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CASA
CIVIL |
EM
Nº 004, de 10 de março de 2003, DO SENHOR SECRETÁRIO ESPECIAL DOS DIREITOS
HUMANOS.
Excelentíssimo
Senhor Presidente da República,
Como é do conhecimento de Vossa Excelência, o Brasil aderiu em 25 de
setembro de 1992 à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também
denominada Pacto de São José da Costa Rica, adotada por conferência
especializada interamericana sobre direitos humanos em 21 de novembro de 1969, e
promulgada no Brasil pelo Decreto no 678 de 6 de novembro de 1992. Ao
ratificar a Convenção Americana, o Estado brasileiro assumiu obrigações jurídicas
no plano internacional quanto à observância dos direitos humanos consagrados
naquele instrumento em todo o território nacional. As normas do sistema
interamericano de promoção e proteção dos direitos humanos passaram, assim,
a ter caráter subsidiário e complementar em relação ao ordenamento jurídico
interno, proporcionando aos cidadãos brasileiros um marco jurídico adicional
para a defesa de seus direitos humanos e liberdades fundamentais.
Quando da ratificação da Convenção, em 1992, o Estado brasileiro
optara por não fazer a declaração de reconhecimento da jurisdição compulsória
da Corte Interamericana de Direitos Humanos prevista no Artigo 62 (1) da Convenção.
O reconhecimento pelo Brasil da competência contenciosa da Corte ocorreu em 10
de dezembro de 1998, e a promulgação do Decreto nº 4463, de 8 de novembro de
2002, preencheram essa lacuna, abrindo a perspectiva de que os casos de violações
de direitos humanos cuja tramitação tenha sido iniciada após aquela data
atinjam o órgão judicial do sistema interamericano. Compete à Corte
determinar a responsabilidade internacional do Estado brasileiro por violações
ocorridas em seu território e prolatar sentenças que, segundo o Artigo 67 da
Convenção, são definitivas e inapeláveis.
Ao longo dos anos, o Estado brasileiro tem aprofundado seu relacionamento
com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão principal da
Organização dos Estados Americanos estabelecido em 1959 e que tem jurisdição
sobre todos os Estados Membros da OEA, independentemente de haverem ou não
ratificado a Convenção Americana. Respondendo afirmativamente a proposições
da CIDH, o Governo Federal estabeleceu, no ano de 2000, negociação com
peticionários e autoridades federais e estaduais, visando à celebração de
acordo de solução amistosa referente ao caso José Pereira. Os entendimentos
da solução amistosa em curso pressupõem pagamento de indenização à vítima
das violações sofridas.
O cidadão brasileiro José Pereira Ferreira tinha 17 anos de idade,
quando, em setembro de 1989, foi retido contra sua vontade e forçado a
trabalhar sem remuneração e em condições desumanas na Fazenda Espírito
Santo, localizada no sul do Estado do Pará. Ao tentar escapar da fazenda, José
Pereira foi alvejado por disparos de arma de fogo praticados por funcionários
da mesma, tendo sofrido lesões permanentes em seu olho direito.
A clareza da situação jurídico-material do caso José Pereira, a
gravidade desse crime - prática de trabalho escravo e tentativa de homicídio -
cuja repressão é de responsabilidade das autoridades federais, e a
possibilidade de publicação de relatório final da CIDH recomendando ao Estado
brasileiro a adoção de medidas visando a impedir violações aos dispositivos
da Convenção Americana sobre Direitos Humanos recomendam especial esforço de
reparação.
A iniciativa de pagamento de indenização ora sugerida se coaduna com o
compromisso do Estado brasileiro de estreitar a cooperação com os órgãos de
supervisão do cumprimento das obrigações decorrentes da adesão do Brasil aos
tratados internacionais de direitos humanos, bem como de combater e erradicar a
prática do trabalho escravo no território nacional.
A indenização, objeto do presente projeto de lei, é decorrente da
responsabilidade assumida pela União em tratados internacionais de direitos
humanos e negociada no âmbito do procedimento de soluções amistosas da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos.
Esclareço que a despesa decorrente do pagamento da indenização
recomendada correrá à conta do Programa de Trabalho 0154-Direitos Humanos,
Direitos de Todos, dotado na Secretaria Especial de Direitos Humanos.
Tendo em vista a gravidade do fato que se pretende reparar, os danos
causados à vida e à integridade física de José Pereira, e os quase quatorze
anos passados da data do ocorrido sem que a vítima tenha recebido qualquer
indenização, sugeriria tramitação especial de urgência urgentíssima para o
presente projeto de lei.
Com essas considerações, submeto o anexo
projeto de lei à elevada consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
NILMÁRIO
MIRANDA
Secretário
Especial dos Direitos Humanos