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Presidência
da República |
EM Interministerial
nº 00039/MCT/MP
Brasília, 27 de setembro de 2002.
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Temos
a honra de submeter à apreciação de Vossa Excelência o anexo Projeto de Lei,
que “Dispõe sobre medidas de incentivo à pesquisa científica e tecnológica
e à inovação, altera o § 1º do art. 2º da lei nº
8.745, de 9 de dezembro de 1993, e dá outras providências”.
2. Afigura-se de grande relevo para o desenvolvimento do País a existência de lei que estabeleça mecanismos de gestão aplicáveis às universidades públicas e às instituições públicas de pesquisa, de forma a incentivá-las a executarem projetos de pesquisa que resultem em produtos e processos inovadores.
3. Com efeito, para garantir retorno aos investimentos públicos em ciência e tecnologia é necessário estimular a proteção dos produtos e processos inovadores, que saem das bancadas da pesquisa pública, mediante instrumentos de propriedade intelectual já disponíveis pela legislação nacional.
4. De outra parte, faz-se necessário garantir a existência de mecanismos eficazes de transferência das tecnologias inovadoras, e que tornem possível sua adoção pela indústria. Adite-se que o País carece de medidas de estímulo à constituição de alianças estratégicas entre empresas, à formação de consórcios entre o setor público e privado -- voltados para atividades de pesquisa de relevante interesse nacional -- à constituição de empresas de base tecnológica e à realização de atividades de pesquisa que envolvam risco tecnológico.
5. Esses temas já são objeto de leis específicas, em países desenvolvidos ou que deram grande salto para o desenvolvimento, como os Estados Unidos, França, Coréia, entre outros.
6. Como é do conhecimento de Vossa Excelência, um dos principais desafios que a sociedade brasileira precisa enfrentar, neste início de século, é o de acelerar a incorporação, pelo setor produtivo, do conhecimento científico e tecnológico desenvolvido pelas instituições de pesquisas do País. Com o intuito de incrementar a produção científica pátria, a qual já apresenta crescimento significativo, foram criados, por iniciativa de Vossa Excelência, fundos setoriais de apoio à pesquisa que deram maior impulso a essa produção, a partir de sua implantação. A par destas medidas de fomento da produção científica e considerando que a origem da maior parte dessa produção está nas universidades e institutos de pesquisa, torna-se necessário implementar mecanismos que estimulem e facilitem a transferência do conhecimento para empresas produtoras de bens e serviços, e que, dessa forma, gerem processos e produtos inovadores.
7. A interação entre a academia e a empresa nem sempre ocorre com facilidade. Por isso, vários países vêm adotando legislação que intensifique esse diálogo, e incremente as possibilidades de introdução de inovações tecnológicas tanto de produtos quanto de processos produtivos. Na Conferência Nacional sobre Ciência, Tecnologia e Inovação, realizada em 2001 e inaugurada por Vossa Excelência, essa questão foi amplamente debatida, e identificaram-se os principais obstáculos à desejada interação, assim como as medidas que poderiam ser adotadas para superá-los. Com o presente Projeto de Lei, buscamos enquadrar juridicamente esta questão, cujos principais pontos ressaltamos a seguir.
8. O Projeto disciplina de forma exaustiva a titularidade dos direitos de propriedade intelectual das inovações ou criações decorrentes de acordos celebrados entre instituições científicas e tecnológicas, entre estas e outras instituições, sejam públicas, privadas, de ensino e pesquisa ou industriais.
9. No desiderato de ampliar as possibilidades de proteção das invenções brasileiras, faculta-se ao pesquisador, criador de inovação, autorização para proteger em nome próprio criação que não seja do interesse das instituições científicas e tecnológicas. Assim, numerosíssimas inovações geradas no âmbito de tais instituições, que restariam desprotegidas, passam a contar com a possibilidade legal de proteção.
10.
No campo das licenças para exploração das criações geradas pelas
instituições científicas e tecnológicas, o Projeto apresenta importante
medida acautelatória, consubstanciada no comando legal que determina a concessão
somente a título não-exclusivo de todas as licenças de criações de
relevante interesse público. Esta disposição
garante a competição em áreas sensíveis, e fomenta a concorrência em busca
de menores preços e maior qualidade do bem protegido.
11. Ainda, como forma de estimular a geração de outras inovações, o Projeto estende a garantia de participação nos ganhos econômicos auferidos pela instituição com a exploração das inovações -- hoje prevista somente para as criações protegidas pela Lei da Propriedade Industrial -- aos criadores de novas variedades vegetais, de programas de computador, de topografias de circuitos integrados e de demais criações que acarretem novos produtos ou processos de produção.
12. Outrossim, ao estimular a produção do inventor independente, toma-se em consideração o expressivo número de criações significativas, desenvolvidas por inventores isolados, que deixam de ser utilizadas ou aprimoradas, após longos anos de pesquisa individual, por falta de projetos de viabilidade econômica, construção de protótipos, projetos de engenharia etc., que possam justificar sua comercialização para o setor produtivo.
13. O Projeto, portanto, inova, ao ensejar que tais criações, após avaliação, sejam “adotadas” por instituições científicas e tecnológicas que, mediante compromisso do inventor de com elas compartilhar os ganhos auferidos com a futura exploração da inovação, garantam a realização de projetos que venham a permitir a industrialização ou utilização dessas inovações pelo setor produtivo.
14. Além disso, o Projeto regula as relações com as instituições criadas com a finalidade de dar apoio à realização de projetos de pesquisa e de desenvolvimento científico e tecnológico, e legaliza a percepção de bolsas pelos servidores e empregados públicos das instituições científicas e tecnológicas -- quando se envolverem em projetos executados em parceria com as mencionadas instituições -- e permite a destinação de até 5% do montante acordado para cobertura de despesas operacionais e administrativas arcadas por tais instituições de apoio, quando da administração dos recursos previstos nos mencionados projetos executados em parceria. Corrige-se, assim, falha do sistema atual que não admite a remuneração das instituições científicas e tecnológicas, o que muitas vezes inviabiliza a realização de parceria com as instituições de apoio.
15. Houve, ademais, grande preocupação na valorização e estímulo ao trabalho do pesquisador e, nesse sentido, foi dedicada uma seção inteira a este assunto. Inicialmente, há um comando no sentido de que sejam reconhecidos as patentes e outros títulos de proteção intelectual nos quais figure como criador, para quaisquer avaliações de mérito, tanto na sua instituição de origem quanto fora. Não mais se limitaria a carreira do cientista à publicação de trabalhos em revistas indexadas no Brasil e no exterior mas, também, se estimularia a transformação de resultados de pesquisa em produtos e processos inovadores. Outro ponto relevante é a obrigatoriedade de a instituição de origem compartilhar com os seus pesquisadores e colaboradores a participação nos ganhos econômicos auferidos pela exploração de criação protegida pela mesma, na qual figure como inventor ou criador, a título de incentivo . Com a visão clara de que, na atualidade, grandes resultados em ciência e tecnologia são obtidos pelo esforço de cientistas vinculados muitas vezes a diferentes instituições, o Projeto prevê liberdade para que o pesquisador se afaste, facultando-lhe trabalhar em outra instituição pública , e estimula, assim, o trabalho em rede.
16. Para minimizar os efeitos da falta de docentes da carreira decorrentes de exoneração ou demissão, falecimento, aposentadoria, afastamento para capacitação e afastamentos decorrentes das medidas em menção, propõe-se nova redação para o § 1o do art. 2o da Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, ajustando o seu texto, portanto, aos comandos da proposta.
17. Ponto que merece especial enfoque, também, é o estímulo à transformação de cientistas em empresários. Nesse sentido, o Projeto de Lei concede ao cientista a possibilidade de licenciar-se da instituição pública de origem para constituir empresa de base tecnológica, com a finalidade de desenvolver atividade empresarial relativa à produção de bens diretamente decorrentes de sua criação. O licenciamento poderá ser de até quatro anos.. Findo o prazo da licença, caso a experiência não tenha sido bem sucedida, poderá voltar e reassumir seu cargo ou emprego na instituição de origem. Na hipótese de a experiência ser bem sucedida, o pesquisador poderá pedir exoneração e ainda receber, a título de incentivo financeiro, uma indenização correspondente a um inteiro e vinte e cinco centésimos da remuneração mensal, por ano de efetivo exercício na instituição de origem. A expectativa é de que a indenização venha a ser investida no crescimento da empresa de base tecnológica da qual é sócio, o que tornaria mais sólido o empreendimento e melhoraria a perspectiva de retorno do investimento realizado pela instituição.
18. Ao tempo em que flexibiliza o regime jurídico do professor pesquisador, o Projeto garante o não esvaziamento dos quadros das Universidades, assegura a manutenção da vaga no caso de exoneração voluntária de professores e pesquisadores para constituírem suas próprias empresas de base tecnológica, além de viabilizar a redução da jornada de trabalho de professor ou pesquisador, caso seja do interesse da instituição de origem.
19. No que tange à iniciativa privada, o Projeto de Lei prevê a constituição de arranjos pré-competitivos de diferentes formas, incluindo estímulo para a cooperação entre empresas, com vistas ao desenvolvimento de produtos e processos inovadores e a constituição de alianças estratégicas entre empresas. Autoriza a União a participar com recursos financeiros, humanos, equipamentos e infra-estrutura em empreendimentos destinados à constituição de ambientes ou centros voltados para atividades de pesquisa pré-competitiva, de relevante interesse nacional, que poderão alavancar setores inteiros da economia nacional. Para fortalecer a atividade inovadora nas empresas e considerando o custo elevado de investimentos em equipamentos destinados à pesquisa, o Projeto permite às instituições científicas e tecnológicas compartilharem seus laboratórios, equipamentos e instrumentos em suas próprias dependências ou colocá-los nas dependências de empresas privadas, mediante remuneração adequada e desde que tal permissão ou cessão não interfira diretamente com sua atividade fim nem com a mesma conflite. Em outras palavras, o Projeto de Lei permite, dentro de princípios éticos, que o setor público compartilhe investimentos vultosos com a iniciativa privada, em prol do desenvolvimento do País.
20. De realçar-se, por igual, que não se descurou do investimento novo, indispensável às empresas de base tecnológica mais promissoras, cuja criação se pretende estimular e, nesse sentido, o Projeto autoriza a instituição de Fundos Mútuos de Investimento em Empresas de Base Tecnológica, mediante recursos que venham a ser captados por meio do Sistema de Distribuição de Valores Mobiliários, nos termos da legislação vigente, sendo o seu funcionamento e administração regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários - CVM. Ainda com o objetivo de incentivá-las, prevê-se a utilização do denominado poder de compra do governo, consistente na atribuição, a elas, em condições de equivalência, de preferência nas aquisições de bens e serviços pela administração pública federal.
21. Cabe ressaltar, também, a previsão de estímulo ao risco tecnológico empresarial, inédito na legislação brasileira, que permite à União, em matéria de relevante interesse público, contratar empresa idônea de reconhecida capacitação tecnológica no setor, com vistas à realização de pesquisa que envolva risco tecnológico, para a solução de problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador, condicionada à aprovação de projeto, mediante auditorias técnicas e financeiras.
22. Por outro lado, o Projeto de Lei autoriza a União a fomentar ou participar da constituição de empresa de propósito específico, com prazo determinado, para o desenvolvimento de projetos científicos ou tecnológicos para obtenção de produto ou processo inovadores, destinados a atender a relevante interesse coletivo.
23. O Projeto de Lei, finalmente, estabelece a obrigatoriedade de as instituições científicas e tecnológicas adotarem em seus orçamentos medidas cabíveis para a administração e gestão de sua política de propriedade intelectual, tanto no que diz respeito às despesas de proteção de suas criações, quanto no que pertine à percepção e compartilhamento com seus cientistas dos ganhos econômicos decorrentes de sua exploração. Prevê, ainda, a possibilidade de as instituições científicas e tecnológicas arrecadarem recursos financeiros provenientes da exploração da propriedade intelectual, os quais constituirão receita própria.
24. De se ressaltar, por derradeiro, que as presentes medidas buscam dar concretude às normas programáticas insertas nos arts. 218 e 219 da Magna Carta, no que preconizam, respectivamente, que “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas”, e que “O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado, de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal”.
25.
Essas, Senhor Presidente, são as razões que nos motivaram a formular
tais medidas de incentivo à pesquisa científica e tecnológica e à inovação,
consubstanciadas no presente Projeto de Lei, que ora submetemos à elevada
consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
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RONALDO
MOTA SARDENBERG |
GUILHERME
GOMES DIAS |