético emita as autorizações de acesso. A defasagem temporal causa danos à competitividade de setores como o de cosméticos, um dos principais usuários da sociobiodiversidade. Os produtos do setor têm uma limitada vida útil, cerca de três anos. Assim, não é incomum o processo burocrático retirar um terço do tempo de comercialização do produto. Outro público negativamente afetado é o de pesquisadores.

14.              Ademais, há gargalos também para a concessão de propriedade intelectual. São numerosas as instituições de pesquisa em ciência e tecnologia no país que desenvolveram produtos e processos a partir do acesso ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional associado que se encontram impedidas de realizar o depósito do pedido de patente no Instituto Nacional de Propriedade Industrial-INPI, pelo fato de não possuírem a autorização de acesso emitida pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético.

15.              A incerteza jurídica e o custo regulatório trazem riscos financeiros e reputacionais a pesquisadores e agentes econômicos. Por conta desses riscos e custos, os atores evitam incorporar produtos da biodiversidade brasileira em suas linhas de pesquisa e em suas atividades produtivas. Consequentemente, extratos e substâncias da biodiversidade brasileira são comumente substituídas por substâncias sintéticas ou oriundas de espécies exóticas, de forma a contornar o ônus da necessidade de autorização por parte do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético.

16.              Além dos diagnósticos apresentados pelos setores científico, empresarial, comunitários e órgãos de governo sobre a desatualização conceitual, jurídica, econômica e regulatória, as estatísticas sobre acesso e repartição de benefícios disponíveis atestam que o sistema não atende adequadamente a demanda conhecida e potencial para o uso da sociobiodiversidade no Brasil.

17.              Nesse sentido, consideramos que é premente alcançar um marco legal que assegure o efetivo cumprimento dos compromissos relativos à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à repartição de benefícios. A facilitação da pesquisa para academia, indústria e demais setores é fundamental. Ela permite o maior desenvolvimento científico e tecnológico a partir de insumos nacionais, a geração de negócios com base na sociobiodiversidade nacional e, posteriormente, a efetiva repartição de benefícios. Esses elementos contribuirão sobremaneira para alavancar ainda mais o modelo brasileiro de desenvolvimento sustentável.

18.              Vale lembrar ainda que, a fim de resguardar o interesse público e respeitar os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, incluindo o Protocolo de Nagoya, recentemente aprovado na 10a Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, o País precisa estar preparado para responder a esses novos compromissos que estão sendo assumidos em âmbito internacional, com vistas a garantir a efetiva repartição de benefícios provenientes do uso do patrimônio genético brasileiro e dos conhecimentos tradicionais associados.

19.              Diante disso, e em face da relevância, da importância e, sobretudo, da urgência da questão que ora se apresenta, foi elaborada uma nova proposta legislativa com base nos doze anos de experiência com a aplicação da Medida Provisória no 2.186-16, de 2001, incluindo ajustes que, no entendimento destes Ministérios, permitirão um melhor fluxo e gestão das atividades de acesso encaminhadas ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, bem como possibilitarão imprimir maior eficiência na repartição dos benefícios derivados do uso sustentável da diversidade biológica.

20.              O referido processo, destaque-se, considerou as demandas de distintos setores da sociedade afetos ao tema, culminando com o presente texto que almeja facilitar a pesquisa, alavancar a inovação tecnológica do setor produtivo e gerar benefícios para toda a sociedade. Muda-se o foco da regulação de meios para uma regulação de resultados, com menos ênfase em mecanismos prévios de controle para a realização de pesquisa. O novo marco legal, ao diminuir drasticamente os custos financeiros e regulatórios do Estado e usuários para a realização de pesquisa, prevê o controle da rastreabilidade dos resultados dessa pesquisa e a regulação da repartição de benefícios. Assim, o novo marco legal também se alinha melhor às políticas industrial e de incentivo à pesquisa e inovação.

21.              Neste contexto, destaca-se a mudança de paradigma referente ao tratamento dado às atividades de acesso, não havendo mais separação entre as atividades de pesquisa científica, bioprospecção e desenvolvimento tecnológico. Mais além, foram revistos os conceitos principais, atualizados com o intuito de serem mais aderentes à realidade, o que propiciará maiores clareza e segurança no tocante às atividades sob o escopo desta proposta. Outrossim, instituem-se procedimentos modernos e simplificados para catalisar as atividades de pesquisa e desenvolvimento. No lugar de autorizações prévias, a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico passam a ser objeto apenas de cadastro eletrônico por parte do usuário. Vale destacar que o consentimento prévio informado passa a ser exigido apenas para o acesso aos conhecimentos tradicionais associados de origem identificável.

22.              Outra relevante mudança de paradigma refere-se a estratégia de se estabelecer um sistema ancorado em mecanismos de estímulo à pesquisa, monitoramento e rastreabilidade, no lugar de um modelo quase exclusivamente de comando e controle. Ao mesmo tempo em que se amplia o escopo de aplicação da lei, diminui-se a discricionariedade do regulador. Os requisitos para acesso e remessa serão de natureza declaratória e sujeitas a fiscalização. O foco no monitoramento e na rastreabilidade, preocupação importante dos mercados consumidores, serão materializados pelo instituto do Atestado de Regularidade de Acesso, a ser emitido pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético. O atestado será exigido para o registro de produtos e para a obtenção de direitos de propriedade intelectual, enquanto o cadastro de pesquisa e desenvolvimento tecnológico será exigido para a publicação de artigos. O cadastro e o atestado foram instituídos com o firme propósito de minimizar os custos regulatórios e de cumprimento por parte do usuário.

23.              Uma importante demanda atendida é a que se refere à remessa de patrimônio genético. Será exigido cadastro apenas para remessas para o exterior, enquanto a remessa no território nacional ficará isenta. Tal novidade propõe-se a facilitar e a estimular a geração e o intercâmbio de conhecimentos entre as instituições nacionais de pesquisa e desenvolvimento, colaborando assim com o progresso técnico-científico nacional. As pessoas jurídicas estrangeiras poderão solicitar acesso, mediante autorização, sem a obrigação de se associar a instituições nacionais.

24.              Sobre os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, a presente proposta responde a demanda por participação no processo de tomada de decisão, tanto no que se refere às medidas relativas aos conhecimentos tradicionais associados, quanto à destinação da repartição justa e equitativa dos benefícios. É na garantia da participação na gestão dos benefícios que reside o maior avanço no que se refere à garantia de seus direitos. A presente proposta prevê que a gestão dos recursos depositados em Fundo específico e destinados a povos indígenas e comunidades tradicionais se dará com a sua participação.

25.              Prevê-se ainda outras medidas voltadas a fortalecer os conhecimentos tradicionais associados e as atividades de povos indígenas e comunidades tradicionais, como a instituição de um Programa que canalizará recursos para a execução dos Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, o que estimulará e fortalecerá as práticas de povos e comunidades relevantes para a conservação da biodiversidade. Ademais, a proposta inova ao estabelecer a repartição de benefícios para o uso do conhecimento tradicional de origem não identificável, conhecimento tradicional associado em que não há a possibilidade de vincular a sua origem a, pelo menos, um povo indígena ou comunidade tradicional.

26.              O modelo de repartição de benefícios também recebe alterações consideráveis no novo marco legal proposto. Sob a Medida Provisória no 2.186-16, de 2001, surgiram dificuldades de aplicação da legislação, tais como a indefinição de beneficiários e de valores envolvidos na repartição de benefícios. Ademais, o momento de exigência da apresentação do Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios firmado entre usuário e provedor se dava antes mesmo da caracterização dos possíveis benefícios gerados. Aliás, esse instrumento passa a denominar-se Acordo de Repartição de Benefícios.

27.              Estima-se que com a delimitação de regras e parâmetros mais claros em torno da repartição de benefícios, deverá ocorrer uma diminuição dos custos de transação para todos os agentes envolvidos (pesquisadores, fabricantes, Estado, povos indígenas e comunidades tradicionais). Assim, reduzem-se também o custo regulatório e a incerteza associada a atividades econômicas decorrentes do acesso. Essas medidas facilitam sobremaneira o acesso ao patrimônio genético nacional e conhecimentos tradicionais associados para pesquisa e desenvolvimento tecnológico, que, eventualmente, devem possibilitar um aumento da atividade econômica, proporcionando condições mais favoráveis para que os benefícios sejam gerados e repartidos.

28.              Os benefícios gerados pelo produto acabado que contiver um elemento principal de agregação de valor decorrente de um acesso a patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado serão repartidos pelo último fabricante da cadeia de produção. Dessa forma, não haverá incidência em cascata sobre os elos intermediários da cadeia produtiva. Adicionalmente, assegura-se que a repartição de benefícios se dará no topo da cadeia de agregação de valor, proporcionando mais recursos para a repartição de benefícios. Ademais, o último elo é o que apresenta a menor assimetria de poder de mercado entre ofertante e consumidor. Assim, minimizam-se as distorções econômicas decorrentes da imposição de uma alíquota para a repartição de benefícios. Vale destacar que apenas algumas das atividades que geram benefícios econômicos serão oneradas. As atividades iniciais de pesquisa e desenvolvimento tecnológico não serão negativamente afetadas pela regra de repartição de benefícios. Por fim, microempresas, empresas de pequeno porte e microempreendedores individuais estão isentos da obrigação de repartir benefícios.

29.              A alíquota base proposta para a repartição de benefícios é de 1% (um por cento) da receita líquida do produto. Ela é marginalmente inferior à adotada pelo TIRFAA, que corresponde a 1,1% da receita líquida. Contudo, essa alíquota pode ser atenuada em acordos setoriais. Nestes casos, quando o setor demonstrar que a repartição de benefícios pode inviabilizar a atividade econômica dos agentes do setor em questão, a alíquota pode variar entre 0,1% (um décimo por cento) e 1% (um por cento) da receita líquida. Assim, abre-se espaço para que a repartição de benefícios não comprometa a competitividade de determinados setores econômicos que operam com uma menor margem.

30.              Em conformidade com o disposto nos tratados internacionais, a repartição de benefícios por acesso ao patrimônio genético pode se dar nas modalidades monetária ou não monetária. A modalidade não monetária pode ocorrer por meio de: a) projetos para conservação ou uso sustentável de biodiversidade ou conhecimento tradicional associado; b) transferência de tecnologias; c) disponibilização em domínio público de produto ou processo, sem proteção por direito de propriedade intelectual ou restrição tecnológica; d) licenciamento, de produtos e processos, livre de ônus; e) capacitação de recursos humanos; f) distribuição gratuita de produtos em programas de interesse social. Adicionalmente, com o intuito de incentivar a modalidade de repartição não monetária e a interação direta entre usuário e beneficiário, prevê-se a aplicação do equivalente a 75% (setenta e cinco por cento) do valor previsto para a modalidade monetária naqueles projetos de repartição de benefícios que o usuário executar.

31.              Quanto às sanções administrativas, a presente proposta exclui algumas das sanções mais graves previstas no art. 30, incisos VIII a XIII da Medida Provisória no 2.186-16, de 2001. Essas sanções são desproporcionais à gravidade das infrações previstas e podem gerar perdas econômicas a usuários, potenciais beneficiários, Estado e, consequentemente, a toda a sociedade. O conjunto de sanções previstas no art. 28 da presente proposta é mais aderente à gravidade de potenciais atos ilegais dos usuários.

32.              É excessiva a punição prevista no art. 26 da Medida Provisória no 2.186-16, que sujeita o usuário a uma multa de, no mínimo, 20% (vinte por cento) do faturamento bruto referente à comercialização de produto caso a exploração econômica tenha sido feita em desacordo com o disposto na Lei. Dessa forma, propõe-se a exclusão da referida multa do rol de sanções aplicáveis no marco legal proposto. O art. 46 explicita que a União renuncia essas indenizações. Contudo, é necessário abrir um prazo para que agentes privados possam provocar as esferas administrativas ou judiciais para fazer valer esse direito. Essa necessidade jurídica pode gerar um incentivo perverso para os usuários. A regularização não impede que agentes privados exijam uma multa de 20% do faturamento bruto, com base no art. 26 da Medida Provisória. Isso pode limitar o alcance das regras de regularização desenhadas.

33.              Para executar de forma mais focalizada a repartição de benefícios, prevê-se a criação de um Programa Nacional de Repartição de Benefícios que será implementado por meio do Fundo Nacional de Repartição de Benefícios. É precipitado pressupor que a repartição de benefícios realizada de forma indireta chegue sempre de forma satisfatória àqueles que detém conhecimentos tradicionais associados e cujas práticas são responsáveis pela manutenção da biodiversidade no Brasil. A criação de um Programa Nacional voltado para a conservação, proteção e uso sustentável da biodiversidade e de conhecimentos tradicionais associados tem o potencial de contemplar grupos da sociedade com acesso limitado a outras políticas públicas.

34.              É importante ressaltar que esta proposta normativa apresenta a possibilidade de regularização das atividades daqueles que não buscaram autorização de acesso e remessa de componente do patrimônio genético, bem como de adequação das atividades de sua exploração econômica, quando realizados a partir de 30 de junho de 2000, data de publicação da Medida Provisória no 2.052, de 2000. A fim de estimular a regularização, propõe-se criar condições especiais, no regulamento, para aqueles que o fizerem no prazo de um ano.

35.              O Projeto de Lei prevê que a regularização se dará por meio de termo de compromisso. Nestes casos, a aplicação das sanções administrativas e a exigibilidade das sanções aplicadas serão suspensas. Caso o termo de compromisso seja integralmente cumprido, elas serão extintas. Vale destacar que uma cláusula fundamental do termo de compromisso é a obrigação de repartir os benefícios obtidos da exploração econômica de produtos oriundos de acesso nos últimos cinco anos de acordo com as regras da nova Lei.

36.              As regras de transição também preveem que as multas administrativas já lavradas sejam reduzidas em 100% nos casos de infrações que envolvem apenas patrimônio genético ou pesquisa sobre conhecimento tradicional associado. Nos demais casos sobre conhecimento tradicional associado, as multas serão diminuídas em 90%.

37.              A proposta prevê uma mudança importante nos requisitos para concessão de direito de propriedade intelectual. A única exigência para a concessão por parte do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual-INPI é o cadastro ou autorização de acesso. Sob a vigência da Medida Provisória no 2.186-16, o usuário precisa cumprir integralmente todos os requisitos da norma para que o direito de propriedade intelectual seja concedido. Isso gera um custo regulatório excessivo para o INPI e aumenta sobremaneira o tempo para a concessão de propriedade, pondo em cheque a atividade do usuário.

38.              Por fim, cumpre ressaltar que a presente proposta de lei, consoante disposto em seus arts. 50 e 51, não se aplica às atividades de acesso a patrimônio genético, conhecimento tradicional associado e repartição de benefícios para alimentação e agropecuária, que continuarão a ser regidas pela Medida Provisória no 2.186-16, de 2001, até que sobrevenha eventual legislação específica para o setor. 

39.              São essas, Senhora Presidenta, as razões que justificam a proposta ora submetida à consideração de Vossa Excelência.

 

 

 

                         Respeitosamente,

 

Izabella Mônica Vieira Teixeira
Ministra de Estado do Meio Ambiente
Clélio Campolina Diniz
Ministro de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação
Mauro Borges Lemos
Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior