Presidência da República

Secretaria-Geral

Subchefia para Assuntos Jurídicos

ALVARÁ de 17 de JUNHO de 1809

Estabelece os impostos do papel sellado e das heranças e legados.

Eu O Príncipe Regente, faço saber aos que este Alvará com força de lei virem: que havendo crescido de dia em dia as necessidades publicas pela occurrencia de muitas despezas, que as circunstancias internas e externas teem feito necessarias, sendo preciso estabelecerem-se novos impostos para acudir ás precisões do Estado; e sendo o do papel sellado um dos indirectos, que pelos tempos e economia com que é arrecadado; pela maneira com que é exigido; pela pratica da maior parte das nações cultas; e pelo que em outro tempo se observou nesta monarchia ja mereceu a minha real approvação : fui servido estabelecel-o pelos Alvarás de 10 de Março de 1797, de 24 de Abril de 1801, de 27 de Abril de 1802, e reduzil-o pelo Alvará de 24 de Janeiro de 1804 a que sómente ficassem pagando na Chancellaria-mór a imposição do sello os Alvarás de mercê, foros, cartas, padrões, titulos, patentes, privilegios, isenções, provisões e graças de qualquer natureza, isentando os mais papeis, e regulando depois a fórma deste recebimento pelo Decreto de 12 de Junho do mesmo anno : e considerando por uma parte, que de muitos papeis, ainda mesmo dos forenses, se póde perceber toda a utilidade do imposto, sem haver embaraço na expedição dos negócios a que elles dizem respeito, e sem as despezas do fabrico e administração do sello; e por outra parte, que os impostos nas heranças e legados, que não provierem de ascendentes e descendentes, se podem estabelecer sem grave incommodo dos que as vierem a perceber, por serem um beneficio fortuito, e que lhes não é devido de rigoroso direito e obrigação e conhecido e praticado por algumas nações civilisadas antigas e modernas, e que podem facilmente arrecadar-se na repartição em que se cobram os direitos do sello, determinando-se e fazendo-se necessario que as quitações que se derem em Juizo para serem os testamenteiros desobrigados, sejão selladas, pagando-se pelo sello a porção que for imposta, e dando-se outras providencias para se fazer esta arrecadação com exactídão e facilidade: hei por bem, tendo ouvido o parecer de pessoas doutas e zelosas de meu real serviço e da felicidade dos meus fieis vassallos, determinar o seguinte.

I. Os livros denominados Diario e Mestre dos negociantes e mercadores de retalho, bem como os documentos delles extrahidos, serão nullos e de nenhum effeito em Juizo, sem que seus donos tenham pago a taxa de 20 réis por cada folha, como se acha determinado no § I. do Alvará de 27 de Abril de 1802 para os livros de papel ordinario, pondo-se o sello de minhas Reaes Armas na ultima folha do livro com uma verba, em que se declare o pagamento que se fez, e o numero de folhas que o mesmo livro contém: recahindo a nullidade unicamente sobre as pessoas a quem semelhantes livros pertencerem, e que os não tiverem feito sellar, para nelles principiarem a sua escripturação logo depois da publicação deste Alvará, tanto nesta Corte e Provincia do Rio de Janeiro, como em todas as Capitanias deste Estado e Dominios Ultramarinos, á excepção dos da Asia ; ficando porém exceptuados desta taxa todos os mais livros auxiliares, e os mesmos Diario e Mestre já principiados, que poderão ser concluidos sem sello, devendo este só ter logar quanto aos livros novos.

II. A mesma taxa e sello posto pelo sobredito methodo, e no prazo de dous mezes nesta Côrte e Província, e de seis mezes em as Capitanias deste Estado e Dominios Ultramarinos, á excepção dos da Asia, contados da publicação deste Alvará, serão sujeitos os livros das Camaras, os de Notas de Tabelliães, os das Irmandades, Confrarias e Ordens Terceiras, os dos Assentos dos Baptismos, Casamentos e Obitos de todas as Parochias; e os que nelles, findo o prazo de tempo estabelecido, escreverem, ou continuarem a escrever sem o devido pagamento do sello, incorrerão na pena de 100$000 metade para a Real Fazenda, e metade para o denunciante, além do perdimento do Officio em que ficarão incursos os Escrivães das Camaras, e os Tabelliães que o contrario fizerem.

III. As escripturas publicas, seus traslados, as publicas fórmas, certidões, procurações feitas judicialmente, ou por pessoas de qualquer ordem e condição, provimentos de officios, passaportes. autos de posse, tombos, inquirições e justificações de genere, justificações de serviços e attestações, não poderão ser apresentados em Juizo e fóra delle, nem reputarem-se valiosos, bem como todos e quaesquer documentos com que se pretender instruir os requerimentos que me forem feitos directamente pelas Secretarias de Estado e Tribunaes Regios, ou que forem feitos a quaesquer Magistrados, Governadores, Corporações, e autoridades publicas, seculares e eclesiasticas, sem que se haja pago por cada meia folha de papel de taes documentos e titulas a taxa de 40 réis estabelecida no § VIII. do dito Alvará de 27 de Abril de 1802, o que deve constar pelo sello e verba posta na ultima pagina, com declaração das meias folhas que se acham escriptas.

IV. Os creditos, obrigações, recibos, letras seguras, de cambio e de qualquer outra natureza, poderão ser feitas como até agora, e continuar o seu gyro sem dependencia do sello e pagamento da taxa, quando porém houverem de ser ajuizarias, e antes de serem autoados, deverão seus donos pagar a taxa estabelecida para cada um delles no referido Alvará de 27 de Abril de 1808. E isto se entenderá pelo que respeita ás letras quando se intentar qualquer acção em Juizo, fazendo-se a competente citação para ella, e não quanto aos protestos que se deverão fazer antes do pagamento da taxa. Os testamentos da mesma fórma somente serão sujeitos ao pagamento da taxa estabelecida no § VIII. do sobredito Alvará, quando houverem de ir a Juizo para o seu cumprimento, sem que antes disso se possam reputar nullos pela falta de sello.

V. Os Escrivães dos differentes Juizos seculares e ecclesíasticos não poderão fazer conclusos os autos de qualquer natureza que sejam para sentença final, sem que se tenha pago primeiramente a taxa de 10 réis por cada meia folha de papel em que se tiver escripto: serão obrigados a declarar nos mesmos autos e por escripto quantas meias folhas contém até ao termo da conclusão final, deduzindo do seu numero aquellas, que já tiverem pago a taxa antes de serem incorporadas nos autos, e sómente depois de constar por uma verba posta nos mesmos autos, que foi paga a competente taxa e que fica carregada ao respectivo Thesoureiro, sendo esta verba assignada pelo Escrívão deste recebimento, e sellada com as minhas Reaes Armas, é que poderão fazer conclusos os autos para final sentença; e os que o contrario praticarem, incorrerão na pena do perdimento de seus officios e do decuplo da taxa que devia ser paga; e os magistrados na pena de suspensão e emprazamento, havendo proferido a final sentença sem preceder o pagamento da taxa.

VI. Todas as cartas precatorias e de inquirição, cartas rogatorias para os Juizos Ecclesiasticos, cartas testemunhaveis, sentenças ou formaes de partilhas, e cartas de arrematações, não poderão ser assignadas pelos Juizes e ter execução, sem que conste por uma verba e pelo sello de minhas Armas nellas posto, que foi paga a taxa de 20 réis por cada meia folha de papel. O mesmo se deverá praticar com as sentenças e mandados de preceito extrahidos do processo, delarando o Escrivão quantas meias folhas de pa.pel contém o processo depois da sentença final, e de quantas se compõe a mesma sentença; e no mandado de preceito, quantas meias folhas contém o processo de que foi extrahido, para se fazer por esta declaração a conta do pagamento da taxa, com especificação da pessoa que pagou, para se carregar na regra das custas. E os que o contrario fizerem incorrerão nas penas estabelecidas no § V.

VII. Em todos os processos que findarem sem que delles se extraia sentença ou mandado de preceito, ou em que houver composição das partes, não poderão os Contadores do Juizo contar as custas, nem os Escrivães recebel-as, sem que primeiramente se haja pago o sello de 20 réis por cada meia folha de papel que taes processos tiverem; incorrendo os Contadores e Escrivães que o contrario fizerem, nas penas declaradas no § V.

VIII. Nenhuma quitação de herdeiro ou de legatario, por effeito de testamento, poderá ser aceita em Juizo, nem se poderá com ella haver o testamento por cumprido, sem que a quitação tenha sido primeiramente sellada, pagando-se por este sello a decíma da herança ou legado que effectivamente se arrecadar, não sendo os herdeiros ou legatarios descendentes ou ascendentes do testador.

IX. Igualmente se praticará o mesmo com os herdeiros que não forem descendentes ou ascendentes do fallecido ab-intestado; com differença, porém, que o herdeiro que for parente do fallecido ab-intestado até o segundo gráo inclusive, contado na fórma do Direito Canoníco, não poderá ser empossado da herança, sem que tendo feito inventario, e constando por documento autentico a quantia liquida da herança no documento, pelo qual se lhe houver de mandar passar mandado de entrega, tenha feito pôr o se11o, e com elle pago a decíma da herança que realmente arrecadar; e a quinta parte, sendo parente fóra do segundo gráo. E os Ministros a quem toca, farão que os testamenteiros não sejam omissos em dar conta dos testamentos e que de todas as heranças ab-intestado, não havendo herdeiros forçados, se proceda a inventario e entrega judicial para poderem ter logar estas providencias.

X. Nesta Corte se fará o recebimento destas taxas pelo sello na Chancellaria-Mór do Estado do Brazil, no Real Erario, e nas Estações que delle forem dependentes, para prompta expedicção das partes; e nas Capitanias deste Estado e Dominios Ultramarinos, pela repartição estabelecida pelas Juntas da Administração e Arrecadação da minha Real Fazenda para a cobrança do sello dos papeis designados no Alvará de 24 de Janeiro de 1804. E nas demais Cidades e Villas onde houverem Juizes de Fóra e Ordinarios, se fará o recebimento por um Thesoureiro nomeado pelos Officiaes das Camaras, a quem se fará a carga em um livro rubricado pelos Juizes de Fóra, onde os houver, e pelos Ouvidores das Comarcas onde só forem Ordinarios, escrevendo nelles um dos Escrivães que mais habil for, nomeando-os os Juizes, a quem se remetterá o cunho das minhas Armas Reaes, para fazer imprimir o seIlo, em cujo poder se guardará. E nenhum emolumento por isto receberão o Juiz e o Escrivão, a quem farei as remunerações que houver por bem, e somente o Thesoureiro cobrará um por cento do que arrecadar. Emquanto porém se não poderem enviar todos os cunhos de minhas Reaes Armas para as differentes povoações, supprirá a falta do sello a verba do pagamento, sendo esta assignada pelo Juiz, pelo Thesoureiro e pelo Escrivão.

XI. Todos os tres mezes remetterão os Juizes o que se tiver recebido, aos meus Reaes cofres das Juntas da Fazenda respectivas, acompanhado do competente conhecimento, assignado pelo Escrivão e Thesoureiro, a quem se dará quitação em forma legal.

XII. Os Ouvidores das Comarcas perguntarão nas devassas de correição nas Villas onde houverem Juizes Ordinarios, pelos descaminhos que se fizerem na minha Real Fazenda, nesta parte dos rendimentos, e pelo modo com que se houverem os empregados nesta repartição, dando em culpa aos que tiverem nella delinquido. E os sindicantes perguntarão por este artigo nas residencias, que tirarem aos Juizes de Fóra e Ouvidores das Comarcas.

XIII. Os Escrivães que receberem quaesquer papeis sujeitos á taxa e sello, sem que tenha sido paga, incorrerão na pena do perdimento do Officio, e no decuplo do valor da taxa, e os Magistrados na de suspensão e emprazamento, e os Juizes Ordinarios, além da suspensão, no pagamento do decuplo da taxa do papel, que consentirem nos autos, sem pagar o sello competente, o que se provará por haverem proferido algum despacho depois de estar inserto nos autos o papel que devera ser primeiramente sellado , E todos os que falsarem o se110 e as assignaturas das verbas do pagamento, incorrerão nas penas dos que falsificão o meu signal, impostas na Ord, do lív , V. tit, LII. E os que receberem heranças ou legados por conluios particulares perdel-os-hão com outro tanto do seu valor para a minha Real Fazenda.

XIV. Para este fim, e para serem punidos todos os que commetterem alguma outra fraude, se admittirão denuncias, applicando-se ao denunciante a metade das penas pecuniarias, e sendo a outra para a minha Real Fazenda.

E este se cumprirá como nelle se contem : pelo que mando ao Presidente do meu Real Erario; Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Conselho da minha. Real Fazenda . Regedor da Justiça; e a todos os mais Tribunaes e pessoas a quem pertencer o conhecimento deste Alvará, o cumpram e guardem, como nelle se contém. E valerá como Carta passada pela Chancellaria, posto que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação em contrario.

Dado no Palácio do Rio de Janeiro em 17 de Junho de 1809.

PRINCIPE com guarda.

Conde de Aguiar.

Alvará com força de lei, pelo qual Vossa Alteza Real é servido ampliar o disposto no Alvará de 24 de Janeiro de 1804, e sujeitar ao sello as quitações dos herdeiros e legatarios, que não forem descendentes ou ascendentes do fallecido, e que se derem em Juizo para serem os testamenteiros desobrigados, praticando- se o mesmo com os documentos, pelos quaes se mandar passar mandado de entrega da herança aos herdeiros ab-intestado ; tudo na fórma acima declarada.

Para Vossa Alteza Real ver.

Joaquim Antonio Lopes da Costa o fez.

Este texto não substitui o publicado na CLBR de 1809

 

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