Presidência da República
Secretaria-Geral
Secretaria de Assuntos Parlamentares
EM Interministerial Nº 001/MTE/MJ
Brasília, 23 de abril de 2002.
Excelentíssimo Senhor Presidente da República
Submetemos à elevada apreciação de Vossa Excelência o incluso anteprojeto de lei, objetivando promover alteração na Lei n.º 7.998, de 11 de janeiro de 1990, para assegurar o pagamento de seguro-desemprego aos trabalhadores que tenham sido submetidos à condição análoga a de escravo ou a regime de trabalho forçado.
2. A Constituição de 1988 é o substrato da presente iniciativa. O estabelecimento da cidadania, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa como fundamentos da República Federativa do Brasil (CF, art. 1°, incisos II, III e IV), demonstra o compromisso da democracia com todos os segmentos da sociedade e baliza a atuação do Governo na área social. Nos princípios gerais da atividade econômica (incisos VII e VIII do art. 170), valoriza-se a redução das desigualdades sociais e a busca do pleno emprego. Ademais, assegura-se como direito dos trabalhadores urbanos e rurais o benefício do seguro-desemprego em caso de desemprego involuntário (inciso II do art. 7º).
3. A realidade, não obstante, revela por vezes um descompasso frente ao conjunto de dispositivos legais. Há trabalhadores na área rural com restritas alternativas de emprego, os quais terminam submetidos a trabalho em condições análogas à de escravo.
4. Tal fato, como é do conhecimento de Vossa Excelência, vem sendo combatido de modo direto e severo pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, criado em 1995 como o braço operativo do Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado GERTRAF, criado pelo Decreto n.º 1.538, de 27 de junho de 1995. Há, outrossim, ocorrências esporádicas, sobretudo em locais de difícil acesso das regiões Norte e Centro-Oeste onde pontuam atividades de desmatamento e abertura de novas fazendas para introdução da pecuária, concentrando uma grande quantidade de trabalhadores trazidos de outras regiões, principalmente dos estados do Nordeste. Dados do Ministério do Trabalho e Emprego informam a ocorrência de 1.433 casos de trabalho escravo, forçado ou degradante durante o ano de 2001, evidenciando o incremento da fiscalização, melhor preparada e articulada no plano governamental, efetivando adequado planejamento, que supera os resultados de 2000, com 553 casos.
5. Trata-se de trabalhadores aliciados com falsas promessas, que ficam expostos às mais precárias condições de trabalho, alimentação e alojamento, à ausência de assistência médica, a descontos abusivos, ao ilegal sistema de cantina ou armazém, à inobservância da formalidade do contrato de trabalho e da legislação de segurança e saúde do trabalhador em geral, com freqüentes ameaças à sua incolumidade física e moral.
6. Assim, Senhor Presidente, urge prover um mínimo de assistência financeira ao trabalhador resgatado pelos agentes públicos da situação ora descrita, evitando que ele venha a ser novamente inserido no círculo vicioso do aliciamento e posterior submissão à mesma condição.
7. Propõe-se, então, o acréscimo de um dispositivo na legislação pertinente ao seguro-desemprego, de modo que sejam asseguradas três parcelas do Seguro-Desemprego, no valor de um salário mínimo cada uma, ao trabalhador que, em decorrência de ação no âmbito do retromencionado GERTRAF, vier a ser identificado como submetido a regime de trabalho forçado ou reduzido a condição análoga à de escravo, e dessa situação resgatado. O detalhamento da iniciativa, no que tange à sua operacionalização, caberá ao Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT, instância tripartite e paritária legitimamente incumbida de gerir o FAT, por proposta do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego. Com vistas a evitar o desvirtuamento da assistência, prevê-se um prazo mínimo de um ano dentro do qual não há falar em repetição do benefício, semelhante ao que vige atualmente para o seguro-desemprego comum. Ademais, visando à necessária articulação entre as ações públicas de emprego, prevê-se o encaminhamento desse trabalhador para qualificação profissional e recolocação no mercado de trabalho, através do Sistema Nacional de Emprego SINE.
8. O impacto financeiro dessa medida de tão elevado mérito situa-se em torno de 0,02% do montante destinado ao programa do seguro-desemprego, tomando-se por base os dados relativos a 2001. É, entretanto, evidente seu profundo alcance social. Ademais, coaduna-se com os melhores esforços da comunidade de países que se fazem representar na Organização Internacional do Trabalho - OIT. O benefício aqui enfocado representa mais uma resposta positiva do Brasil no combate ao trabalho forçado, tema discutido na 89ª Conferência Internacional do Trabalho, realizada em junho de 2001, em Genebra, e rediscutido nas sessões posteriores do Conselho de Administração da OIT.
9. Por fim, ressalte-se que a medida ora proposta representa uma chance concreta de ruptura do processo que leva o trabalhador, mesmo que retirado de situação análoga à de escravo, a retornar a ela por falta de alternativa para sobrevivência. Por conseguinte, à vista dos efeitos sociais inegavelmente benéficos da medida, bem como do seu reduzido impacto financeiro, torna-se recomendável a sua adoção imediata, sugerindo-se considerar a relevância e urgência da matéria para a transformação da presente proposta de projeto de lei em medida provisória.
10. São estas, Senhor Presidente, as razões que submetemos à Vossa Excelência ao propor o encaminhamento do presente anteprojeto de lei ao Congresso Nacional.
Respeitosamente,
PAULO JOBIM FILHO
MIGUEL REALE JÚNIOR
Ministro de Estado do Trabalho e Emprego
Ministro de Estado da Justiça