SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES |
EM nº 00023 - MJ
Brasília, 9 de março de 2006
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Submete-se à consideração de Vossa Excelência o anexo Projeto de Lei
para alterar dispositivos da Lei no
8.072, de 25 de julho de 1990, “que dispõe sobre os crimes hediondos,
nos termos do artigo 5o, inciso XLIII, da Constituição
Federal, e determina outras providências”.
2.
O Projeto pretende modificar o artigo 2o da Lei no
8.072, de 1990, com objetivo de adequá-la à evolução jurisprudencial
ocorrida desde sua entrada em vigor, bem como de torná-la coerente com o
sistema adotado pela Parte Especial
do Código Penal e com os princípios gerais do Direito Penal.
3.
A proposta de alteração do inciso II do artigo 2o
busca estender o direito à liberdade provisória aos condenados por esses
delitos, em consonância com o entendimento que já vem se tornando corrente nas
instâncias superiores do Poder Judiciário (STF,
HC no 69.950; HC 77052
/ MG; HC no 79.204; HC
no 82.903; HC-QO no
83.173; HC no 84.797-MC;
HC no 84.884; HC no
85.036; HC no 85.900;
HC 87343 MC; HC no
87.424; HC 87438 MC/SP. STJ, RHC 2556/SP; RHC 2996/MG):
“A gravidade do crime imputado, um
dos malsinados 'crimes hediondos' (Lei no 8.072/90), não basta à justificação da prisão
preventiva, que tem natureza cautelar, no interesse dos interesses do
desenvolvimento e do resultado do processo, e só se legitima quando a tanto se
mostrar necessária: não serve a prisão preventiva, nem a Constituição
permitiria que para isso fosse utilizada, a punir sem processo, em atenção à
gravidade do crime imputado, do qual, entretanto, 'ninguém será considerado
culpado ate o trânsito em julgado de sentença penal condenatória' (CF, art.
5., LVII)” (RHC no 68.631, Rel. Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE).
4.
Dessa forma, preserva-se o
poder geral de cautela do juiz, que decidirá se os acusados dos crimes
previstos na Lei no 8.072, de 1990, poderão ou não responder
ao processo em liberdade. Pretende-se, com isso, evitar os efeitos negativos da
privação de liberdade quando, diante do exame das circunstâncias do caso
concreto, a medida se mostrar eventualmente desnecessária.
5.
A proposta de alteração
da regra do § 1o do artigo 2o da Lei no
8.072, de 1990, procura estabelecer uma forma mais rigorosa de progressão de
regime prisional para os condenados por crimes considerados hediondos ou a eles
equiparados, diferenciando-os dos
crimes comuns. Com efeito, enquanto a regra geral da Lei de Execução Penal
possibilita a progressão de regime mediante o cumprimento de um sexto da
pena privativa de liberdade (artigo 112), a nova proposta é de, nos casos
especificados, permitir a progressão apenas depois de cumpridos um terço da pena, ou
a metade, no caso de reincidência. Ou seja, para os crimes hediondos ou
equiparados serão duplicados os prazos de progressão adotados para os crimes
comuns.
6.
Esse aumento dos prazos para progressão de regime responde à
necessidade de estabelecer tratamento mais severo para os crimes definidos como
hediondos ou a eles equiparados. Contudo, procura-se também equilibrar a proporção
de tempo de pena cumprido em cada um dos regimes prisionais, tendo por base o
critério temporal já fixado pelo legislador ordinário para o livramento
condicional, que é de dois terços da pena (inciso V do artigo 83 do Código
Penal, acrescentado pela Lei no 8.072, de 1990). Assim, o
condenado por crime hediondo necessariamente passará pelos dois regimes
prisionais mais severos - fechado e semi-aberto - antes de poder obter o
livramento condicional.
7.
Além de aumentar o prazo de cumprimento de pena para a progressão de
regime prisional, o projeto ainda determina que a pena aplicada aos crimes
hediondos seja inicialmente cumprida em regime fechado. A proposição pretende
aumentar o rigor da administração da pena em casos considerados mais graves
pela lei penal, seguindo os critérios estabelecidos pela Lei no
8.072, de 1990, mas de forma compatível
com o princípio constitucional de individualização da pena, tal como
interpretado pelo Supremo Tribunal Federal, recentemente, no julgamento do Habeas
Corpus no 82.959, em que se decidiu o seguinte:
Em conclusão de julgamento, o
Tribunal, por maioria, deferiu pedido de habeas corpus e declarou, incidenter tantum,
a inconstitucionalidade do § 1o
do art. 2o
da Lei no 8.072/90,
que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos
crimes hediondos definidos no art. 1o
do mesmo diploma legal - v. Informativos 315, 334 e 372. Inicialmente, o
Tribunal resolveu restringir a análise da matéria à progressão de regime,
tendo em conta o pedido formulado. Quanto a esse ponto, entendeu-se que a vedação
de progressão de regime prevista na norma impugnada afronta o direito à
individualização da pena (CF, art. 5o, LXVI), já que, ao não permitir que se considerem as
particularidades de cada pessoa, a sua capacidade de reintegração social e os
esforços aplicados com vistas à ressocialização, acaba tornando inócua a
garantia constitucional. Ressaltou-se, também, que o dispositivo impugnado
apresenta incoerência, porquanto impede a progressividade, mas admite o
livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena (Lei no 8.072/90, art. 5o). Considerou-se, ademais, ter havido derrogação tácita
do § 1o
do art. 2o
da Lei no 8.072/90 pela Lei no 9.455/97,
que dispõe sobre os crimes de tortura, haja vista ser norma mais benéfica, já
que permite, pelo § 7o
do seu art. 1o, a progressividade do regime de cumprimento da pena.
Vencidos os Ministros Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de
Mello e Nelson Jobim, que indeferiam a ordem, mantendo a orientação até então
fixada pela Corte no sentido da constitucionalidade da norma atacada. O
Tribunal, por unanimidade, explicitou que a declaração incidental de
inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências
jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, já que a decisão
plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela norma
ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo
magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da
possibilidade de progressão.” (Informativo STF no
417, de 08 de março de 2006)
8.
São essas, Senhor Presidente, as razões pelas quais se submete à
elevada apreciação de Vossa Excelência o anexo Projeto de Lei.
Respeitosamente,
Marcio
Thomaz Bastos
Ministro de Estado da Justiça