Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DESPACHO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

Processos nº 00190.027761/2014-22, nº 00400.004961/2009-07, nº 00400.005436/2009-29, nº 00400.007419/2012-21, nº 00400.019536/2009-32, nº 46070.000047/2015-35, nº 52000.002434/2007-22, nº 00400.004961/2009-27 e nº 52020.000549/2014-73.  Parecer nº AM - 06, de 24 de abril de 2019, do Advogado-Geral da União, que adotou, nos termos estabelecidos nos Despachos do Consultor-Geral da União nº 00378/2019/GAB/CGU/AGU e nº 1.139/2018/GAB/CGU/AGU, e no Despacho da extinta Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos da Consultoria-Geral da União nº 1/2018/CNU/CGU/AGU, o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/cCGU/AGU da extinta Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos da Consultoria-Geral da União.  Aprovo.  Publique-se para os fins do disposto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.  Em 25 de abril  de 2019.

PROCESSOS ADMINISTRATIVOS NºS: 00190.027761/2014-22, 00400.005436/2009-29, 00400.007419/2012-21, 00400.019536/2009-32, 46070.000047/2015-35, 52000.002434/2007-22, 00400.004961/2009-27 e 52020.000549/2014-73
INTERESSADO: MINISTÉRIO DA ECONOMIA E OUTROS
ASSUNTO: Sigilo Bancário e o princípio constitucional da publicidade.

PARECER Nº AM - 06

ADOTO, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, nos termos dos Despachos do Consultor-Geral da União nº 00378/2019/GAB/CGU/AGU e nº 1.139/2018/GAB/CGU/AGU, e do Despacho nº 1/2018/CNU/CGU/AGU, o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/CGU/AGU, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40, § 1º, da referida Lei Complementar, tendo em vista a relevância da matéria versada.

Em 25 de abril de 2019.

ANDRÉ LUIZ DE ALMEIDA MENDONÇA
Advogado-Geral da União

 DESPACHO DO CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO Nº 00378/2019

Processo: 00190.027761/2014-22, 00400.004961/2009-07, 00400.005436/2009-29, 00400.007419/2012-21, 00400.019536/2009-32, 46070.000047/2015-35, 52000.002434/2007-22, 00400.004961/2009-27 e 52020.000549/2014-73.
Interessados: Ministério da Economia e outros.
Assunto: Sigilo Bancário e o princípio constitucional da publicidade.

Exmo. Senhor Advogado-Geral da União,

1. Ratifico o Despacho do Consultor-Geral da União nº 1.139/2018/GAB/CGU/AGU (seq. 17) e o Despacho nº 1/2018/CNU/CGU/AGU (seq. 16), e nestes estritos termos aprovo o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/CGU/AGU (seq. 15).

2. Ressalte-se, por oportuno, que o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/CGU/AGU (seq. 15) já foi definitivamente aprovado pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 1.139/2018/GAB/CGU/AGU (seq. 17), no entanto, considerando a relevância da questão jurídica tratada e o disposto no § 3º do art. 1º do Decreto nº 2.346, de 1997, elevo referenciado Parecer à apreciação de Vossa Excelência, de maneira a ensejar que o entendimento do Supremo Tribunal Federal referente à matéria (MS nº 33.340) seja estendido e aplicado, de forma vinculante, por toda a Administração Pública Federal.

3.Nestes termos, submeto as manifestações desta Consultoria-Geral da União à vossa apreciação para que, em sendo acolhidas, sejam encaminhadas à elevada apreciação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República para os fins dos art. 40, § 1º, e art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.

Brasília, 25/4/2019.

ARTHUR CERQUEIRA VALÉRIO
ADVOGADO DA UNIÃO
CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO

 Despacho do Consultor-Geral da União nº 1.139/2018 GAB/CGU/AGU

NUP: 00190.027761/2014-22 (00400.004961/2009-07,00400.005436/2009-29, 00400.007419/2012-21, 00400.019536/2009-32,  46070.000047/2015-35, 52000.002434/2007- 22, 00400.004961/2009-27 e 52020.000549/2014—73)
INTERESSADO: Ministério do Trabalho e outros.
ASSUNTO: Extensão do sigilo bancário em face do princípio da publicidade.

1. Aprova-se, por força do art. 5º, inciso IV e parágrafo único, do Ato Regimental AGU nº 5, de 27 de setembro de 2007, o Despacho nº 1/2018/CNU/CGU/AGU, de 22 de janeiro de 2018, no que acolho o Parecer Plenário 5/2017/CNU/CGU/AGU, de 30 de novembro de 2017.

2. Dê-se amplo conhecimento à manifestação consultiva ora aprovada, com ciência aos órgãos de execução desta CGU, aos demais órgãos de direção desta Advocacia-Geral da União, bem como à Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla) do Ministério da Justiça.

Brasília, 28 de dezembro de 2018

Marcelo Augusto Carmo de Vasconcellos
CONSULTOR-GERAL OA UNIÃO

DESPACHO n. 00001/2018/CNU/CGU/AGU

NUP: 00190.027761/2014-22 (00400.004961/2009-07, 00400.005436/2009-29, 00400.007419/2012-21, 00400.019536/2009-32, 46070.000047/2015-35, 52000.002434/2007-22, 00400.004961/2009-27 e 52020.000549/2014-73)

INTERESSADOS: Ministério do Trabalho e outros.

ASSUNTOS: Extensão do sigilo bancário em face do princípio da publicidade.

Exmo. Senhor Consultor-Geral da União substituto,

1. A Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos/CNU, em sessão plenária realizada no dia 30 de novembro de 2017, aprovou o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/CGU/AGU, que trata da inaplicabilidade das reservas do sigilo bancário às operações que envolvam recursos públicos, incluindo os recursos titularizados por coletividades parciais (como os trabalhadores regidos pela CLT ou servidores públicos) e que sejam administrados pelo poder público, tais como o FGTS e o Fundo PIS-PASEP.

2. Diante do preceito constitucional da publicidade, que rege a Administração Pública, a CNU concluiu que não se aplica o sigilo bancário às operações em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; bem como naquelas operações que envolvam recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira.

3. O entendimento ora consolidado fundou-se, precipuamente, naquele decorrente do julgamento do Mandado de Segurança nº 33.340, do Supremo Tribunal Federal, oportunidade em que a Suprema Corte fez prevalecer a tese de que ao Tribunal de Contas da União não poderia ser oposta a exceção do sigilo bancário nas hipóteses em que as operações financeiras fiscalizadas envolvam recursos públicos, uma vez que tais operações "estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal", logo "quem contrata com o poder público não pode ter segredos, especialmente se a revelação for necessária para o controle da legitimidade do emprego dos recursos públicos. É que a contratação pública não pode ser feita em esconderijos envernizados por um arcabouço jurídico capaz de impedir o controle social quanto ao emprego das verbas públicas":

Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTROLE LEGISLATIVO FINANCEIRO. CONTROLE EXTERNO. REQUISIÇÃO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO DE INFORMAÇÕES ALUSIVAS A OPERAÇÕES FINANCEIRAS REALIZADAS PELAS IMPETRANTES. RECUSA INJUSTIFICADA. DADOS NÃO ACOBERTADOS PELO SIGILO BANCÁRIO E EMPRESARIAL.

1. O controle financeiro das verbas públicas é essencial e privativo do Parlamento como consectário do Estado de Direito (IPSEN, Jörn. Staatsorganisationsrecht. 9. Auflage. Berlin: Luchterhand, 1997, p. 221).

2. O primado do ordenamento constitucional democrático assentado no Estado de Direito pressupõe uma transparente responsabilidade do Estado e, em especial, do Governo. (BADURA, Peter. Verfassung, Staat und Gesellschaft in der Sicht des Bundesverfassungsgerichts. In: Bundesverfassungsgericht und Grundgesetz. Festgabe aus Anlass des 25jähringe Bestehens des Bundesverfassungsgerichts. Weiter Band. Tübingen: Mohr, 1976, p. 17.)

3. O sigilo de informações necessárias para a preservação da intimidade é relativizado quando se está diante do interesse da sociedade de se conhecer o destino dos recursos públicos.

4. Operações financeiras que envolvam recursos públicos não estão abrangidas pelo sigilo bancário a que alude a Lei Complementar nº 105/2001, visto que as operações dessa espécie estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal. Em tais situações, é prerrogativa constitucional do Tribunal [TCU] o acesso a informações relacionadas a operações financiadas com recursos públicos.

5. O segredo como “alma do negócio” consubstancia a máxima cotidiana inaplicável em casos análogos ao sub judice, tanto mais que, quem contrata com o poder público não pode ter segredos, especialmente se a revelação for necessária para o controle da legitimidade do emprego dos recursos públicos. É que a contratação pública não pode ser feita em esconderijos envernizados por um arcabouço jurídico capaz de impedir o controle social quanto ao emprego das verbas públicas.

6. “O dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos impõe não haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no povo (art. 1º, parágrafo único, da Constituição), ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida.” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª edição. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 114).

7. O Tribunal de Contas da União não está autorizado a, manu militari, decretar a quebra de sigilo bancário e empresarial de terceiros, medida cautelar condicionada à prévia anuência do Poder Judiciário, ou, em situações pontuais, do Poder Legislativo. Precedente: MS 22.801, Tribunal Pleno, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 14.3.2008.

8. In casu, contudo, o TCU deve ter livre acesso às operações financeiras realizadas pelas impetrantes, entidades de direito privado da Administração Indireta submetidas ao seu controle financeiro, mormente porquanto operacionalizadas mediante o emprego de recursos de origem pública. Inoponibilidade de sigilo bancário e empresarial ao TCU quando se está diante de operações fundadas em recursos de origem pública. Conclusão decorrente do dever de atuação transparente dos administradores públicos em um Estado Democrático de Direito.

9. A preservação, in casu, do sigilo das operações realizadas pelo BNDES e BNDESPAR com terceiros não, apenas, impediria a atuação constitucionalmente prevista para o TCU, como, também, representaria uma acanhada, insuficiente, e, por isso mesmo, desproporcional limitação ao direito fundamental de preservação da intimidade.

10. O princípio da conformidade funcional a que se refere Canotilho, também, reforça a conclusão de que os órgãos criados pela Constituição da República, tal como o TCU, devem se manter no quadro normativo de suas competências, sem que tenham autonomia para abrir mão daquilo que o constituinte lhe entregou em termos de competências.(CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5ª edição. Coimbra: Almedina, 2002, p. 541.)

11. A Proteção Deficiente de vedação implícita permite assentar que se a publicidade não pode ir tão longe, de forma a esvaziar, desproporcionalmente, o direito fundamental à privacidade e ao sigilo bancário e empresarial; não menos verdadeiro é que a insuficiente limitação ao direito à privacidade revelar-se-ia, por outro ângulo, desproporcional, porquanto lesiva aos interesses da sociedade de exigir do Estado brasileiro uma atuação transparente.

12. No caso sub examine: I) O TCU determinou o fornecimento de dados pela JBS/Friboi, pessoa que celebrou contratos vultosos com o BNDES, a fim de aferir, por exemplo, os critérios utilizados para a escolha da referida sociedade empresária, quais seriam as vantagens sociais advindas das operações analisadas, se houve cumprimento das cláusulas contratuais, se as operações de troca de debêntures por posição acionária na empresa ora indicada originou prejuízo para o BNDES. II) O TCU não agiu de forma imotivada e arbitrária, e nem mesmo criou exigência irrestrita e genérica de informações sigilosas. Sobre o tema, o ato coator aponta a existência de uma operação da Polícia Federal denominada Operação Santa Tereza que apontou a existência de quadrilha intermediando empréstimos junto ao BNDES, inclusive envolvendo o financiamento obtido pelo Frigorífico Friboi. Ademais, a necessidade do controle financeiro mais detido resultou, segundo o decisum atacado, de um “protesto da Associação Brasileira da Indústria Frigorífica (Abrafigo) contra a política do BNDES que estava levanto à concentração econômica do setor”. III) A requisição feita pelo TCU na hipótese destes autos revela plena compatibilidade com as atribuições constitucionais que lhes são dispensadas e permite, de forma idônea, que a sociedade brasileira tenha conhecimento se os recursos públicos repassados pela União ao seu banco de fomento estão sendo devidamente empregados.

13. Consequentemente a recusa do fornecimento das informações restou inadmissível, porquanto imprescindíveis para o controle da sociedade quanto à destinação de vultosos recursos públicos. O que revela que o determinado pelo TCU não extrapola a medida do razoável.

14. Merece destacar que in casu: a) Os Impetrantes são bancos de fomento econômico e social, e não instituições financeiras privadas comuns, o que impõe, aos que com eles contratam, a exigência de disclosure e de transparência, valores a serem prestigiados em nossa República contemporânea, de modo a viabilizar o pleno controle de legitimidade e responsividade dos que exercem o poder. b) A utilização de recursos públicos por quem está submetido ao controle financeiro externo inibe a alegação de sigilo de dados e autoriza a divulgação das informações necessárias para o controle dos administradores, sob pena de restar inviabilizada a missão constitucional da Corte de Contas. c) À semelhança do que já ocorre com a CVM e com o BACEN, que recebem regularmente dados dos Impetrantes sobre suas operações financeiras, os Demandantes, também, não podem se negar a fornecer as informações que forem requisitadas pelo TCU.

15. A limitação ao direito fundamental à privacidade que, por se revelar proporcional, é compatível com a teoria das restrições das restrições (Schranken-Schranken). O direito ao sigilo bancário e empresarial, mercê de seu caráter fundamental, comporta uma proporcional limitação destinada a permitir o controle financeiro da Administração Pública por órgão constitucionalmente previsto e dotado de capacidade institucional para tanto.

16. É cediço na jurisprudência do E. STF que: “ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – PUBLICIDADE. A transparência decorre do princípio da publicidade. TRIBUNAL DE CONTAS – FISCALIZAÇÃO – DOCUMENTOS. Descabe negar ao Tribunal de Contas o acesso a documentos relativos à Administração Pública e ações implementadas, não prevalecendo a óptica de tratar-se de matérias relevantes cuja divulgação possa importar em danos para o Estado. Inconstitucionalidade de preceito da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Ceará que implica óbice ao acesso.” (ADI 2.361, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 23/10/2014).

17. Jusfilosoficamente as premissas metodológicas aplicáveis ao caso sub judice revelam que: I “nuclearmente feito nas pranchetas da Constituição. Foi o legislador de primeiríssimo escalão quem estruturou e funcionalizou todos eles (os Tribunais de Contas), prescindindo das achegas da lei menor. (...) Tão elevado prestígio conferido ao controle externo e a quem dele mais se ocupa, funcionalmente, é reflexo direto do princípio republicano. Pois, numa República, impõe-se responsabilidade jurídica pessoal a todo aquele que tenha por competência (e consequente dever) cuidar de tudo que é de todos”. (BRITTO, Carlos Ayres. O regime constitucional dos Tribunais de Contas. In: Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. Volume 8. 2º semestre de 2014. Rio de Janeiro: TCE-RJ, p. 18 e 20) II - “A legitimidade do Estado Democrático de Direito depende do controle da legitimidade da sua ordem financeira. Só o controle rápido, eficiente, seguro, transparente e valorativo dos gastos públicos legitima o tributo, que é o preço da liberdade. O aperfeiçoamento d controle é que pode derrotar a moral tributária cínica, que prega a sonegação e a desobediência civil a pretexto da ilegitimidade da despesa pública. (TORRES, Ricardo Lobo. Uma Avaliação das Tendências Contemporâneas do Direito Administrativo. Obra em homenagem a Eduardo García de Enterría. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 645)

18. Denegação da segurança por ausência de direito material de recusa da remessa dos documentos.

(MS 33340, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 26/05/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-151 DIVULG 31-07-2015 PUBLIC 03-08-2015)

4. Para os fins da aplicação do princípio constitucional da publicidade, e consequente inaplicabilidade do sigilo bancário, devem ser considerados recursos públicos aqueles previstos nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, inclusive nos orçamentos previstos no § 5º do art. 165 da Constituição; bem como aqueles titularizados por coletividades parciais, que sejam administrados pelo poder público.

5. Ressalve-se que, consoante entendimento do Plenário da CNU, a exceção ao sigilo bancário, decorrente do princípio da publicidade, não se estende a "operações subsequentes àquela operação inicial de transferência de recursos públicos, realizadas pelo tomador dos recursos e decorrentes da disponibilização destes em conta corrente ou por outro meio"; bem como também não se estende a "outros sigilos previstos em lei ou em norma regulatória editada pela autoridade competente, em especial o Banco Central do Brasil ou a CVM – Comissão de Valores Mobiliários, cuja incidência sobre documentos apresentados à instituição financeira ou por ela produzidos deve ser verificada caso a caso". No que se refere aos recursos titularizados por coletividades parciais e administrados pelo poder público, o preceito constitucional da publicidade também não se estende a "operações bancárias realizadas entre o banco e o titular de contas individualizadas (cotista do fundo), que continuam protegidas pelo sigilo bancário".

6. Restou consolidado, por fim, o entendimento no sentido de que, para os fins do inciso I do § 4º, do art. 2º, da Lei Complementar nº 105, de 2001, o Ministério Público, os tribunais de contas e o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União são "órgãos públicos fiscalizadores", por conseguinte, estão legitimados a celebrar convênios com o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, "objetivando a realização de fiscalização conjuntas, observadas as respectivas competências", desde que preservado o dever de manutenção do sigilo, na forma do § 5º do art. 2º, da Lei Complementar nº 105, de 2001. Neste sentido, nas hipóteses em que efetivamente incidir o sigilo bancário, este deve ser oposto ao Ministério Público, aos tribunais de contas e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, ressalvada a possibilidade da celebração do convênio de que trata o inciso I do § 4º, do art. 2º, da Lei Complementar nº 105, de 2001.

7. Nestes termos, sugere-se que o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/CGU/AGU seja submetido à elevada apreciação das superiores instâncias da Advocacia-Geral da União, bem como que seja avaliada a possibilidade de aplicação ao caso do § 3º do art. 1º, do Decreto nº 2.346, de 1997, submetendo-se o Parecer à aprovação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República.

Brasília, 22 de janeiro de 2018.

VICTOR XIMENES NOGUEIRA
ADVOGADO DA UNIÃO
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS

PARECER PLENÁRIO nº. 5/2017/CNU/CGU/AGU

NUP: 00190.027761/2014-22, 00400.004961/2009-07, 00400.005436/2009-29, 00400.007419/2012-21, 00400.019536/2009-32, 46070.000047/2015-35, 52000.002434/2007-22, 00400.004961/2009-27 e 52020.000549/2014-73
INTERESSADOS: MINISTÉRIO DO TRABALHO e outros.
ASSUNTOS: Extensão do sigilo bancário em face do princípio da publicidade – Oponibilidade do sigilo aos órgãos de controle

EMENTA: Direito Administrativo. Acesso às informações protegidas por sigilo bancário pelos órgãos de controle. Princípio da publicidade. Extensão ou compartilhamento de sigilo. Prevalência do princípio constitucional da publicidade, nos termos deste parecer. Oponibilidade do sigilo, quando existente, a órgãos de controle.

1. Além das hipóteses previstas no art. 1º, §§ 3º e 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001, não incide a proteção ao sigilo bancário, em decorrência da incidência do princípio constitucional da publicidade, ao menos nas seguintes situações: a) operação bancária em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; ou b) operação bancária que envolva recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira.

2. Para este fim, devem ser considerados recursos públicos aqueles previstos nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, incluídos os orçamentos previstos no § 5º do art. 165 da Constituição.

3. Por coerência, também devem ser considerados públicos os recursos titularizados não pela coletividade como um todo, mas por coletividades parciais (como os trabalhadores regidos pela CLT ou servidores públicos) que sejam administrados pelo poder público, tal como o FGTS e o Fundo PIS-PASEP, mas apenas em relação à sua aplicação pelas instituições financeiras, excluídas as operações bancárias realizadas entre o banco e o titular de contas individualizadas (cotista do fundo), que continuam protegidas pelo sigilo bancário.

4. A exceção ao sigilo bancário decorrente do princípio da publicidade atinge apenas a operação inicial de transferência dos recursos públicos, e não as operações subsequentes realizadas pelo tomador dos recursos e decorrentes da disponibilização destes em conta corrente ou por outro meio.

5. A exceção ao sigilo bancário, decorrente da incidência do princípio constitucional da publicidade, não implica a supressão de outros sigilos previstos em lei ou em norma regulatória editada pela autoridade competente, em especial o Banco Central do Brasil ou a CVM – Comissão de Valores Mobiliários, cuja incidência sobre documentos apresentados à instituição financeira ou por ela produzidos deve ser verificada caso a caso.

6. Salvo na hipótese de celebração do convênio a que se refere o art. 2º, § 4º, I, da Lei Complementar nº 105, de 2001, o sigilo bancário, quando incidente, deve ser oposto inclusive ao Ministério Público, aos tribunais de contas e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, sendo inaplicáveis o art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001, e o art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75, de 1993.

I - RELATÓRIO

1. Trata-se de demanda encaminhada à Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos da Consultoria-Geral da União-CNU/CGU, cujo objeto é, em síntese, a extensão do sigilo bancário previsto no art. 1º, caput, da Lei Complementar nº 105/2001[1] a operações realizadas com recursos públicos e sua oponibilidade a órgãos de controle interno e externo, mais especificamente ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas da União e à antiga Controladoria-Geral da União, hoje Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (denominação utilizada pelos arts. 21, XXII, e 66 a 68 da Lei nº 13.502, de 1º de novembro de 2017).

2. Os dois expedientes principais e seus sete anexos – todos elencados na epígrafe – foram distribuídos a este signatário nos termos da Cota nº 008/2016/3ª Turma–CNU-Decor-CGU/AGU, da lavra do Coordenador designado para a 3ª Turma da CNU/CGU, o Advogado da União Joaquim Modesto Pinto Junior, simultaneamente a outro conjunto de processos referentes a tema conexo – sigilo fiscal –, distribuídos à relatoria ad hoc do Advogado da União Marco Aurélio Caixeta.

3. As questões jurídicas debatidas foram assim sintetizadas pelo Advogado da União Marco Aurélio Caixeta na Cota nº 00003/2016/CPPAT/CGU/AGU:

1.1. Resumo das questões jurídicas (00400.004961/2009-07, 52000.002434/2007-22, 00400.019536/2009-32, 00400.007419/2012-21, 00400.005436/2009-29, 52020.000549/2014-73 e 46070.000047/2015-35):

51. Sem prejuízo da necessária consulta aos autos, aponta-se resumidamente os principais objetos dos autos em questão: sigilo bancário; aplicabilidade em relação aos depósitos especiais realizados no BNDES; cabimento da transferência de informações referentes às operações realizadas com recursos dos depósitos especiais realizadas pelo BNDES ao atual Ministério do Trabalho e Previdência Social, com fundamento na Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, que atribui competência ao CODEFAT para fiscalizar a administração do FAT; acesso dos órgãos de controle interno a dados protegidos por sigilo bancário no âmbito do BNDES; princípios da publicidade, moralidade e economicidade; atribuições constitucionais e legais dos órgãos de controle interno e externo em relação à fiscalização da correta aplicação dos recursos públicos; NOTA DECOR CGU/AGU nº 132/2007; NOTAS DECOR NºS 10 e 11/2012/MCA/CGU/AGU; PARECER Nº 13/2014/DECOR/CGU/AGU; ADin nº 2.390 e MS nº 33.340, julgados pelo STF.

(...)

2.1. Resumo das questões jurídicas (00190.027761/2014-22):

55. Em breve resumo, os principais objetos dos autos, sem prejuízo da existência de outros pontos a serem objeto de análise: sigilo bancário; Fundo PIS/PASEP; dúvida sobre existência de atos bancários; compartilhamento de informações sigilosas com os órgãos de controle; normas que regulam a atuação do controle interno dos atos da Administração Pública em contraponto à garantia do sigilo bancário; ADin nº 2.390 e MS nº 33.340, julgados pelo STF. 

4. Devido ao grande número de pareceres e notas produzidos acerca da controvérsia, mostra-se contraproducente sua menção individualizada e o relato de trâmites que culminaram em sua elaboração. De toda sorte, este relato pormenorizado já se encontra na Cota nº 00003/2016/CPPAT/CGU/AGU, não havendo necessidade de reproduzi-lo ou refazê-lo, sem prejuízo da menção de alguns pareceres e notas quando da fundamentação deste parecer.

5. Destarte, com base no art. 12, § 1º da PORTARIA CGU/AGU nº 16, de 28 de abril de 2016, apresentei relatório, com a indicação dos quesitos e questões que foram objeto de debate inicial pela 3ª Turma, nos termos da alínea “a” do item “1) Proposição de nova metodologia de trabalho na CNU”, do ajuste convencionado na Ata da 11ª Sessão da CNU/CGU, de 29.3.2017.

6. No relatório apresentado, conforme descrito acima, o tema controvertido foi desdobrado nos seguintes quesitos:

a) há outras exceções ao dever de observância do sigilo bancário, além das expressamente estabelecidas no art. 1º, §§ 3º e 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001?

b) o princípio constitucional da publicidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição, é fundamento suficiente para o reconhecimento, por interpretação, de exceção ao dever de observância do sigilo bancário, mesmo sem previsão na Lei Complementar nº 105, de 2001, em relação a operação ou serviço bancários que envolvam recursos ou subsídios parcial ou integralmente públicos, ainda que a contraparte da instituição financeira seja particular tomador de financiamento? Caso positivo, em que medida?

c) o sigilo bancário referente às operações realizadas por instituição financeira com recursos de um fundo financeiro pode ser oposto ao órgão público gestor do próprio fundo?

d) aplica-se a proteção ao sigilo bancário prevista na Lei Complementar nº 105, de 2001, à atividade da instituição financeira que atua como agente operador de fundo, tal como a Caixa Econômica Federal faz em relação ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)?

e) caso não se configure exceção ao dever de observância do sigilo bancário, este pode ser compartilhado por meio do acesso dos dados pelo Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, com base no art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001, mediante compromisso de manutenção do sigilo?

f) caso não se configure exceção ao dever de observância do sigilo bancário, este pode ser compartilhado por meio do acesso dos dados pelo Ministério Público, com base no art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75, de 1993, mediante compromisso de manutenção do sigilo?

g) o Ministério Público e o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União podem ser considerados órgãos fiscalizadores de instituições financeiras para os fins previstos no art. 2º, § 4º, I, da Lei Complementar nº 105, de 2001?

7. A partir dos quesitos acima, é perceptível que as questões controvertidas podem ser divididas em três grupos: 1) a incidência do sigilo bancário sobre operações realizadas com recursos públicos ou geridos por órgãos ou entidades públicas (quesitos a e b); 2) enquadramento, na situação descrita no item anterior, de recursos financeiros integrantes de fundos de titularidade privada, mas geridos pelo Poder Público, como o FGTS e o PIS-PASEP (quesitos c e d); 3) a oponibilidade do sigilo, caso existente, a órgãos de controle, especialmente ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas da União e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (quesitos e, f e g). Só faz sentido debater a oponibilidade do sigilo se ele incidir em determinada situação; se os dados forem considerados públicos, podem ser acessados por qualquer pessoa, inclusive pelos órgãos de controle. Por outro lado, ainda que os dados sejam considerados sigilosos, é possível discutir se este sigilo deve ser oposto aos órgãos de controle ou se, ao contrário, estes devem ter acesso às informações sigilosas, obrigando-se tão somente a observar o sigilo.

8. Na 21ª Sessão Ordinária da CNU, o tema foi debatido pelo Plenário, que deliberou pela incorporação das premissas adotadas pela recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consubstanciada no julgamento do Mandado de Segurança nº 33.340/DF, da Primeira Turma, relator o Ministro Luiz Fux, DJe 03-08-2015.

9. O presente parecer foi elaborado em cumprimento da deliberação colegiada acima referida, observando seus termos e fundamentos. Portanto, pretende traduzir o entendimento do colegiado sobre o tema. Com efeito, a elaboração do parecer implica o aprofundamento de certas questões que, quando da discussão do relatório, foram abordadas de modo perfunctório, o que demanda atenção especial; no presente caso, há dois pontos que merecem esta visão mais pormenorizada: (i) a assertiva de que a exceção ao sigilo bancário por força do princípio da publicidade atinge apenas a operação inicial de transferência dos recursos públicos, e não as operações subsequentes decorrentes da disponibilização dos recursos ao seu beneficiário, que surgiu nos debates em Plenário mas não chegou a ser aprofundada, até mesmo por não constar dos quesitos do relatório então em debate; (ii) a ressalva de que há dados sigilosos do beneficiário de operação bancária sem sigilo bancário que permanecem protegidos por sigilo de outra espécie, como o segredo industrial (art. 22 da Lei nº 12.527, de 2001) e informações privilegiadas sobre sociedades anônimas, ainda não divulgadas para conhecimento do mercado e aptas a influir na cotação de valores mobiliários (art. 155, §§ 1º e 4º, da Lei nº 6.404, de 1976).

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – Fonte das exceções ou hipóteses de quebra de sigilo bancário – Princípio constitucional da publicidade – Extensão de sua incidência

10. A Lei Complementar nº 105, de 2001, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, estabelece exceções ao dever de observância deste sigilo e hipóteses em que ele pode ser quebrado em seu art. 1º, §§ 3º e 4º, que dispõem:

§ 3º Não constitui violação do dever de sigilo:

I – a troca de informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusive por intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

II - o fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

III – o fornecimento das informações de que trata o § 2º do art. 11 da Lei nº 9.311, de 24 de outubro de 1996;

IV – a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa;

V – a revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;

VI – a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 9º desta Lei Complementar.

§ 4º A quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial, e especialmente nos seguintes crimes:

I – de terrorismo;

II – de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;

III – de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado a sua produção;

IV – de extorsão mediante seqüestro;

V – contra o sistema financeiro nacional;

VI – contra a Administração Pública;

VII – contra a ordem tributária e a previdência social;

VIII – lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores;

IX – praticado por organização criminosa.

11. Outra lei complementar, por ter a mesma hierarquia que a Lei Complementar nº 105, de 2001, também pode dispor sobre o assunto, desde que não tenha sido tacitamente revogada; leis complementares de âmbito mais geral não servem a este propósito, pois a lei complementar específica pode ser considerada especial em relação a elas e assim prevalente em caso de conflito.

12. Sendo estas outras leis complementares dotadas do mesmo status da Lei Complementar nº 105, de 2001, sua aplicação não pode ser considerada violação ao art. 192 da Constituição, que estabelece reserva de lei complementar para regulação do sistema financeiro nacional.

13. Segundo a doutrina especializada, a interpretação sistemática da Lei Complementar nº 105, de 2001, também pode revelar outras hipóteses em que o ordenamento jurídico não protege o sigilo bancário, como ensina Eduardo Salomão Neto: (Direito bancário. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2014):

Igualmente justificável é a concessão de informações sobre a operação efetuada a terceiro que seja dela garantidor, seja para cobrá-lo em caso de inadimplemento do devedor principal, seja para mantê-lo informado do desempenho do devedor principal e preparado para honrar suas obrigações. (p. 655)

É também exceção natural ao sigilo bancário a possibilidade de revelação da informação ao próprio controlador da instituição financeira, ou a terceiros autorizados por este, de forma a permitir auditoria patrimonial e operacional prévia a cessão de controle ou participação relevante. Trata-se de hipótese não coberta pela lei do sigilo bancário, mas que deriva de sua interpretação sistemática e teleológica. A posição de controlador de instituição financeira implica sérios riscos patrimoniais, decorrentes da responsabilidade solidária por prejuízos em caso de decretação de regimes especiais, responsabilidade criminal pelos fluidos tipos delitivos da gestão temerária e fraudulenta de instituições financeiras, e outros semelhantes. Difícil ou impossível encontrar adquirente empresarialmente sólido que, sem conhecer ativos e passivos da instituição, se dispusesse a adquiri-la. (p. 656)

14. Se leis complementares podem, por força de norma expressa ou implícita (decorrente de interpretação sistemática), excepcionar ou autorizar a quebra do sigilo bancário, com maior razão pode fazê-lo a própria Constituição, inclusive por meio da incidência de princípios, sobretudo o princípio da publicidade, que rege a Administração Pública (art. 37, caput).

15. A própria Caixa Econômica Federal reconhece que o princípio constitucional da publicidade constitui fundamento para excepcionar a incidência do sigilo bancário se “a operação financeira ou a prestação de serviço for contratada pela CAIXA com ente ou entidade pública” (Oficio nº 0018/2012/DIJUR, item 3.3, processo nº 00400.007419/2012-21), situação diversa da discutida nos processos em análise.

16. Também o BNDES, na NOTA AJ/COJIN - 038/03 (Processo nº 52000.002434/2007-22) conclui pela inexistência de sigilo bancário em contratos celebrados com entidade integrante da Administração Pública Direta: “Independentemente da premissa adotada, no caso em tela, devemos nos ater a uma peculiaridade, qual seja, a de que o contrato em exame fora celebrado entre entidade da administração pública federal indireta, o BNDES, e a pessoa política de direito público, Município de Jundiaí. Com efeito, mesmo que partamos do pressuposto de que o sigilo bancário possui fundamento constitucional, sequer há de se falar, in casu, em ponderação de valores constitucionalmente protegidos, haja vista que, em se tratando de entidades da administração pública em ambos os polos da relação jurídica contratual, há de incidir o princípio da publicidade, estatuído no art. 37, caput da Constituição Federal, não havendo que se falar, na hipótese vertente, em sigilo bancário.”

17. No mesmo sentido é a NOTA AJ/COJIN - 48/2006 – Processo nº 52000.002434/2007-22).

18. Nem a CEF nem o BNDES chegam ao ponto de admitir que a exceção derivada do princípio da publicidade alcance qualquer operação bancária realizada com recursos públicos, se a outra parte não for pessoa jurídica de direito público. Contudo, o Supremo Tribunal Federal já deu este passo no já citado MS 33.340/DF, julgado em 26 de maio de 2015 pela Primeira Turma, relator o Ministro Luiz Fux, que foi assim ementado:

DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTROLE LEGISLATIVO FINANCEIRO. CONTROLE EXTERNO. REQUISIÇÃO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO DE INFORMAÇÕES ALUSIVAS A OPERAÇÕES FINANCEIRAS REALIZADAS PELAS IMPETRANTES. RECUSA INJUSTIFICADA. DADOS NÃO ACOBERTADOS PELO SIGILO BANCÁRIO E EMPRESARIAL. (...)

3. O sigilo de informações necessárias para a preservação da intimidade é relativizado quando se está diante do interesse da sociedade de se conhecer o destino dos recursos públicos.

4. Operações financeiras que envolvam recursos públicos não estão abrangidas pelo sigilo bancário a que alude a Lei Complementar nº 105/2001, visto que as operações dessa espécie estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal. Em tais situações, é prerrogativa constitucional do Tribunal [TCU] o acesso a informações relacionadas a operações financiadas com recursos públicos.

5. O segredo como “alma do negócio” consubstancia a máxima cotidiana inaplicável em casos análogos ao sub judice, tanto mais que, quem contrata com o poder público não pode ter segredos, especialmente se a revelação for necessária para o controle da legitimidade do emprego dos recursos públicos. É que a contratação pública não pode ser feita em esconderijos envernizados por um arcabouço jurídico capaz de impedir o controle social quanto ao emprego das verbas públicas.

6. “O dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos impõe não haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no povo (art. 1º, parágrafo único, da Constituição), ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida.” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª edição. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 114).

7. O Tribunal de Contas da União não está autorizado a, manu militari, decretar a quebra de sigilo bancário e empresarial de terceiros, medida cautelar condicionada à prévia anuência do Poder Judiciário, ou, em situações pontuais, do Poder Legislativo. Precedente: MS 22.801, Tribunal Pleno, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 14.3.2008.

8. In casu, contudo, o TCU deve ter livre acesso às operações financeiras realizadas pelas impetrantes, entidades de direito privado da Administração Indireta submetidas ao seu controle financeiro, mormente porquanto operacionalizadas mediante o emprego de recursos de origem pública. Inoponibilidade de sigilo bancário e empresarial ao TCU quando se está diante de operações fundadas em recursos de origem pública. Conclusão decorrente do dever de atuação transparente dos administradores públicos em um Estado Democrático de Direito.

9. A preservação, in casu, do sigilo das operações realizadas pelo BNDES e BNDESPAR com terceiros não, apenas, impediria a atuação constitucionalmente prevista para o TCU, como, também, representaria uma acanhada, insuficiente, e, por isso mesmo, desproporcional limitação ao direito fundamental de preservação da intimidade.

10. O princípio da conformidade funcional a que se refere Canotilho, também, reforça a conclusão de que os órgãos criados pela Constituição da República, tal como o TCU, devem se manter no quadro normativo de suas competências, sem que tenham autonomia para abrir mão daquilo que o constituinte lhe entregou em termos de competências.(CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5ª edição. Coimbra: Almedina, 2002, p. 541.)

11. A Proteção Deficiente de vedação implícita permite assentar que se a publicidade não pode ir tão longe, de forma a esvaziar, desproporcionalmente, o direito fundamental à privacidade e ao sigilo bancário e empresarial; não menos verdadeiro é que a insuficiente limitação ao direito à privacidade revelar-se-ia, por outro ângulo, desproporcional, porquanto lesiva aos interesses da sociedade de exigir do Estado brasileiro uma atuação transparente.

12. No caso sub examine: I) O TCU determinou o fornecimento de dados pela JBS/Friboi, pessoa que celebrou contratos vultosos com o BNDES, a fim de aferir, por exemplo, os critérios utilizados para a escolha da referida sociedade empresária, quais seriam as vantagens sociais advindas das operações analisadas, se houve cumprimento das cláusulas contratuais, se as operações de troca de debêntures por posição acionária na empresa ora indicada originou prejuízo para o BNDES. II) O TCU não agiu de forma imotivada e arbitrária, e nem mesmo criou exigência irrestrita e genérica de informações sigilosas. Sobre o tema, o ato coator aponta a existência de uma operação da Polícia Federal denominada Operação Santa Tereza que apontou a existência de quadrilha intermediando empréstimos junto ao BNDES, inclusive envolvendo o financiamento obtido pelo Frigorífico Friboi. Ademais, a necessidade do controle financeiro mais detido resultou, segundo o decisum atacado, de um “protesto da Associação Brasileira da Indústria Frigorífica (Abrafigo) contra a política do BNDES que estava levanto à concentração econômica do setor”. III) A requisição feita pelo TCU na hipótese destes autos revela plena compatibilidade com as atribuições constitucionais que lhes são dispensadas e permite, de forma idônea, que a sociedade brasileira tenha conhecimento se os recursos públicos repassados pela União ao seu banco de fomento estão sendo devidamente empregados.

13. Consequentemente a recusa do fornecimento das informações restou inadmissível, porquanto imprescindíveis para o controle da sociedade quanto à destinação de vultosos recursos públicos. O que revela que o determinado pelo TCU não extrapola a medida do razoável.

14. Merece destacar que in casu: a) Os Impetrantes são bancos de fomento econômico e social, e não instituições financeiras privadas comuns, o que impõe, aos que com eles contratam, a exigência de disclosure e de transparência, valores a serem prestigiados em nossa República contemporânea, de modo a viabilizar o pleno controle de legitimidade e responsividade dos que exercem o poder. b) A utilização de recursos públicos por quem está submetido ao controle financeiro externo inibe a alegação de sigilo de dados e autoriza a divulgação das informações necessárias para o controle dos administradores, sob pena de restar inviabilizada a missão constitucional da Corte de Contas. c) À semelhança do que já ocorre com a CVM e com o BACEN, que recebem regularmente dados dos Impetrantes sobre suas operações financeiras, os Demandantes, também, não podem se negar a fornecer as informações que forem requisitadas pelo TCU.

15. A limitação ao direito fundamental à privacidade que, por se revelar proporcional, é compatível com a teoria das restrições das restrições (Schranken-Schranken). O direito ao sigilo bancário e empresarial, mercê de seu caráter fundamental, comporta uma proporcional limitação destinada a permitir o controle financeiro da Administração Publica por órgão constitucionalmente previsto e dotado de capacidade institucional para tanto.

16. É cediço na jurisprudência do E. STF que: “ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – PUBLICIDADE. A transparência decorre do princípio da publicidade. TRIBUNAL DE CONTAS – FISCALIZAÇÃO – DOCUMENTOS. Descabe negar ao Tribunal de Contas o acesso a documentos relativos à Administração Pública e ações implementadas, não prevalecendo a óptica de tratar-se de matérias relevantes cuja divulgação possa importar em danos para o Estado. Inconstitucionalidade de preceito da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Ceará que implica óbice ao acesso.” (ADI 2.361, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 23/10/2014).

17. Jusfilosoficamente as premissas metodológicas aplicáveis ao caso sub judice revelam que: I - “nuclearmente feito nas pranchetas da Constituição. Foi o legislador de primeiríssimo escalão quem estruturou e funcionalizou todos eles (os Tribunais de Contas), prescindindo das achegas da lei menor. (...) Tão elevado prestígio conferido ao controle externo e a quem dele mais se ocupa, funcionalmente, é reflexo direto do princípio republicano. Pois, numa República, impõe-se responsabilidade jurídica pessoal a todo aquele que tenha por competência (e consequente dever) cuidar de tudo que é de todos”. (BRITTO, Carlos Ayres. O regime constitucional dos Tribunais de Contas. In: Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. Volume 8. 2º semestre de 2014. Rio de Janeiro: TCE-RJ, p. 18 e 20) II - “A legitimidade do Estado Democrático de Direito depende do controle da legitimidade da sua ordem financeira. Só o controle rápido, eficiente, seguro, transparente e valorativo dos gastos públicos legitima o tributo, que é o preço da liberdade. O aperfeiçoamento d controle é que pode derrotar a moral tributária cínica, que prega a sonegação e a desobediência civil a pretexto da ilegitimidade da despesa pública. (TORRES, Ricardo Lobo. Uma Avaliação das Tendências Contemporâneas do Direito Administrativo. Obra em homenagem a Eduardo García de Enterría. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 645)

18. Denegação da segurança por ausência de direito material de recusa da remessa dos documentos.

19. Em seu relatório, o Ministro Luiz Fux registrou que o BNDES sustentou “que os recursos aplicados na linha de crédito envolvendo o Grupo JBS/Friboi não seriam públicos, pois teriam como origem o retorno de operações do Banco e a captação de recursos no mercado internacional”. O relator rejeitou este argumento por considerar que constituem recursos do BNDES dotações que lhe forem consignadas no orçamento da União (art. 7º, V, do Decreto nº 4.418, de 2002[2], que aprovou o estatuto do banco), além de registrar que a União vinha subvencionando diversos financiamentos do banco, na forma do art. 1º, § 1º, da Lei nº 12.096, de 2009[3] e da Lei nº 13.126, de 2015[4].

20. Portanto, o Supremo Tribunal Federal adotou interpretação ampla do que deve ser considerado “recurso público” para fins de incidência do princípio da publicidade como exceção ao sigilo bancário, considerando suficiente que a operação envolva parcela de recursos públicos, ainda que em conjunto com recursos de outras fontes, como captações no exterior.

21. Deste modo, é possível extrair que o princípio constitucional da publicidade constitui fundamento para excepcionar o sigilo bancário ao menos nas seguintes situações: a) operação bancária em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; ou b) operação bancária que envolva recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira, que pode ser até mesmo uma pessoa física.

22. Convém esclarecer, todavia, que a exceção ao sigilo bancário decorrente do princípio da publicidade atinge apenas a operação inicial de transferência dos recursos públicos, e não as operações subsequentes realizadas pelo tomador dos recursos e decorrentes da disponibilização destes em conta corrente ou por outro meio, uma vez que estas são operações financeiras privadas. Não se olvida que pode surgir a necessidade, inclusive para apuração de ilícitos penais, de verificar estas operações subsequentes; nesta situação, porém, será indispensável que o legitimado obtenha ordem judicial específica (art. 1º, § 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001).

23. Para este fim de aplicação do princípio da publicidade como exceção ao sigilo bancário, nos termos acima expostos, devem ser considerados recursos públicos aqueles previstos nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, incluídos os orçamentos previstos no § 5º do art. 165 da Constituição[5].

24. Por coerência, também devem ser considerados públicos os recursos titularizados não pela coletividade como um todo, mas por coletividades parciais, como os trabalhadores regidos pela CLT ou servidores públicos, que sejam administrados pelo poder público, tal como o FGTS e o Fundo PIS-PASEP, mas apenas em relação à sua aplicação pelas instituições financeiras, excluídas as operações bancárias realizadas entre o banco e o titular de contas individualizadas (cotista do fundo), que continuam protegidas pelo sigilo bancário. O caráter público da destinação dos recursos de um fundo não exclui o sigilo bancário das contas dos particulares titulares dos recursos. É da essência da atividade bancária emprestar o dinheiro de terceiros, mas nem por isso o empréstimo descaracteriza a existência da conta corrente que propiciou o acesso do banco aos recursos nem a disponibilidade destes, já que, escrituralmente, o dinheiro permanece na conta e pode ser transferido ou sacado pelo correntista a qualquer momento (ou, no caso do FGTS e do PIS-PASEP, a qualquer momento no qual se configure uma das hipóteses em que a lei admite o saque). Trata-se da chamada multiplicação do meio circulante.

25. Firmada esta interpretação do princípio da publicidade, ficam prejudicadas as questões sobre a oponibilidade do sigilo bancário de operações realizadas por instituição financeira com recursos de fundo financeiro ao órgão público gestor do próprio fundo e sobre a aplicabilidade do sigilo bancário à atividade de instituição financeira como agente operador de fundo. Se não há sigilo bancário de operações com recursos de fundo público, ele não pode ser oponível a ninguém e muito menos ao órgão gestor do fundo. Quanto aos fundos constituídos por recursos privados geridos pelo Poder Público, entendo já ter esclarecido a questão no item anterior desta fundamentação, que demonstra que a aplicação dos recursos do fundo não é protegida por sigilo, mas as contas individualizadas são, o que independe da condição de agente operador da Caixa Econômica Federal ou de outra instituição financeira ou da discussão do enquadramento desta atividade como típica de instituição financeira.

26. Por fim, antes de passar ao próximo item desta fundamentação, convém deixar explícita uma ressalva adicional: a exceção ao sigilo bancário, decorrente da incidência do princípio constitucional da publicidade, nos termos acima expostos, não implica a supressão de outros sigilos previstos em lei ou em norma regulatória editada pela autoridade competente, em especial o Banco Central do Brasil ou a CVM – Comissão de Valores Mobiliários, cuja incidência deve ser verificada caso a caso. A despeito da necessidade desta verificação casuística, é viável cogitar desde logo de algumas situações em que o dossiê de crédito, que reúne documentos exigidos pela instituição financeira para análise da situação do beneficiário da operação bancária em análise, pode ser considerado total ou parcialmente sigiloso independentemente da incidência do sigilo bancário: a) se contiver informações protegidas por segredo industrial (art. 22 da Lei nº 12.527, de 2001[6]); b) se contiver informações sobre proposta de acordo de leniência a ser celebrado com a autoridade de defesa da concorrência (art. 86, § 9º, da Lei 12.529, de 2011[7]); c) se contiver informações privilegiadas sobre sociedades anônimas, ainda não divulgadas para conhecimento do mercado e aptas a influir na cotação de valores mobiliários (art. 155, §§ 1º e 4º, da Lei nº 6.404, de 1976[8]). Este mesmo sigilo pode atingir outros documentos além do mencionado dossiê de crédito.

27. Como registrado no PARECER n. 00750/2017/CONJUR-MTPA/CGU/AGU (NUP: 50650.003844/2017-82), de lavra da Advogada da União Priscila Cunha Nascimento, a própria Lei de Acesso a Informação (Lei nº 12.527, de 2011) admite a necessidade de observar estes sigilos protegidos por lei no fornecimento de informações contidas em processos administrativos. De acordo com o art. 22 do referido diploma legal, as disposições da LAI não excluem hipóteses de sigilo ou de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público:

Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.

28. No mesmo sentido, assim estabelece o § 2º do art. 5º do Decreto nº 7.724, de 2012:

Art. 5º (...)

§ 2º Não se sujeitam ao disposto neste Decreto as informações relativas à atividade empresarial de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado obtidas pelo Banco Central do Brasil, pelas agências reguladoras ou por outros órgãos ou entidades no exercício de atividade de controle, regulação e supervisão da atividade econômica cuja divulgação possa representar vantagem competitiva a outros agentes econômicos.

29. Portanto, as informações constantes dos processos administrativos que revelarem a estratégia de negócio de empresas que possam gerar alguma vantagem competitiva a outros agentes econômicos devem ser consideradas como sigilosas.

II.2 – Impossibilidade de instituição de hipótese de exceção ou quebra do sigilo bancário por lei ordinária ou regulamento

30. Por outro lado, lei ordinária não pode dispor sobre sigilo bancário, sob pena de lesão ao art. 192 da Constituição[9]. Com maior razão, mero regulamento também não pode dispor sobre o tema, a não ser para uniformizar a interpretação da Administração Pública Federal em relação ao assunto. Neste sentido, continua atual o seguinte trecho do Parecer nº GQ 110 (aprovado pelo Presidente da República, antes da Lei Complementar nº 105, de 2001 – DOU 18-09-1996):

39. Consoante antes assinalado, ambas as leis em jogo, tanto a Lei n. 4.595, de 31.12.64, como a Lei n. 5.172, de 25.10.1966, foram recepcionadas pela nova Constituição federal como se leis complementares fossem, i. é, como as matérias de que tratam só podem ser versadas por leis complementares, a doutrina afirma que elas adquiriram status de leis complementares. Sobre essa modificação de categoria, digamos assim, já não existe mais controvérsia, nem doutrinária nem jurisprudencial. Significa isso que, para derrogar os dispositivos das Leis que estruturaram o sistema bancário e editaram o Código Tributário preciso seria que a Lei n. 8.443, de 16.7.1992, também estivesse no nível das leis complementares. A qualidade de lei ordinária, de que goza, não lhe outorga, portanto, qualquer poder de derrogar as normas que amparam o sigilo bancário e o fiscal.

31. Em relação a este específico ponto, também merecem prestígio a Nota Conjunta BNDES AJ/COJIN e as Notas AJ/DNORM nº 027/2009 e 044/2009 (Processo nº 00400.004961/2009-27), segundo as quais a Lei nº 7.998, de 1990, que versa sobre o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), não pode dispor sobre sigilo bancário por ser mera lei ordinária. De todo modo, esta questão perde relevância pelo fato do FAT ser fundo público sujeito à incidência do princípio constitucional da publicidade, o que por si só implica exceção à proteção ao sigilo bancário.

32. Este raciocínio se estende inclusive aos arts. 85[10], 86[11] e 88[12] da nova Lei nº 13.303, de 2016 (Estatuto das Empresas Estatais), que não chegou a ser abordada nas manifestações em debate. A despeito da lei se referir a “acesso irrestrito” a documentos por órgãos de controle, sua aplicabilidade não se estende ao sigilo bancário, regulado por lei complementar especial, a Lei Complementar nº 105, de 2001.

33. Esta questão será relevante também para o próximo item desta fundamentação, especificamente em relação à incidência do art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001.

II.3 – Oponibilidade do sigilo, caso existente, a órgãos de controle, especialmente ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas da União e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União

34. A interpretação desenvolvida nos itens anteriores desta fundamentação reduz de modo expressivo o impacto da definição sobre a possibilidade de compartilhamento de dados bancários sigilosos, sem decisão judicial, com órgãos de controle, justamente pelo fato de que as controvérsias verificadas nos processos administrativos em epígrafe dizem respeito, em grande parte, a dados que, à luz do item II.1 deste parecer, não serão considerados sigilosos e portanto estarão disponíveis para análise e avaliação não apenas pelos órgãos de controle, mas também pelo cidadão.

35. Ainda assim, isto não basta para tornar prejudicada a necessidade de análise da oponibilidade do sigilo bancário – quando existir – a estes órgãos, já que os autos registram, por exemplo, a pretensão do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União de ter acesso a dados das contas correntes individualizadas do PIS/PASEP, que continuam protegidos por sigilo, segundo a argumentação desenvolvida no item II.1 deste parecer. Impõe-se, portanto, a abordagem do tema.

36. O art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001, citado como fundamento para o dever de compartilhamento de sigilo, estabelece o seguinte:

Art. 26. Nenhum processo, documento ou informação poderá ser sonegado aos servidores dos Sistemas de Contabilidade Federal e de Controle Interno do Poder Executivo Federal, no exercício das atribuições inerentes às atividades de registros contábeis, de auditoria, fiscalização e avaliação de gestão.

§ 1º O agente público que, por ação ou omissão, causar embaraço, constrangimento ou obstáculo à atuação dos Sistemas de Contabilidade Federal e de Controle Interno, no desempenho de suas funções institucionais, ficará sujeito à pena de responsabilidade administrativa, civil e penal.

§ 2º Quando a documentação ou informação prevista neste artigo envolver assuntos de caráter sigiloso, deverá ser dispensado tratamento especial de acordo com o estabelecido em regulamento próprio.

§ 3º O servidor deverá guardar sigilo sobre dados e informações pertinentes aos assuntos a que tiver acesso em decorrência do exercício de suas funções, utilizando-os, exclusivamente, para a elaboração de pareceres e relatórios destinados à autoridade competente, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e penal.

§ 4º Os integrantes da carreira de Finanças e Controle observarão código de ética profissional específico aprovado pelo Presidente da República.

37. Como se vê, o dispositivo proíbe a sonegação de informações e documentos; sonegar significa ocultar ardilosamente a existência de algo, o que é diverso de negar acesso de modo fundamentado em lei a documento ou informação objeto de sigilo bancário. Portanto, este dispositivo simplesmente não se aplica ao caso.

38. Além disso, este dispositivo consta de lei ordinária, de modo que sua utilização como fundamento para compartilhamento do sigilo bancário viola a reserva de lei complementar para dispor sobre sistema financeiro (art. 192 da Constituição), como já exposto no item II.2 desta fundamentação. O fato de se tratar de mero compartilhamento do sigilo, e não quebra, não dispensa a previsão em lei complementar, uma vez que a Lei Complementar nº 105, de 2001, regula os dois temas (sobre o compartilhamento, cf. sobretudo o art. 1º, § 3º, IV e VI[13]) e considera que o dever de sigilo é da instituição financeira (art. 1º, caput[14]), e não do “Estado brasileiro” como um todo.

39. Nota-se, ainda, que a Lei Complementar nº 105, de 2001, é lei especial em relação à Lei nº 10.180, de 2001, uma vez que esta última é de aplicação geral (o destinatário da norma não é o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, mas sim toda e qualquer pessoa que tenha desenvolvido atividade pública), enquanto a primeira é restrita apenas a dados protegidos por sigilo bancário. Em caso de conflito, a lei especial derroga, na hipótese por ela regulada, a lei geral.

40. A necessidade de observância do sigilo bancário está longe de inviabilizar a atividade de controle; as instituições financeiras podem ser obrigadas a fornecer informações consolidadas, que abranjam grupos de operações e certos períodos de tempo, permitindo a fiscalização sem violação do sigilo. Se, a partir destas informações, o órgão de controle identificar indícios concretos de ilegalidade que só possam ser confirmados mediante informações ou dados de operações específicas, pode obtê-los por ordem judicial (art. 1º, § 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001). Estes dados concretos não estão imunes a controle, sendo equivocado tratar as controladorias e o controle como sinônimos; o Banco Central pode exercer este controle e o faz, não havendo qualquer imunidade gerada pela oponibilidade do sigilo bancário ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União. O Congresso Nacional também pode determinar a quebra ou o compartilhamento do sigilo, não só por meio de comissão parlamentar de inquérito, mas também no exercício da autoridade máxima do controle parlamentar externo (art. 4º da Lei Complementar nº 105, de 2001), que o controle interno tem a função de apoiar (art. 74, IV, da Constituição), reserva que se justifica em razão da gravidade do compartilhamento do sigilo. Por fim, continua possível a repressão criminal a estes ilícitos, por atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário.

41. Também não é o caso de fazer ponderação entre diversos princípios constitucionais supostamente em conflito (intimidade vs. direito do trabalhador no caso do FGTS e PIS-PASEP; intimidade vs. previsão constitucional de controle), porque esta ponderação já foi feita de antemão pelo próprio legislador na Lei Complementar nº 105, de 2001, que preferiu não contemplar o controle interno ou mesmo o controle externo exercido pelos tribunais de contas entre as hipóteses de compartilhamento do sigilo bancário, salvo se houver ordem judicial (art. 1º, § 4º) ou convênio com Bacen ou CVM (art. 2º, § 4º, I).

42. Quanto à tese dos poderes implícitos, não se pode ignorar que o ordenamento jurídico não regulou apenas os fins, mas também os meios, portanto não existe discricionariedade absoluta em relação à escolha destes, que não pode se dar à margem da Lei Complementar nº 105, de 2001.

43. Quanto ao suposto conflito com os direitos do trabalhador, convém lembrar que este também é protegido pelo sigilo bancário e nada garante que o controle interno adote interpretações que o beneficiem, sendo perfeitamente possível que determine ou recomende ao banco a supressão de créditos que considere inadequados, por exemplo.

44. O sigilo bancário, se incidente, também deve ser oposto ao Ministério Público, incluídos todos os seus ramos.

45. O art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75, de 1993, evocado como fundamento para a possibilidade de compartilhamento de dados protegidos com o Ministério Público, sem ordem judicial, dispõe:

§ 2º Nenhuma autoridade poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja fornecido.

46. O dispositivo acima transcrito se refere a autoridade, o que exclui as instituições financeiras públicas, que exercem atividade econômica, e não atuam no exercício de competências que pressuponham supremacia ou poder de império ou imposição coativa de sua vontade aos particulares, o que está pressuposto no conceito de “autoridade”. 

47. Além disso, a Lei Complementar nº 105, de 2001, é lei especial em relação à Lei Complementar nº 75, de 1993, uma vez que esta última é de aplicação geral (o destinatário da norma não é o Ministério Público, mas sim toda e qualquer autoridade), enquanto a primeira é restrita apenas a dados protegidos por sigilo bancário. Como já dito, é de conhecimento geral que a lei especial derroga, na hipótese por ela tratada, a lei geral.

48. Ademais, a Lei Complementar nº 105, de 2001, regulou integralmente o tema do sigilo bancário, o que configura revogação tácita de normas sobre o assunto eventualmente constantes de leis anteriores (art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro[15]). Ao fazê-lo, só previu a atuação do Ministério Público no recebimento de notícia de crime (art. 9º, caput[16]) ou na formulação de requerimento judicial de quebra do sigilo (nesta última hipótese, sem menção expressa), e não no acesso, sem ordem judicial, a dados protegidos por sigilo.

49. Não apresenta qualquer relevância para o caso concreto, neste ponto, a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADIn 2.859/DF, julgada em 2016 pelo Plenário, que considerou constitucional o compartilhamento do sigilo bancário com a fiscalização tributária nas hipóteses previstas na Lei Complementar nº 105, de 2001, sem necessidade de ordem judicial, pois tratou justamente de hipótese em que há previsão direta de lei, o que não existe para o Ministério Público.

50. Aliás, convém esclarecer que não foi casual a exclusão pelo legislador de requisições diretas do Ministério Público, dos tribunais de contas e de outros órgãos de controle do elenco de situações em que pode se dar o compartilhamento de sigilo bancário (art. 1º, § 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001).

51. A Lei Complementar nº 105, de 2001, que regula o sigilo bancário, foi resultado da aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 220, de 1998. Este projeto se iniciou no Senado Federal (em que recebeu a identificação de PLS nº 219/1995), por iniciativa do então Senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE). Na versão do projeto inicialmente aprovada no Senado, o art. 4º estabelecia o seguinte:

Art. 4° O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal, ao Ministério Público Federal e, quando se tratar de recursos públicos, ao Tribunal de Contas da União as informações e os documentos sigilosos que, fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.

§ 1º As comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência constitucional e legal de ampla investigação, obterão diretamente das instituições financeiras ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou da Comissão de Valores Mobiliários, as informações e documentos sigilosos de que necessitarem.

§ 2º As solicitações de que trata este artigo deverão ser previamente aprovadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito, ou do Tribunal de Contas da União, por maioria de votos, presente a maioria absoluta de seus membros.

§ 3º As requisições de que trata este artigo quando, formuladas pelo Ministério Público Federal, serão previamente aprovadas pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal.

§ 4º Excetuadas as comissões parlamentares de inquérito da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, o disposto neste artigo não abrange:

I – a revelação de informações:

a) sobre os locais e as instituições financeiras em que se encontrem depositadas ou aplicadas as reservas internacionais do País;

b) sobre operações com as reservas internacionais efetuadas há menos de um ano;

c) sobre o saldo e a movimentação das contas de reservas bancárias das instituições financeiras:

Il – o acesso aos sistemas de processamento e às bases de dados, consideradas de segurança, ou seja, que possibilitem alterações por parte do usuário.

§ 5º Às autoridades do Poder e do órgão solicitante será transferida a responsabilidade pela preservação do sigilo das informações e dos documentos fornecidos.

52. Contudo, o substitutivo aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação da Câmara dos Deputados, de autoria do Deputado Ney Lopes (PFL-RN), modificou substancialmente a redação deste dispositivo, que passou a ser a seguinte:

Art. 5° O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal as informações e os documentos sigilosos que, fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.

53. Esta redação acabou sendo aprovada nas duas casas legislativas e é a que consta no art. 4º, caput, da lei tal como sancionada e publicada. Em seu parecer, após citar precedente do Supremo Tribunal Federal, o Deputado Ney Lopes justificou a mudança:

A par disso, firmo meu entendimento de que, com efeito, não há como se estabelecer ressalvas ao exercício de um direito fundamental, dispensando-se a apreciação prévia do Poder Judiciário. Em que pese ser o Ministério Público, órgão constitucionalmente incumbido de fiscalizar a lei, e o Tribunal de Contas da União, órgão auxiliar do Poder Legislativo no controle externo, somente com a intervenção do Judiciário, no curso de um processo ou de um inquérito, será garantido o exercício do contraditório e da ampla defesa àqueles que tivessem o seu sigilo ameaçado.

Assim, estribado na melhor doutrina e pacífica jurisprudência, reputo materialmente inconstitucionais os dispositivos do projeto sob exame que visam [a] conceder acesso a informações sigilosas sem a devida autorização judicial e apresento o Substitutivo em anexo, saneando os vícios apontados.

54. Como se vê, a exclusão do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União – e, por extensão, do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União – do elenco dos que podem ter acesso a dados protegidos por sigilo bancário sem ordem judicial foi objeto de decisão explícita, intencional e fundamentada do Congresso Nacional, não se podendo falar em esquecimento ou má redação da Lei Complementar nº 105, de 2001.

55. Convém ressaltar, por fim, que apesar deste ponto não ter sido debatido de forma ampla no PARECER N.° 028/2010/ASJUR/CGU-PR (Processo nº 00190.027761/2014-22), mas apenas mencionado, que o Ministério Público, os tribunais de contas e o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União podem ser considerados órgãos fiscalizadores de instituições financeiras para os fins previstos no art. 2º, § 4º, I, da Lei Complementar nº 105, de 2001, cuja redação é a seguinte:

§ 4º O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, em suas áreas de competência, poderão firmar convênios: I - com outros órgãos públicos fiscalizadores de instituições financeiras, objetivando a realização de fiscalizações conjuntas, observadas as respectivas competências.

56. Estes “outros órgãos públicos fiscalizadores de instituições financeiras” só podem ser aqueles que não são especializados apenas neste tema, mas que podem vir a exercer controle sobre a atividade-fim da instituição financeira, o que inclui o Ministério Público, os tribunais de contas e as controladorias (e exclui, entre outros, o Ministério do Trabalho, órgãos ambientais e a fiscalização urbanística e de posturas realizadas pelos municípios e pelo Distrito Federal).

57. Este dispositivo reforça as conclusões anteriores, pois se a Lei Complementar nº 105, de 2001, exigiu convênio e atuação conjunta do Bacen ou CVM, não cabe dispensar estes requisitos para permitir o acesso destes outros órgãos fiscalizadores a dados protegidos por sigilo bancário.

58. Por fim, convém lembrar que a Lei Complementar nº 105, de 2001, teve sua constitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento conjunto de diversas ações diretas de inconstitucionalidade, entre elas a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.390/DF (julgada pelo Plenário em 24-02-2016, relator o Ministro Dias Toffoli). Completando este julgamento, o Supremo Tribunal Federal, no já citado Mandado de Segurança nº 33.340/DF, reconheceu que o sigilo bancário incide de modo diferenciado se estiverem presentes recursos públicos e que o Tribunal de Contas da União pode fiscalizar a atuação de instituições financeiras públicas.

III – CONCLUSÃO

59. Esse é o parecer que submeto aos demais membros da CNU, a fim de propiciar a solução das divergências. Suas conclusões já foram sintetizadas em sua ementa, que pode ser facilmente convertida em orientação normativa, se houver conveniência. De todo modo, elas podem ser assim sumariadas:

a. além das hipóteses previstas no art. 1º, §§ 3º e 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001, não incide a proteção ao sigilo bancário, em decorrência da incidência do princípio constitucional da publicidade, ao menos nas seguintes situações:

i. operação bancária em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; ou

ii. operação bancária que envolva recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira;

b. Para este fim, devem ser considerados recursos públicos:

i. os previstos nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, inclusive nos orçamentos previstos no § 5º do art. 165 da Constituição; e

ii. os titularizados não pela coletividade como um todo, mas por coletividades parciais (como os trabalhadores regidos pela CLT ou servidores públicos) que sejam administrados pelo poder público, tal como o FGTS e o Fundo PIS-PASEP, mas apenas em relação à sua aplicação pelas instituições financeiras, excluídas as operações bancárias realizadas entre o banco e o titular de contas individualizadas (cotista do fundo), que continuam protegidas pelo sigilo bancário;

c. A exceção ao sigilo bancário decorrente do princípio da publicidade, nos termos acima expostos, não se estende a:

i. operações subsequentes àquela operação inicial de transferência de recursos públicos, realizadas pelo tomador dos recursos e decorrentes da disponibilização destes em conta corrente ou por outro meio;

ii. outros sigilos previstos em lei ou em norma regulatória editada pela autoridade competente, em especial o Banco Central do Brasil ou a CVM – Comissão de Valores Mobiliários, cuja incidência sobre documentos apresentados à instituição financeira ou por ela produzidos deve ser verificada caso a caso.

d. Salvo na hipótese de celebração do convênio a que se refere o art. 2º, § 4º, I, da Lei Complementar nº 105, de 2001, o sigilo bancário, quando incidente, deve ser oposto inclusive ao Ministério Público, aos tribunais de contas e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, sendo inaplicáveis o art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001, e o art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75, de 1993.

À apreciação.

Brasília, 30 de novembro de 2017

RAFAEL MAGALHÃES FURTADO
Advogado da União
Membro da 3ª Turma da CNU – Relator

 

VICTOR XIMENES NOGUEIRA
Advogado da União
Presidente da CNU

[1] “Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.”

[2] “Art. 7º Constituem recursos do BNDES: (...) V - as dotações que lhe forem consignadas no orçamento da União”.

[3] “Art. 1º Fica a União autorizada a conceder subvenção econômica, sob a modalidade de equalização de taxas de juros, nas operações de financiamento contratadas até 31 de dezembro de 2015: I - ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, destinadas: a) à aquisição, produção e arrendamento mercantil de bens de capital, incluídos componentes e serviços tecnológicos relacionados, e o capital de giro associado; à produção de bens de consumo para exportação; ao setor de energia elétrica, a estruturas para exportação de granéis líquidos; a projetos de engenharia; à inovação tecnológica; a projetos de investimento destinados à constituição de capacidade tecnológica e produtiva em setores de alta intensidade de conhecimento e engenharia; a projetos e equipamentos de reciclagem e tratamento ambientalmente adequados de resíduos; e a investimentos no setor de armazenagem nacional de grãos e açúcar; e b) a projetos de infraestrutura logística direcionados a obras de rodovias e ferrovias objeto de concessão pelo Governo federal; II - à Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP destinadas exclusivamente para a modalidade de inovação tecnológica. § 1º O valor total dos financiamentos subvencionados pela União é limitado ao montante de até R$ 452.000.000.000,00 (quatrocentos e cinquenta e dois bilhões de reais). § 2º A equalização de juros de que trata o caput corresponderá ao diferencial entre o encargo do mutuário final e o custo da fonte de recursos, acrescido da remuneração do BNDES, dos agentes financeiros por ele credenciados ou da Finep.”

[4] “Art. 1º É a União autorizada a conceder crédito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no montante de até R$ 30.000.000.000,00 (trinta bilhões de reais), em condições financeiras e contratuais a serem definidas pelo Ministro de Estado da Fazenda. § 1º Para a cobertura do crédito de que trata o caput, a União poderá emitir, sob a forma de colocação direta, em favor do BNDES, títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal, cujas características serão definidas pelo Ministro de Estado da Fazenda, respeitada a equivalência econômica com o valor previsto no caput. § 2º Em contrapartida ao crédito concedido nos termos do caput, o BNDES poderá utilizar, a critério do Ministério da Fazenda, créditos detidos contra a BNDES Participações S.A. (BNDESPAR). § 3º O crédito concedido pelo Tesouro Nacional será remunerado pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP).”

[5] “§ 5º A lei orçamentária anual compreenderá: I - o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público; II - o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto; III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público.”

[6] “Art. 22.  O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.”

[7] “Art. 86. O Cade, por intermédio da Superintendência-Geral, poderá celebrar acordo de leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de 1 (um) a 2/3 (dois terços) da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte: (...) § 9º Considera-se sigilosa a proposta de acordo de que trata este artigo, salvo no interesse das investigações e do processo administrativo.”

[8] Art. 155. (...) § 1º Cumpre, ademais, ao administrador de companhia aberta, guardar sigilo sobre qualquer informação que ainda não tenha sido divulgada para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influir de modo ponderável na cotação de valores mobiliários, sendo-lhe vedado valer-se da informação para obter, para si ou para outrem, vantagem mediante compra ou venda de valores mobiliários. (...) § 4º É vedada a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários.

[9] “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.”

[10] Art. 85.  Os órgãos de controle externo e interno das 3 (três) esferas de governo fiscalizarão as empresas públicas e as sociedades de economia mista a elas relacionadas, inclusive aquelas domiciliadas no exterior, quanto à legitimidade, à economicidade e à eficácia da aplicação de seus recursos, sob o ponto de vista contábil, financeiro, operacional e patrimonial.

§ 1º Para a realização da atividade fiscalizatória de que trata o caput, os órgãos de controle deverão ter acesso irrestrito aos documentos e às informações necessários à realização dos trabalhos, inclusive aqueles classificados como sigilosos pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista, nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.

§ 2º O grau de confidencialidade será atribuído pelas empresas públicas e sociedades de economia mista no ato de entrega dos documentos e informações solicitados, tornando-se o órgão de controle com o qual foi compartilhada a informação sigilosa corresponsável pela manutenção do seu sigilo.

§ 3º Os atos de fiscalização e controle dispostos neste Capítulo aplicar-se-ão, também, às empresas públicas e às sociedades de economia mista de caráter e constituição transnacional no que se refere aos atos de gestão e aplicação do capital nacional, independentemente de estarem incluídos ou não em seus respectivos atos e acordos constitutivos.”

[11] “Art. 86. As informações das empresas públicas e das sociedades de economia mista relativas a licitações e contratos, inclusive aqueles referentes a bases de preços, constarão de bancos de dados eletrônicos atualizados e com acesso em tempo real aos órgãos de controle competentes.

§ 1º As demonstrações contábeis auditadas da empresa pública e da sociedade de economia mista serão disponibilizadas no sítio eletrônico da empresa ou da sociedade na internet, inclusive em formato eletrônico editável.

§ 2º As atas e demais expedientes oriundos de reuniões, ordinárias ou extraordinárias, dos conselhos de administração ou fiscal das empresas públicas e das sociedades de economia mista, inclusive gravações e filmagens, quando houver, deverão ser disponibilizados para os órgãos de controle sempre que solicitados, no âmbito dos trabalhos de auditoria.

§ 3º O acesso dos órgãos de controle às informações referidas no caput e no § 2o será restrito e individualizado.

§ 4º As informações que sejam revestidas de sigilo bancário, estratégico, comercial ou industrial serão assim identificadas, respondendo o servidor administrativa, civil e penalmente pelos danos causados à empresa pública ou à sociedade de economia mista e a seus acionistas em razão de eventual divulgação indevida.

§ 5º Os critérios para a definição do que deve ser considerado sigilo estratégico, comercial ou industrial serão estabelecidos em regulamento.”

[12] “Art. 88. As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão disponibilizar para conhecimento público, por meio eletrônico, informação completa mensalmente atualizada sobre a execução de seus contratos e de seu orçamento, admitindo-se retardo de até 2 (dois) meses na divulgação das informações.

§ 1º A disponibilização de informações contratuais referentes a operações de perfil estratégico ou que tenham por objeto segredo industrial receberá proteção mínima necessária para lhes garantir confidencialidade.

§ 2º O disposto no § 1º não será oponível à fiscalização dos órgãos de controle interno e do tribunal de contas, sem prejuízo da responsabilização administrativa, civil e penal do servidor que der causa à eventual divulgação dessas informações.”

[13] “§ 3º Não constitui violação do dever de sigilo: (...) IV – a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa; (...) VI – a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 9º desta Lei Complementar.”

[14] “Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.”

[15] “Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.”

[16] “Art. 9º Quando, no exercício de suas atribuições, o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários verificarem a ocorrência de crime definido em lei como de ação pública, ou indícios da prática de tais crimes, informarão ao Ministério Público, juntando à comunicação os documentos necessários à apuração ou comprovação dos fatos.”

Este texto não substitui o publicado no DOU de 26.4.2019