SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

EM Nº 00122/2015 MF

 Brasília, 09 de setembro de 2015.

Excelentíssima Senhora Presidenta da República,

 

1.               O Projeto de Lei, em síntese, institui o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária - RERCT e dispõe que os recursos patrimoniais que hajam sido transferidos ou mantidos no exterior, inclusive aqueles já repatriados ao País, não declarados, por residentes no País, pessoas físicas ou jurídicas, desde que de origem lícita, poderão ser devidamente declarados aos órgãos fiscais e regulatórios brasileiros e, após o pagamento do tributo e da multa correspondente, receberão tratamento regular perante o Estado.

2.               A proposição, na forma ora apresentada, incorpora a redação original com os subsequentes aperfeiçoamentos – redacionais e meritórios – havidos no curso da tramitação, até aqui, perante o Senado Federal, do PLS nº 298/2015, de autoria do Exmo. Sr. Senador Randolfe Rodrigues, e de seu Substitutivo, de autoria do relator da matéria, o Exmo. Sr. Senador Delcídio do Amaral.

3.               Em seu art. 1º, o projeto de lei destaca que o regime de regularização apenas se aplica aos ativos, bens ou dinheiro que sejam provenientes de atividade lícita, mas cuja existência não tenha sido declarada em tempo aos órgãos públicos brasileiros. Estão totalmente excluídas do âmbito da norma quaisquer condutas que envolvam: tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; terrorismo e seu financiamento; contrabando ou tráfico de armas; extorsão mediante sequestro; crimes contra a administração pública; crime contra o sistema financeiro nacional; organizações criminosas; crimes de particular contra a administração pública estrangeira; entre outros recursos financeiros que sejam provenientes de atos criminosos.

4.               A proposição prevê que os titulares de recursos remetidos ao exterior não responderão pelos delitos contra a ordem tributária contidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 1990, e de evasão de divisas, previsto no art. 22, caput e parágrafo único, da Lei nº 7.492, de 1986, se cumprirem corretamente os atos de regularização. Todavia, caso sejam falsas as declarações relativas à titularidade, fonte ou condição jurídica dos recursos declarados, o § 1º do art. 10 da proposição determina que sejam cobrados os valores equivalentes aos tributos, multas e juros incidentes, sem prejuízo da aplicação das penalidades cíveis, administrativas e criminais correspondentes.

5.               Assim, o RERCT exige a cobrança de tributos e multa, acompanhando o que já é praticado em âmbito interno, para permitir a extinção da punibilidade dos crimes contra a Ordem Tributária da Lei nº 8.137, de 1990, e do art. 337-A do Código Penal. A extinção da punibilidade do crime de evasão de divisas, previsto no art. 22 da Lei nº 7.492, de 1986, é aqui proposta uma vez que não faria sentido anistiar a sonegação tributária e permitir a persecução criminal para o delito que lhe é conexo: certamente, se não houver a extinção de punibilidade para ambos os crimes, a norma deixará de atrair os contribuintes que possuem recursos não declarados no exterior e, por óbvio, será privada de efetividade.

6.               Na mesma toada, buscando a maior efetividade da norma, também contempla a extinção da punibilidade para igualmente abarcar as figuras criminais típicas associadas à sonegação de tributos na remessa ou mantença irregular de recursos no exterior, particularmente quanto aos crimes de falsidade previstos nos arts. 297, 298 e 299 do Código Penal, desde que exaurida a potencialidade lesiva do documento falso. Neste ponto, a proposta normativa acompanha o entendimento jurisprudencial que norteou a Súmula nº 17 do Superior Tribunal de Justiça, pois não haverá justiça em se punir o crime-meio se o Estado manifestou desinteresse em processar o crime-fim.

7.               Por esse exato motivo, não somente o crime de evasão de divisas deverá ter extinta sua punibilidade, mas também os crimes que provavelmente serão conexos à sonegação tributária de recursos remetidos ao exterior, sem declaração. De fato, os crimes de sonegação, em algum momento do iter criminis, poderão envolver atos de lavagem de dinheiro da Lei nº 9.613, de 1998, com vistas a ocultar, da autoridade fiscal, a existência dos ativos.

8.               Além da extinção da punibilidade dos crimes já citados, o art. 5° da proposição prevê que a declaração dos recursos, após o pagamento do tributo e da multa de regularização, extinguirá quaisquer outras obrigações tributárias exigíveis em relação às receitas e rendimentos não declarados, mantidos no exterior em regularização, ou por fatos anteriores ao ingresso no território nacional; também permitirá a extinção das obrigações acessórias exigíveis em relação às receitas e rendimentos não declarados e das obrigações formais de natureza cambial ou financeira exigíveis do beneficiário relativas aos recursos regularizados.

9.               A proposição contempla, ainda, no § 10 do art. 4º, que estarão isentos da multa de regularização os valores disponíveis em contas no exterior no limite de até R$ 10.000,00 (dez mil reais).

10.              Para gozar do RERCT, o interessado deverá promover o recolhimento tributário, sobre o montante regularizado de recursos, do imposto de renda à razão de 17,5% (dezessete inteiros e cinco décimos por cento), além da previsão da incidência de multa de regularização equivalente a 100% (cem por cento) deste imposto (arts. 6º e 7º). O contribuinte que voluntariamente aderir à regularização suportará, portanto, uma obrigação patrimonial equivalente a 35% sobre o valor total a ser regularizado, além dos tributos aduaneiros federais, no que couber, a garantir uma proporção correspondente ao custo tributário global que haveria em operações semelhantes.

11.              O prazo de adesão ao RERCT será de 180 (cento e oitenta) dias, contado da regulamentação da futura norma (art. 8º). Destaca-se assim que o regime de regularização, sob exame, é temporário, justamente para demonstrar seu viés de excepcionalidade. Ademais, apenas aqueles contribuintes, pessoas físicas e jurídicas, que cumpram fielmente os requisitos materiais e formais fixados na norma serão por ela beneficiados. Recorde-se que, de acordo com o art. 3º do Código Penal, a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência, assim, não haveria que se falar em modificação da presente legislação por lei posterior.

12.              Além da extinção da punibilidade dos crimes já citados, o art. 5° da proposição prevê que a declaração dos recursos, após o pagamento do tributo e da multa de regularização, extinguirá quaisquer outras obrigações tributárias exigíveis em relação às receitas e rendimentos não declarados, mantidos no exterior em regularização, ou por fatos anteriores ao ingresso no território nacional; também permitirá a extinção das obrigações acessórias exigíveis em relação às receitas e rendimentos não declarados e das obrigações formais de natureza cambial ou financeira exigíveis do beneficiário relativas aos recursos regularizados.

13.              Ademais, em seu art. 11, o projeto de lei fixa que o montante total arrecadado da multa de regularização será destinado ao Fundo de Desenvolvimento Regional e Infraestrutura (FDRI) e ao Fundo de Auxílio Financeiro para Convergência de Alíquotas do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (FAC-ICMS), instituídos pela Medida Provisória nº 683, datada de 13 de julho de 2015, que visa reduzir as desigualdades socioeconômicas regionais e financiar a execução de projetos de financiamento em infraestrutura nos Estados e no Distrito Federal.

14.              O projeto de lei ainda dispõe sobre a necessidade de regulamentação no prazo máximo de trinta dias.

15.              O RERCT, conforme se verifica pelo acima sumariado, tem por objetivo regularizar apenas as divisas com origem lícita, mediante anistia em relação aos crimes de evasão de divisas e sonegação fiscal, com prazo de duração previamente definido, e, com isso, estimular brasileiros que possuam ativos não declarados no exterior a reinvestir esses valores internamente.

16.              A ideia de conceder anistia em fórmula similar ao RERCT já foi bastante exitosa em outros países: na Argentina, cerca de U$ 4,7 bilhões foram repatriados; a Itália recuperou cerca de 100 bilhões de euros; a Turquia, 47,3 bilhões de euros. Assim, espera-se que a repatriação de ativos financeiros injetará uma grande quantidade de recursos no País, o que contribuirá para o aquecimento da economia brasileira e permitirá o emprego de recursos consideráveis em investimentos nacionais, sem que haja qualquer aumento de tributação e trazendo como consequência indireta a melhoria do sistema de controle interno e de trocas de informação entre o Brasil e outros países.

17.              Estimativas indicam que a arrecadação aos cofres da União poderá atingir cerca de 100 a 150 bilhões de reais. De fato, dados revelam que os ativos no exterior não declarados de brasileiros podem chegar a US$ 400 bilhões. São dados estimados, mas o caso do Brasil destoa de todos os demais, em virtude dos motivos que induziram muitos a destinar ou manter recursos fora do País. Basta pensar nos sucessivos planos econômicos, como os Planos Cruzado I e II (1986), Plano Bresser (1987), Plano Verão (1989), Planos Collor I e II (1990 e 1991) e Plano Real (1994). Foram as dificuldades no passado para pagamentos no exterior e diga-se o mesmo quanto aos momentos de instabilidades cambial, política ou de crises internacionais.

18.              Vale novamente destacar que o Brasil não é pioneiro nesse tipo de norma; apenas acompanha a tendência mundial de programas de divulgação voluntária (voluntary disclosure) de recursos, bens ou direitos, de origem exclusivamente lícita, localizados no exterior e não declarados. Destaca-se, ainda, que, no que toca ao combate e prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo, a proposição acompanha as diretrizes da Força Tarefa em Ações Financeiras (Financial Action Task Force - FATF), na medida em que a extinção da punibilidade do crime de lavagem de dinheiro é restrita às hipóteses em que este crime recair sobre o objeto, produto ou proveito de qualquer dos crimes enumerados no § 1º do art. 5º.

19.              Ademais, os recursos arrecadados não se limitarão ao atendimento de despesas federais, pois Estados e Municípios serão igualmente beneficiados, mediante a distribuição constitucional do Imposto sobre a Renda, circunstância que revela, mais uma vez, os incontáveis méritos desta iniciativa legislativa.

20.              O projeto de lei ora apresentado atende ao critério essencial da constitucionalidade, versando sobre matéria de competência da União passível de disciplina por norma legislativa submetida à aprovação do Congresso Nacional (arts. 24, inciso I c/c 153, inciso I; 48, caput e inciso I; e 150, § 6º; todos da CF).

21.              Tendo em vista a relevância dos dispositivos contidos no presente projeto de lei para a arrecadação, tanto em âmbito federal, como dos Estados e Municípios, solicito seja conferido o caráter de urgência previsto no art. 64 da Constituição Federal.

22.              São essas, Senhora Presidenta, as razões pelas quais submeto à consideração de Vossa Excelência a proposta de Projeto de Lei em anexo.

 Respeitosamente,

 

JOAQUIM VIEIRA FERREIRA LEVY
                  
Ministro de Estado da Fazenda