CASA CIVIL 
 
SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

EM nº 00055-MS

 Em 27 de maio de 2003.

              Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Tenho a honra de submeter à superior consideração de Vossa Excelência o anexo do projeto de lei cujas disposições visam instituir o auxílio-reabilitação psicossocial destinado a pacientes egressos de longas internações psiquiátricas com vistas à sua ressocialização.

Trata-se de medida que irá atender a um segmento da população brasileira quase integralmente desprovido de meios de amparo social e dos benefícios assegurados na legislação que dispõe sobre o bem-estar social e proteção do trabalho. Na rede assistencial do Sistema Único de Saúde, atualmente com cerca de 55.000 leitos em hospitais psiquiátricos, estima-se que cerca de 30% destes sejam ocupados por clientela dita "cativa", pacientes sem necessidade de tratamento em regime de internação, mas também sem possibilidades atuais de reinserção familiar e social, pela perda de vínculos ou dificuldades sócio-econômicas de suas famílias de origem.

Desta forma, cerca de 20.000 pessoas estão hoje sob regime de institucionalização estrita, levando ao desaparecimento de laços sociais e familiares permanentes, sem possibilidades de inclusão ou inserção social pelo trabalho, com agravamento de seu quadro clínico e de seu abandono social, o que torna imperativo assegurar meio eficaz de suporte social.

Ressalto que o esforço do Brasil em promover a Reforma Psiquiátrica é reconhecido em todo o mundo, sendo expressamente mencionado nos documentos oficiais da OMS e da OPS. O país conta com uma legislação moderna, cuja aprovação ocorreu após intenso debate ao longo dos 12 anos de tramitação da Lei no 10.216. A rede SUS de serviços de atenção diária (Centros de Atenção Psicossocial-CAPS) e as ações de saúde mental na rede básica têm sido mencionados em diversos países como exemplos de condução correta da política de reforma da assistência psiquiátrica. É necessário consolidar esta posição de destaque do governo brasileiro em uma área extremamente sensível do setor saúde, marcada pela alta prevalência dos transtornos e sua relevante vinculação com a crise social

Ademais, o benefício a ser instituído, além de parte integrante do programa de reintegração psicossocial desses pacientes, é medida indissociável de uma política responsável e humana de desinstitucionalização. Este componente foi adotado por diversos países que se destacaram na substituição da psiquiatria asilar, como a Inglaterra, Canadá, Itália, Espanha e outros.  Esta medida caracteriza-se como de responsabilidade do SUS e será integrada aos serviços residenciais terapêuticos, aos centros de atenção psicossocial e a iniciativas de inserção social e familiar, tendo seu fundamento legal expresso no art. 5o da Lei no 10.216, de 6 de abril de 2001, no qual se afirma que:

“O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.”

O quadro institucional da assistência psiquiátrica brasileira é de transição para o modelo extra-hospitalar, contudo avaliação abrangente, pela primeira vez realizada em 2002, de todos os 244 hospitais psiquiátricos brasileiros, mostrou um quadro que suscita preocupação, apontando para a necessidade de intensificação das medidas visando a substituição dos manicômios. No imaginário social, é fundamental que uma medida governamental relevante e carregada de simbolismo, como a implantação do auxílio-reabilitação psicossocial, seja adotada, reforçando a justa política de modernização e qualificação do atendimento em saúde mental.

O modelo de atenção á saúde mental extra-hospitalar, com ações de base territorial e comunitária, apresenta evidentes e comprovadas vantagens terapêuticas para os pacientes, além de assegurar-lhes a defesa e promoção de seus direitos fundamentais. O auxílio ora proposto será atribuído, segundo critérios técnicos, aos pacientes de longa permanência que deixam os hospitais para serem atendidos neste sistema extra-hospitalar.

O auxílio-reabilitação psicossocial apresenta especificidade em relação a outros benefícios sociais, uma vez que se vincula diretamente a um conjunto de ações de reintegração psicossocial, como reabilitação, residência terapêutica, trabalho protegido, lazer assistido e outros, e sua duração depende da evolução do programa de reabilitação do paciente. Ele não é da mesma natureza dos benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social, mas um instrumento eficaz de produção de reintegração psicossocial que atende a critérios técnicos e clínicos rigorosos e amplamente testados em várias experiências no mundo.

Estima-se que esta medida atingirá em potencial cerca de 15.000  pessoas, segundo critérios de exclusão e inclusão, atingindo até o final de 2003 cerca de 2.000 beneficiários, com um incremento para os anos seguintes de 3.000 novos beneficiários a cada ano. O contingente total previsto de beneficiários alcançará  5.000 pessoas em 2004, 8.000 em 2005, 11.000 em 2006 e 14.000 em 2007.

A margem de expansão garantida pelo art. 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluído pela Emenda Constitutucional no 29, de 13 de setembro de 2000, assegura elevação dos recursos destinados às ações e serviços públicos de saúde conforme a variação nominal do Produto Interno Bruto - PIB, até o exercício financeiro de 2004.

Destaco finalmente que a implantação do auxílio-reabilitação psicossocial é uma ação que representará uma sinalização clara do governo brasileiro de que vai investir no fortalecimento da política de saúde mental, beneficiando diretamente milhares de cidadãos e suas famílias, e indiretamente a todos os pacientes portadores de transtornos psiquiátricos.

Por esses motivos, espero merecer a aquiescência de Vossa Excelência, com o envio de projeto de lei ora proposto.

Respeitosamente,

 HUMBERTO SÉRGIO COSTA LIMA
Ministro de Estado da Saúde