Presidência da República
Casa Civil
Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos

EMI n° 00057/2023 MJSP MF MME MMA MPI

 

Brasília, 19 de Maio de 2023.

          

Senhor Presidente da República,

  1. Submetemos à apreciação de Vossa Excelência a anexa proposta de Medida Provisória que visa dispor sobre normas de controle de origem, compra, venda e transporte de ouro em todo o território nacional, alterar e revogar artigos da Lei 7.766, de 11 de maio de 1989, e revogar artigos da Lei nº 11.685, de 2 de junho de 2008 e da Lei nº 12.844, de 19 de julho de 2013.
  2. Esta proposta é um resultado do Grupo de Trabalho criado pela Portaria nº 292, de 26 de janeiro de 2023, instituído no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública com a finalidade de propor medidas contra a atuação de organizações criminosas, inclusive com a exploração do garimpo, em terras indígenas. Compuseram o Grupo de Trabalho os seguintes órgãos: Secretaria de Acesso à Justiça; Secretaria Nacional de Segurança Pública; Polícia Federal; Polícia Rodoviária Federal. E foram convidados a participar representantes dos Ministérios dos Povos Indígenas, de Minas e Energia, da Defesa, dos Direitos Humanos e da Cidadania e da Fazenda.
  3. Foi identificado o problema de exploração ilegal de ouro em terras indígenas e unidades de conservação, a inexistência de controle sobre a cadeia de compra e venda do ouro oriundo do regimes de Permissão de Lavra Garimpeira - PLGs, brechas na legislação que permitem o “esquentamento” do ouro extraído ilegalmente de territórios protegidos, e que a exploração mineral ilegal causa devastação, conflitos socioambientais, contaminação e a crise humanitária pela qual passam vários territórios indígenas.
  4. Observou-se, ainda, que os problemas gerados pelo garimpo ilegal, sua relação com o crime organizado, com a lavagem de dinheiro e os conflitos socioambientais dele decorrentes não são problemas recentes:
  1. O Ministério Público Federal, a partir de sua 4ª Câmara, já havia elaborado um extenso estudo apontando os fatos mencionados no tópico anterior e demonstrando a necessidade de controle da cadeia de produção e de comércio, de modo a dificultar o processo de “esquentamento” do ouro extraído em locais onde essa extração é proibida.
  2. São inúmeras as operações da Polícia Federal para combater os crimes provenientes da exploração ilegal de ouro em terras indígenas;
  3. São inúmeros os relatos de que a presença ilegal do garimpo nas terras indígenas vem gerando uma série de conflitos violentos.
  4. No âmbito da ENCCLA – Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, já foram propostas várias alterações legislativas e regulamentares para estruturação de mecanismos de rastreabilidade na cadeia produtiva do ouro;
  5. Há várias decisões judiciais e de tribunal internacional determinando providências para proteção de povos e territórios indígenas.
  1. Merece destaque a recente decisão do STF na ADI 7345, assim dispondo:
  2. "(...) Ante o exposto, defiro o pedido formulado e determino, desde já, ad referendum do Pleno (art. 5º, §1º, da Lei 9.882 c/c art. 21 da Lei 9.868): 1) a suspensão da eficácia do art. 39, § 4º, da Lei Federal 12.844/2013; 2) a adoção, no prazo de 90 (noventa) dias, por parte do Poder Executivo da União (inclusive as autarquias de natureza especial que falaram nestes autos), de: (a) um novo marco normativo para a fiscalização do comércio do ouro, especialmente quanto à verificação da origem legal do ouro adquirido por DTVMs; (b) medidas (legislativas, regulatórias e/ou administrativas) que inviabilizem a aquisição de ouro extraído de áreas de proteção ambiental e de Terras Indígenas".
  3. A presente proposta de Medida Provisória, portanto, decorre do atual custo socioambiental e financeiro do modelo vigente de ingresso no mercado formal do ouro oriundo de áreas de garimpo. A proposição legislativa pretende unificar e aumentar o controle sobre a cadeia do ouro e fechar brechas legislativas que permitem o “esquentamento” do ouro extraído de forma ilegal de territórios indígenas e unidades de conservação, como estratégia do combate à lavagem de dinheiro e ao crime organizado, sobretudo na Amazônia.
  4. Com base nos motivos de ordem social e de saúde (violência e contaminação decorrente do garimpo em terras indígenas), ambiental (devastação decorrente da atividade minerária ilegal), econômica (prejuízo da atividade e evasão de divisas decorrente de atividade ilegal) e jurídica (atividades ilícitas, decisões judiciais e internacionais determinando providências), está demonstrada a relevância e urgência para edição da Medida Provisória ora proposta. Importante frisar que o STF determinou o prazo de 90 (noventa) dias para criação de novo marco normativo.
  5. As soluções e providências contidas na proposta são as seguintes:
  1. Primeira aquisição do ouro oriundo do regime de PLGs exclusivamente por entidades autorizadas pelo BACEN;
  2. Criação de cadeias de controle pelo Sistema Financeiro Nacional, órgãos sobre lavagem de dinheiro e Agência Nacional de Mineração - ANM;
  3. Criação de rastreabilidade do ouro oriundo do regime de PLGs a partir de guia de controle e custódia;
  4. Exigência de nota fiscal eletrônica;
  5. Previsão de pena de apreensão e perdimento em favor da União para o ouro que circular fora dessas regras;
  6. Fim da presunção de boa-fé e possibilidade de responsabilização de elos da cadeia de compra e venda de ouro (dever de comprovação de onde vem a produção do ouro proveniente das PLGs);
  7. Criação de sistema para registro, controle e gestão das informações pela ANM;
  8. Revogação do art. 2º e o § 1º do art. 3º, da Lei nº 7.766, de 11 de maio de 1989, art. 9º da Lei nº 11.685, de 2 de junho de 2008 e arts. 37 a 42 da Lei nº 12.844, de 19 de julho de 2013.
  1. Praticamente todas as alterações aqui apresentadas são fruto de debate técnico já bastante aprofundado no âmbito da ENCCLA – Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, tendo a proposta de MP incorporado as sugestões de estruturação de mecanismos de rastreabilidade na cadeia produtiva do ouro.
  2. A medida também está em consonância com o art. 225, caput, da Constituição Federal, uma vez que, ao disciplinar as operações com ouro oriundo de Permissão de Lavra Garimpeira, inibe a expansão das atividades de garimpo ilegal, responsáveis por intenso ônus socioambiental. Conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), entre os anos de 2015 e 2021, o desmatamento causado pela mineração na Amazônia cresceu aproximadamente 7 vezes. A proposta legislativa vai ao encontro, portanto, do dever constitucional de tutela do meio ambiente em atenção aos princípios da solidariedade intergeracional e da precaução.
  3. Cumpre destacar, por fim, a compatibilidade da proposta de Medida Provisória com o texto constitucional em relação à proteção dos povos indígenas, uma vez que as atividades ilícitas de aproveitamento mineral se concentram na Amazônia Legal, especialmente em territórios indígenas. Além dos já citados ônus, o atual modelo de recuperação do ouro utiliza o mercúrio, responsável pela contaminação da população indígena localizada nessas áreas impactadas. Deste modo, a adoção de sistemas de operações mais rígidos pretende desestimular o garimpo ilegal, especialmente nestes territórios protegidos.
  4. A crise humanitária na Terra Indígena Yanomami e o crescimento dos conflitos no campo nos anos de 2021 e 2022 robustecem o argumento de necessária atuação emergencial do Estado na tutela do meio ambiente e dos povos originários.
  5. Assim, Senhor Presidente, apresentamos as razões pelas quais submetemos à sua elevada apreciação o projeto de Medida Provisória em questão.

          

 Respeitosamente,         

 

Flávio Dino de Castro e Costa
Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública

Fernando Haddad
Ministro de Estado da Fazenda

Alexandre Silveira de Oliveira
Ministro de Estado de Minas e Energia

Marina Silva
Ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima

Sônia Bone de Sousa Silva Santos
Ministra de Estado dos Povos Indígenas