SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

EM Interministerial nº 00179/2011/MP/MJ/SDH-PR

 Brasília, 29 de setembro de 2011.

Excelentíssima Senhora Presidenta da República,

1.               Temos a honra de submeter à apreciação de Vossa Excelência o anexo Anteprojeto de Lei que estabelece o Sistema Nacional de Prevenção à Tortura e a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes - SNPCT, integrado pelos órgãos, entidades e autoridades constantes do seu art. 2º, bem como institui o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - MNPCT com a finalidade de prevenir e combater a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

2.                O texto ora encaminhado é fruto de um rico, intenso, transparente e longo processo de consultas iniciadas em abril de 2007, com a realização de um Seminário Nacional em parceria com a Associação para a Prevenção da Tortura – APT, em abril de 2007, convocado exclusivamente para a discussão do tema, na qual se debateram principalmente os princípios gerais de Mecanismos Preventivos de Combate à Tortura.

3.                Desde então, foram realizadas diversas reuniões ampliadas do Comitê Nacional para a Prevenção e Combate à Tortura – CNPCT e audiências públicas em Estados, além da discussão do tema em dois eventos internacionais: o Primeiro Seminário Regional do Mercosul sobre a Implementação do Protocolo Facultativo da Convenção da Tortura, que ocorreu nos dias 29 e 30 de maio de 2007 na cidade de Assunção - Paraguai e o Seminário Internacional O Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e os Estados Federados: mudanças e soluções possíveis, que aconteceu na cidade de Buenos Aires, Argentina entre os dias 23 a 26 de setembro de 2008.

4.                Nesse diapasão, importante contextualizar como se perfez a discussão e posterior confecção do Anteprojeto de Lei ora encaminhado.

5.                O Estado Brasileiro, ao ratificar em 12 de janeiro de 2007 o Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas contra a Tortura, contraiu a obrigação internacional de “manter, designar ou estabelecer, dentro de um ano da entrada em vigor do Protocolo ou de sua ratificação ou adesão, um ou mais mecanismos preventivos nacionais independentes para a prevenção da tortura em nível doméstico” (art. 17 do Protocolo Facultativo).

6.                E, ainda, em fevereiro de 2008, durante a elaboração do relatório do mecanismo de Revisão Periódica Universal (Universal Periodical Review – UPR) ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o Estado Brasileiro reafirmou o seu compromisso com a criação do Mecanismo Preventivo Nacional – MPN, intitulado, após inúmeras discussões, Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura – MNPCT, de acordo com as diretrizes e exigências estabelecidas pelo Protocolo Facultativo.

7.                Segundo o Protocolo Facultativo já citado, esses “mecanismos” – na verdade, órgãos voltados para a coordenação da implementação de medidas focadas na prevenção – deverão ter competência inter alia para “examinar regularmente o tratamento de pessoas privadas de sua liberdade, em centro de detenção”, “fazer recomendações a autoridades relevantes” e “submeter propostas e observações a respeito da legislação existente ou em projeto” (art. 19). Os “mecanismos” nacionais deverão gozar das prerrogativas que estão alinhadas no art. 20 do Protocolo Facultativo.

8.                O Anteprojeto de Lei, portanto, tem como fundamento o supracitado instrumento internacional, cujo texto foi aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 483, de 20 de dezembro de 2006 e promulgado pelo Decreto nº 6.085, de 19 de abril de 2007.

9.                Por meio do Anteprojeto de Lei, assegura-se que o MNPCT tenha autonomia; que os membros que o integram tenham habilidades e conhecimentos profissionais para o cumprimento dos seus mandatos e, por fim, que disponha dos recursos necessários para o seu funcionamento.

10.              Ademais, o Anteprojeto de Lei em tela obedece a recomendações emanadas do 40º período de sessões do Comitê Contra a Tortura da Organização das Nações Unidas, em documento intitulado: Diretrizes Preliminares para o Estabelecimento dos Mecanismos Preventivos Nacionais.

11.              Importante ressaltar que além de criar o MNPCT, o Anteprojeto de Lei integra em seu teor a criação do SNPCT.

12.              Em cumprimento às orientações discriminadas no texto do Protocolo Facultativo, cuja assinatura o Brasil honra com a criação do presente mecanismo, o SNCPT passa a existir aproximando órgãos e entidades públicas e privadas com atribuições legais ou estatutárias de realizar o monitoramento, a supervisão e o controle de estabelecimentos e unidades onde se encontrem pessoas privadas de liberdade, ou de promover a defesa dos direitos e interesses dessas pessoas.

13.              Assim, o Anteprojeto de Lei prevê que o SNCPT será composto pelo Comitê Nacional de Prevenção e Controle da Tortura no Brasil – CNPCT, pelo MNPCT, pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária - CNPCP e pelo órgão do Ministério da Justiça responsável pelo sistema penitenciário nacional, podendo ainda ser integrado por órgãos, entidades e autoridades de âmbito nacional e estadual. Foi observada, por conseguinte, a compatibilidade entre os requisitos de independência, efetividade, eficácia e a cooperação politicamente exequível entre diferentes instituições que têm competência e atribuições relativas à matéria.

14.              Os princípios e as regras da legislação pátria são preservados, havendo, devido à natureza especial do tema, disciplina específica quanto à independência na sua atuação, autonomia no exercício do cargo, bem como no que se refere à nomeação dos membros e destituição de mandatos.

15.              Dentre os aspectos inovadores, o MNPCT estabelece um sistema de visitas regulares aos locais de privação de liberdade – independente de comunicação prévia – cujo objetivo é o de prevenir a tortura, em vez de reagir à sua ocorrência, bem como exercer o monitoramento regular e periódico das unidades de custódia de pessoas.

16.              O Anteprojeto de Lei define ainda o conceito de pessoas privadas de liberdade, considerando como tais àquelas obrigadas a viver, em locais públicos ou privados, por mandado de autoridade judicial ou administrativa, do qual não podem sair independentemente de sua vontade, abrangendo locais de internação de longa permanência, centros de detenção, estabelecimentos penais, hospitais psiquiátricos, casas de custódia, instituições socioeducativas para adolescentes em conflito com a lei e centros de detenção disciplinar em âmbito militar, bem como nas respectivas instalações mantidas pelos órgãos elencados no art. 61 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984.

17.              A definição trabalha com conceito abrangente de centros de privação de liberdade, incluindo qualquer que seja a forma de detenção, aprisionamento, contenção ou colocação em estabelecimento público ou privado de controle ou vigilância, bem como unidades públicas ou privadas de internação, abrigo ou tratamento, o que certamente ajudará na prevenção e combate à tortura no nosso País.

18.              A estrutura delineada no Anteprojeto de Lei para o MNPCT, composto por onze peritos, mostra-se condizente para atender as obrigações internacionais assumidas pelo Brasil e as dimensões geográficas continentais do país. Nesse diapasão, impende mencionar que o art. 9º do Anteprojeto de Lei elenca como competências do MNPCT, além de outras: a) planejar, realizar e monitorar visitas periódicas e regulares a pessoas privadas de liberdade para verificar as condições de fato e de direito a que se encontram submetidas; b) articular com o Subcomitê de Prevenção da Organização das Nações Unidas, de forma a dar apoio a suas missões no território nacional; c) elaborar relatório circunstanciado de cada visita realizada; d) fazer recomendações e observações às autoridades públicas ou privadas, responsáveis pelas pessoas em locais de privação de liberdade; e) publicar e promover a difusão dos relatórios de visitas periódicas e regulares realizadas e o relatório anual; f) sugerir propostas e observações a respeito da legislação vigente; e) elaborar e aprovar seu regimento interno.

19.              Ademais, os membros do MNPCT atuarão no contexto em que o total de unidades de atendimento sócio-educativo em meio fechado no Brasil, apenas para adolescentes, em 2009, perfez o total aproximado de 16.940 adolescentes, sendo 11.901 na internação estrita, 3.471 em internação provisória e 1.568 em semi-liberdade. No tocante ao quantitativo de unidades de atendimento, atualmente existem 250 unidades de privação de liberdade, segundo os dados da Subsecretaria Nacional de Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

20.              Já em relação ao Sistema Penitenciário Brasileiro, segundo dados do Sistema de Informações Penitenciárias – Infopen – entre penitenciárias, presídios, colônias agrícolas, industrial ou similar, hospitais de custódia e tratamento, centros de observação, casas do albergado e patronatos, no ano de 2009, tem-se um total de 1.159 (mil cento e cinqüenta e nove) estabelecimentos penais, sem falar nas cadeias públicas, quartéis e nos hospitais psiquiátricos particulares. Com relação ao número de detentos, alcança-se à quantia de 446.613 (quatrocentos e quarenta e seis mil, seiscentos e treze) presos no sistema penitenciário e nas cadeias.

21.              Então, para que o MNPCT possa atender às suas finalidades com eficácia, eficiência e efetividade, procurou-se adequar a sua composição a essa complexa e dramática realidade, sem descurar do tão importante princípio da economicidade da Administração Pública. Dessa maneira, tendo em vista a relevância e complexidade das atribuições dos membros que comporão o MNPCT, propõe-se a estrutura do colegiado.

22.              Em suma, a adoção das normas contidas no Anteprojeto de Lei ora apresentado, valendo-se da legislação vigente, deixará o Brasil apto a prevenir e combater a tortura em nosso País em vez de somente reagir à sua ocorrência, bem como honrar com o presente as obrigações internacionais assumidas ao ratificar o Protocolo Facultativo.

23.               Do ponto de vista orçamentário, a instituição do MNPCT implicará em acréscimo de despesas com cargos em comissão, no âmbito do Poder Executivo, cuja proposição foi encaminhada ao Congresso Nacional por meio da Mensagem nº 376 de 31 de agosto de 2011 (PL nº 2205/2011 na Câmara dos Deputados). Para o funcionamento do MNPCT foi proposta a criação dos seguintes cargos no âmbito da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República: doze DAS-4 e um DAS-2. O impacto anualizado é da ordem de R$ 1,5 milhões. Com o encaminhamento da Mensagem nº 376, de 2011 foi cumprido dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO, pelo qual se exige que projetos que versem sobre a criação de cargos sejam encaminhados ao Legislativo até 31 de agosto de cada exercício, além de serem discriminados no Anexo V do PLOA, pois somente cumprindo tais exigências legais os cargos poderão ser providos.

24.               Quanto às despesas, decorrentes do apoio técnico, financeiro e administrativo necessários ao funcionamento do SNPCT, do CNPCT e do MNPCT, faz-se necessário mencionar, em cumprimento à Lei de Responsabilidade Fiscal, que as mesmas serão suportadas, no exercício em que a Lei entrar em vigor, pelo orçamento da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Adicionalmente, vale ressaltar, que tais despesas já estão previstas na proposta orçamentária de 2012 e no Plano Plurianual 2012-2015 encaminhados ao Congresso Nacional em 31 de agosto passado, assim como serão incluídas nos projetos de leis orçamentárias anuais subsequentes.

                    São essas, Senhora Presidenta, as razões pelas quais submetemos o anexo Anteprojeto de Lei à elevada apreciação de Vossa Excelência.

                    Respeitosamente,

 

 

 

 

Valter Correia da Silva
Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão

José Eduardo Cardozo
Ministro de Estado da Justiça

Maria do Rosário Nunes
Secretária de Direitos Humanos
 da Presidência da República